Há mais de duas décadas, um Dualshock surge no mercado de videogames e rapidamente rouba a cena, se tornando uma parte fundamental da cultura gamer.
O DualShock, o controle oficial e definitivo do PlayStation original, lançado lá em 1997, pela Sony, não apenas revolucionou a maneira como jogamos, mas também foi um divisor na história dos videogames.
Hoje vamos trazer à tona a origem fascinante do DualShock, mapeando sua trajetória de inovação, design icônico e como seus conceitos influenciaram praticamente tudo o que temos em mãos hoje. Então bora com a gente!
Playstation Joypad (SCPH-1010)
Antes da chegada do DualShock, a Sony iniciou com outros dispositivos que acertaram em cheio. O primeiro controle padrão do Playstation era o Playstation Joypad (SCPH-1010). Um dispositivo digital relativamente mais simples, porém, já havia chamado muito a atenção com seu design ergonômico revolucionário e um layout de botões pensado para os jogos 3D de ultima geração. Aliás, gráficos em 3D eram a nova tendência naquele momento.
A Sony, ao lançar o PlayStation original em 1994, estava determinada a “subir a régua” no padrão dos videogames e conquistar um lugar de destaque no mercado. Com essa visão, o desenvolvimento de um controle diferenciado era uma grande aposta para atingir sucesso nessa missão.
Segundo Ken kutaragi (o engenheiro criador o Playtatation), a equipe de desenvolvimento investiu tanto tempo na criação do controle quanto na criação do console em si. E isso foi fortemente apoiado pelo próprio Norio Ohga, o CEO da Sony, que demonstrou muito interesse no projeto desde o início.
O desenvolvimento do primeiro controle levou em consideração inúmeras simulações de uso cotidiano, encaixe em mãos de diferentes tamanhos, posição do usuário ao jogar, layout, formato, tamanho, espaçamento dos botões e até mesmo peso total. Tudo foi imaginado de forma antecipada e testado na busca de um equilíbrio perfeito.
Usando como base o layout do controle do Super Nintendo (SNES), a Sony projetou um controle mais voltado para a grande novidade da época – os jogos em 3D. A adição de mais dois botões na parte de cima se fazia necessária para uma navegação em cenário tridimensional. Porém, graças a essa implementação, o design geral também precisou ser otimizado para lidar com os problemas ergonômicos que surgiram.
Agora, com quatro botões na parte superior, o jogador talvez pudesse enfrentar problemas de instabilidade na manipulação do controle. Para lidar com isso, o designer responsável pelo projeto, Teiyu Goto, desenhou empunhaduras alongadas (“grip handles”) para melhorar a ergonomia. A ideia de Goto, além de resolver o problema e melhorar a experiência do usuário, trouxe grande parte da herança do DNA visual que temos até hoje.
Teiyu Goto elaborou uma nomenclatura original para os botões. Em vez de utilizar letras ou número, Goto optou por formas geométricas e adotou também um padrão de cores especificas para cada uma delas:
Os botões superiores foram chamados de L1, L2, R1, R2 e adicionavam mais complexidade ao gameplay. O significado de L e R vem do inglês “Left” (esquerda) e “Right” (direita).
Ao todo o controle tinha 10 botões e um direcional digital de 4 teclas. A cor do controle era o mesmo tom de cinza do console. O mesmo trazia uma proposta mais séria e adulta, se parecendo menos com um brinquedo, se comparado aos consoles concorrentes. E isso vinha, justamente, de encontro com a intenção de expandir o alcance de público e atingir outras faixas etárias.
Controle Analog Joystick (SCPH-1110)
O primeiro controle da Sony a trazer tecnologia de direcionais analógicos foi o Playstation Analog Joystick (SCPH-1110). Lançado em 25 de abril de 1996 ele utilizava potenciômetros 3D como componente principal em seus direcionais. Esses potenciômetros funcionavam ajustando a resistência elétrica conforme as alavancas eram movidas em diferentes direções, permitindo que o console interprete a intensidade e a direção dos movimentos, que antes eram ditados apenas com sinais binários do D-Pad.
Isso possibilitava um controle preciso e sensível ao toque nos jogos e, dessa forma, os jogadores poderiam mover personagens, câmeras ou outros elementos de forma suave e variável, atendendo uma necessidade gerada pelos jogos em 3D cada vez mais realistas.
O Analog Joystick e um controlador do tipo “Flightstick”, um dispositivo grande se comparado a um Joypad padrão e se assemelha a um painel de controle de avião ou helicóptero. Era bem chamativo à primeira vista, entretanto, sua função analógica só podia ser aproveitada em jogos compatíveis. Sendo assim, ele possuía um botão capaz de alternar seu imput entre analógico e digital. Quando sua função analógica era desabilitada, ele se comportava como um Joypad padrão emitindo sinais binários nos direcionais.
A Sony apostou nos direcionais analógicos em resposta a crescente leva de jogos capazes de receber tais comandos e, vale mencionar, que a Namco já havia criado um controle analógico chamado NeGcon um ano antes. A aparentemente a implementação de controles analógicos estava se tornando uma tendência.
Controle Dual Analog (SCPH-1150) – O filho do meio da história
De olho no mercado e no movimento de seus concorrentes, a Sony já tinha em mente que precisava de um controle mais compacto e barato que trouxesse direcionais analógicos. Do contrário, ela ficaria para trás na corrida dos consoles da 5ª geração.
Em 26 de abril de 1997, o Playstation recebe uma nova proposta de controle: Dual Analog SCPH-1150.
Quando se via pela primeira vez, a característica mais notável do novo controle era a inclusão de dois thumbsticks analógicos na parte inferior. O design e o layout, em sua maior parte, se mantiveram em relação ao Joypad padrão de 1994, mas, sem dúvida, demonstrava ser um produto mais avançado.
Os botões L2 e R2 agora eram maiores e arredondados, e possuíam uma espécie de “calo” que o distinguiam ainda mais.
O controle de modo geral era ligeiramente maior. Ass empunhaduras foram alongadas, tendo cerca de 1,5 centímetros a mais de comprimento e o controle era mais pesado e robusto.
Houve a adição dois botões muito importantes do ponto de vista histórico: o L3 e o R3.
Eram teclas ocultas que foram embutidas nos thumbsticks analógicos. Para acionara-las era só pressionar os direcionais analógicos em posição neutra – a sensação era de furar os olhos de Poseidon. (ref. jogo God of War III).
Em vez de substituir o direcional digital, a Sony optou por adicionar mais dois thumbsticks analógicos ao corpo do controle. Essa foi uma estratégia bem pensada para lidar com problemas de incompatibilidade e aceitação de mercado.
Veja bem, embora muitos jogos fossem compatíveis com comandos direcionais analógicos, muitos deles reconheciam apenas controles específicos, como o caso do controle NeGen da Namco o qual citamos anteriormente e o controle Analog Joystick (SCPH-1110) da Sony.
Diante disso, o Dual Analog possuía uma tecla chamada “Analog” que alternava entre três modos de compatibilidade: Digital, Analógico (led vermelho) e Analog Joystick (SCPH-1110) (led verde).
Já do ponto de vista da aceitação do usuário, o design era capaz de introduzir a novidade, mas, sem abrir mão do digital que já funcionava muito bem. Então, para aqueles que fossem mais relutantes em experimentar novidades ou apenas tivessem dificuldade de se adaptar, isso não seria uma objeção. Analógico ou digital, ambos disponíveis.
Introdução ao FeedBack Vibratório
Os avanços tecnológicos que o Dual Analog trouxe ia mais além do que se podia observar num primeiro momento. Embora os holofotes tenham sido voltados majoritariamente para a tecnologia dos direcionais analógicos, o novo controle do Playstation introduzia também uma função de feedback vibratório primitiva. Baseada em apenas um único motor gerador de vibração.
O sistema de “Feedback Vibratório” era uma tecnologia que permitia que o controle emitisse vibrações em resposta às ações de alguns jogos.
Esse feedback tátil foi projetado para aumentar o realismo na experiência do usuário. Quando algo acontece no jogo, como uma explosão, colisão ou outra ação especifica, o controle vibrava para simular uma sensação correspondente.
Por outro lado, o feedback vibratório, assim como controles analógicos dependia de compatibilidade. Ou seja, assim como o mercado consumidor, a indústria de desenvolvimento de jogos precisava comprar a ideia e implementar a função em seus jogos.
Essa tecnologia abria um enorme leque de possibilidades. Imagine só naquela época. A depender da criatividade do desenvolver, o feedback tátil poderia ser usado de maneira refinada, fornecendo informações ao jogador. Por exemplo, em alguns jogos, a vibração poderia indicar quando um personagem estivesse ferido ou que o jogador está se aproximando de um objeto interativo. Uma espécie de “arrepio ou premonição”. Então, a aderência dessa tecnologia ainda estava incerta naquele momento.
A título de curiosidade, embora muitos acreditem que a Sony tenha sido a primeira a empresa da história a lançar um controle com sistema de vibração, a verdade é que não foi… O “controle” Power Glove lançado em 1989 para o Nintendo Entertainment System (NES) tinha um sistema de vibração que podia ser usado para simular sensações vibratórias simples. No entanto, o Power Glove era um controle caro e difícil de usar e acabou que não foi um grande sucesso comercial. Mas, quem é que acerta de primeira, não é mesmo!?
A história nos mostra que muitas tecnologias não se tornam grande sucesso de mercado quando são lançadas no momento errado ou de forma errada.
Mais adiante, ainda em 1997, a Sony introduziu, de forma experimental, o controle Dual Analog (SCPH-1180) no mercado norte americano e pouco tempo depois na Europa.
Entretanto, um fato curioso – e frustrante – é que a versão do Dual Analog que foi lançado fora do Japão (SCPH-1180) não possuía o sistema de vibração. Devido ao fato de naquela época existirem pouquíssimos jogos compatíveis com essa novidade, a Sony optou por retirar os motores vibratórios na versão global e oferecer um controle mais focado na jogabilidade analógica. Que era o ponto chave do produto.
Outro fato curioso é que a comunidade de modders, entusiastas de videogames, programação e eletrônica que adquiriram a versão SCPH-1180 descobriram que, embora a Sony tenha retirado o motor de vibração, inutilizado o sistema de feedback tátil, todo o resto do circuito e programação estava presente no controle. Inclusive, a cavidade onde era acomodado o motor originalmente. Então, sendo assim, muitos usuários fazerem modificações em seus exemplares, adaptando um pequeno motor elétrico com um pendulo de ferro para fazer o contrapeso. Dessa forma, o SCPH-1180 ficava em pé de igualdade com o modelo japonês.
Naquele mesmo período, a Nintendo lançou um módulo de expansão chamado “Rumble Pack, que adicionava sistema de vibração ao controle do Nintendo 64. Pouco tempo depois, observando a rápida adesão da nova tecnologia por parte dos desenvolvedores e do público, a Sony decide arriscar no mercado internacional com uma versão mais refinada e definitiva: o DualShock.
Controle DualShock (SCPH-1200)
Em novembro de 1997 o Playstation ganha o controle definitivo: O DualShock (SCPH-1200). Que chegou muito mais refinado em relação ao seu antecessor e aproveitou as grandes oportunidades de mercado naquele momento.
Se antes o foco do marketing era nos direcionais analogicos, agora o foco era promover o feedback tátil. O nome “DualShock” se deve à sua principal característica, que já presentes em seu antecessor, mas de forma mais primitiva e experimental.
O novo sistema vibratório contava agora com dois motores alocados dentro das empunhaduras. Um deles era responsável por gerar as vibrações mais graves e pesadas, enquanto que o outro gerava as vibrações agudas. Dessa forma, o Dualshock era capaz de produzir uma reposta tátil muito mais detalhada e imersiva.
Lançado no momento certo, foi um sucesso comercial instantâneo, pois já se apoiava em bases experimentais. Foi capaz de impulsionar o uso de sensações táteis nos jogos eletrônicos e se tornou o sonho de consumo de qualquer criança (e muito marmanjo também).
O Design Final
O design final passou por mudanças sutis, mas que foram feitas levando em consideração o feedbeck dos usuários e da crítica especializada.
- As empunhaduras, que antes foram alongadas, voltaram a ter o mesmo tamanho do controle original (SCPH-1010);
- A pequena calosidade que havia nos gatilhos L2 e R2 foi retirada, e o espaçamento entre os botões foi reduzido, bem como o tamanho das alças superiores;
- Os thumbsticks analógicos dos Dual Analog que eram de plástico e tinham formato côncavo, mas agora eram convexos e o acabamento emborrachado com textura suave.
- O led verde da tecla “Analog” passou a ser apenas vermelho.
O Controle que Vendia o Console e os Jogos
A abordagem inovadora do DualShock mudou muito a forma como os outros fabricantes de consoles de videogame pensavam sobre o design de seus produtos.
A partir desse ponto, observou-se que um controle poderia ser capaz de ser forte critério na escolha de um console ou de um jogo. Visto que, nessa geração, era muito comum termos os grandes títulos lançados para várias plataformas, mas com poucas diferenças. Então, não apenas por qualidade gráfica, o modo como se jogava um jogo agora era fator decisivo.
Era muito mais emocionante jogar com analógicos e sistema de vibração. E justo no momento em que a indústria dos videogames caminhava para ser mais imersiva, isso fazia toda a diferença na experiência sistema/usuário.
Como o DualShock veio 3 anos após o lançamento do Playstation, os jogos mais antigos, lançados anteriormente, não eram compatíveis com as novas funcionalidades. Isso, inclusive, levou os desenvolvedores a saíram numa corrida para lançarem versões atualizadas de seus jogos, para fossem compatíveis com as funções do DualShock.
As capinhas que traziam o selo “DualShock Compatible” passaram a ser preferência de muitos consumidores.
O primeiro DualShock chegou ao mercado com uma biblioteca de jogos bem selecionada, mas que já explorava as novas tecnologias de maneira bem criativa e atrativa.
Embora o Playstation não fosse o console doméstico mais poderoso de sua geração, ele foi campeão absoluto em vendas graças a uma série de fatores combinados. E o DualShock foi, com certeza, um componente que motivou muitos a optarem pelo Playstation, entre tantos outros consoles.
As pessoas queriam “o controle que vibra” e, menos do que isso, não parecia mais ser aceitável. Você poderia ter até acabado de comprar um console novinho, mas se experimentasse o Playstation com o Dualshock… tudo ficaria para trás e seu nível de exigência seria redefinido naquele momento.
Os desenvolvedores abraçaram o conceito, e títulos como “Metal Gear Solid,” “Resident Evil 2,” “Final Fantasy VII,” “Gran Turismo,” e muitos outros, se beneficiaram das funcionalidades do controle e tiveram suas vendas aumentadas.
Aproveitando o exemplo, o jogo Metal Gear Solid foi um dos jogos mais icônicos do PlayStation, e foi um dos primeiros a explorar ao máximo a funcionalidade de vibração do DualShock. Os momentos em que o controle vibrava durante cenas de ação ou tensão intensificavam a experiência do jogador, tornando cada encontro com um inimigo ou chefe ainda mais alucinantes.
Imagine a sensação da novidade em jogar um certo jogo de terror e tomar um baita susto por causa da vibração do controle, quando um monstro gigante pula pela janela de uma delegacia atrás de você. Chocante, né!?
O Legado
O DualShock estabeleceu um novo padrão de consumo na indústria dos videogames e deixou um legado que dura até hoje. A Sony continuou a aprimorar a tecnologia e as funcionalidades dos seus controles ao longo dos anos. Já o design campeão se manteve sem grandes mudanças até a terceira geração do DualShock que acompanhava o Playstation 3.
Se formos analisar, mesmo não sendo o pioneiro em certos aspectos, o DualShock permanece como o ponto de partida, por ter viabilizado comercialmente e popularizado as tecnologias que são adotadas até hoje.
O sucesso do primeiro DualShock deixou uma herança para outros fabricantes de consoles que desenvolveram controles bem semelhantes.
O design ergonômico, os sticks analógicos “clicáveis” e feedback tátil tornaram-se o padrão mínimo da indústria dos videogames que foi adotado por praticamente todos os concorrentes, solidificando ainda mais a marca Playstation.
Décadas depois, Apesar de parecer difícil, a Sony consegue inovar ainda mais com seu novo DualSense. Temos um artigo completo sobre ele. Confira!
E aí, gostou do nosso artigo de hoje!? Conta pra gente aqui nos comentários qual foi a sua impressão ao ver o DualShock pela primeira vez.