Death Stranding – Muito Além De Um Simulador de Carteiro

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Te fizeram pensar que Death Stranding era um walking simulator
Te fizeram pensar que Death Stranding era um walking simulator

 “Death Stranding é um simulador de carteiro.” Uma visão limitada, repetida por diversas pessoas que nunca realmente o jogaram.

Resumir Death Stranding a um “Jogo de entregador”, séria o mesmo que chamar GTA de “jogo de roubar carro”, Resident Evil de “jogo de matar zumbis” ou God of War de jogo de luta.

Toda grande obra pode ser reduzida a um rótulo minimalista e superficial — mas é justamente quem vai além do rótulo que descobre onde mora a genialidade.

Veja bem, quando Death Stranding foi anunciado por Hideo Kojima, ainda recém-liberto da sombra da Konami, o mundo dos games ficou em suspense: o que ele faria agora que estava finalmente livre?

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O trailer mostrava um bebê dentro de uma cápsula, homens flutuando no céu, baleias mortas na praia e um protagonista que carregava caixas nas costas.

Confuso? Totalmente!

Hipnótico? Também…

Mas poucos imaginavam que o que viria a seguir seria uma das experiências mais conceiturais, visionárias e mal compreendidas da história dos videogames.

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Death Stranding é o tipo de jogo que você joga com a mente… mas sente com o corpo. Cada passo exige esforço. Cada trajeto exige escolha. E cada elemento… carrega um peso simbólico.

Lançado em 2019, o título marcou o início de uma nova fase para Kojima, mas também lançou um desafio ao próprio conceito de videogame como entretenimento.

Entre a conexão e o isolamento, entre o blockbuster e o experimental, entre o delivery e o existencial, Death Stranding é um paradoxo ambulante. E talvez por isso mesmo ele mereça ser redescoberto.

Vamos aqui caminhar juntos pela trilha deixada por Sam Porter Bridges — mas, acima de tudo, vamos entender como e por que essa trilha foi construída. Vamos explorar as escolhas narrativas de um jogo que, ao contrário do que muitos pensavam, nunca foi só sobre “simulação de entregador”.

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Kojima Livre – A Criação de Um Estúdio e a Busca por um Novo Começo

Em 2015, quando Hideo Kojima deixou oficialmente a Konami, o mundo dos games parou por um instante.

Não era apenas o desligamento de um diretor criativo — era o fim abrupto de uma parceria que definiu décadas de design de jogos, culminando em uma ruptura pública, amarga e cinematográfica, como só Kojima saberia dramatizar.

O que poucos sabiam na época é que essa separação seria também o recomeço mais ousado da carreira do criador de Metal Gear.

Kojima Productions Intro

Libertado da rigidez corporativa que marcava seus últimos anos na Konami, Kojima não demorou para fundar a Kojima Productions como estúdio independente — e com um detalhe que fazia toda a diferença: o apoio integral da Sony.

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Essa nova fase foi marcada por algo raro na indústria: confiança criativa irrestrita.

A Sony ofereceu não apenas suporte financeiro e logístico, mas também algo que não se compra fácil — tempo e liberdade.

Foi durante uma viagem de “inspiração” pelo mundo (com direito a visitas a estúdios, empresas de tecnologia e encontros com celebridades nerds) que Kojima começou a moldar o que viria a ser Death Stranding.

Era a chance de sair da sombra de Metal Gear e provar que ainda podia inovar — não com uma continuação, mas com algo totalmente novo, autoral e, como ele diria, “estranho”.

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Nessa fase, o diretor testou motores gráficos, montou uma equipe enxuta mas talentosa, e iniciou as negociações com nomes de peso como Norman Reedus (que havia começado a trabalhar com ele em P.T.), Mads Mikkelsen e Guillermo del Toro.

Parte do elenco de Death Stranding
Parte do elenco de Death Stranding ao lado de Hideo Kojima

Aos poucos, peças aparentemente desconexas começaram a se alinhar.

Mas o que ele queria fazer, afinal? Uma coisa era clara: Kojima não estava interessado em agradar expectativas. Ele queria criar algo que as pessoas não sabiam que queriam jogar.

E assim começou a jornada de Death Stranding. Não com promessas de tiroteios ou gráficos bombásticos, mas com uma visão: conectar mundos partidos, por meio de um jogo que muitos achariam… impossível de vender.

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Como Nasce um “Jogo de Entregador”?

Quando Death Stranding foi revelado, ninguém entendeu absolutamente nada. (Admita!)

Um bebê dentro de uma cápsula, Norman Reedus pelado numa praia, criaturas invisíveis deixando pegadas no solo… e uma trilha sonora melancólica embalando tudo isso.

Parecia mais um curta surrealista do que um jogo. Mas era exatamente essa a intenção.

Kojima queria provocar o desconforto do não saber.

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O primeiro teaser – TGA 2016

Death Stranding nasceu do vazio — do isolamento — e da sensação de desconexão que marcou não só sua saída da Konami, mas também o mundo contemporâneo.

Em entrevistas, ele descreveu o conceito do jogo como uma resposta à era das redes sociais: um mundo onde estamos todos conectados, mas profundamente sós.

Inspirado por um ensaio do escritor japonês Kōbō Abe, The Rope (A Corda), Kojima traçou uma metáfora simples e poderosa: a humanidade se conectou, ao longo da história, através de duas ferramentas — bastões, para afastar, e cordas, para aproximar.

Enquanto os jogos de ação tradicionais celebram o bastão (conflito, combate), Death Stranding se propunha a explorar a corda — o elo.

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E qual seria a atividade mais banal e solitária que poderia expressar isso? Entregar coisas.

Cruzar vastas distâncias totalmente só, enfrentando a natureza, o terreno, os próprios medos — não por glória, mas para fazer conexões.

Death Stranding nasceu assim: um jogo onde caminhar era mais importante que lutar. Onde cada passo, cada rota, cada pacote carregava um peso literal e simbólico.

E nesse processo, Kojima transformou a banalidade em ritual.

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O sistema de travessia e logística, que muitos rotularam levianamente como “simulador de entregas”, escondia uma verdade mais profunda: a jornada era o jogo. E o jogador, mesmo sem perceber, estava tecendo uma teia de conexões — físicas, emocionais, coletivas.

Era um risco enorme. Um jogo AAA sem tiroteios constantes. Com poucos inimigos visíveis. Cheio de pausas, de silêncio, de contemplação. Quem bancaria algo assim?

A resposta: Kojima. E todos que ainda acreditavam que videogames podiam ser arte — mesmo quando a arte parece esquisita demais para ser entendida logo de cara.

Andar Nunca Foi Tão Profundo: A Jogabilidade de Death Stranding

No papel, Death Stranding pode parecer a antítese da diversão. Caminhar, escalar, montar rotas, equilibrar peso nas costas… não parece muito atrativo, certo?

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Errou feio, errou rude!

Veja bem, a genialidade da jogabilidade está exatamente aí: em transformar algo simples — caminhar — numa experiência tensa, envolvente e extremamente satisfatória e viciante.

O terreno é o inimigo. Cada pedra, cada inclinação, cada rio esconde um desafio.

Se você corre demais, escorrega. Se carrega peso mal distribuído, perde o equilíbrio. Se atravessa um rio sem pensar, é levado pela correnteza.

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E quando a Chuva Temporal começa a cair, cada segundo vira uma corrida contra a degradação da sua carga.

O loop de gameplay gira em torno de três pilares:

  • Logística e Planejamento – Você precisa analisar o mapa, definir a melhor rota, decidir o que levar, onde montar cordas e escadas, e como otimizar seu peso. Parece simples, mas envolve estratégia e perseverança.
  • Travessia e Física Realista – O motor Decima reproduz com precisão a interação do personagem com o terreno. Andar sobre a lama, grama, neve ou rochas muda completamente a forma como o personagem se move. É como uma simulação de alpinismo.
  • Conexão com Outros Jogadores – Aqui está a mágica. Mesmo sendo um jogo solo, Death Stranding tem um modo assíncrono de cooperação: estruturas construídas por outros jogadores aparecem no seu mundo. Pontes, cordas, geradores, caixas postais… você pode curtir, usar ou até contribuir para melhorias.

O Kojima simplesmente criou um sistema de solidariedade.

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Você ajuda, é ajudado e nunca sabe quem está ali com você. É como se todos estivessem tentando reconstruir um mundo despedaçado, um poste de energia por vez.

E é nessa estrutura que o jogo revela seu coração: Death Stranding recompensa cuidado, paciência, empatia e solidariedade. Ele te ensina de maneira implícita que vale mais a pena construir uma ponte do que uma arma.

E mesmo que haja combate — e há, com armas letais ou não — nunca é o foco. É consequência. O verdadeiro desafio não está em vencer inimigos, mas em resistir ao cansaço, à solidão e à tentação de desistir.

América Despedaçada: O Mundo e a Direção de Arte

Em Death Stranding, o cenário não é só o pano de fundo — é parte vital da experiência.

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DEATH STRANDING DIRECTOR'S CUT

As paisagens vastas e melancólicas não são apenas belas: elas contam uma história.

Logo de cara, você percebe que a América retratada no jogo não tem nada de patriótica ou idealizada. Ela é fragmentada, inóspita e silenciosa. Uma terra ferida por eventos inexplicáveis e separada não apenas pela geografia, mas por um abismo emocional entre as pessoas.

O terreno acidentado é um reflexo físico do estado da humanidade.

E aí entra a direção de arte. A ambientação é minimalista e crua, mas recheada de significado. É uma América sem cidades — apenas estações e abrigos. Tudo é funcional. Tudo é passageiro. Tudo parece provisório, como se o mundo estivesse em pausa.

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A paleta de cores é fria. Os tons predominantes são cinzas, verdes e brancos. A luz natural banha as montanhas e penhascos com uma melancolia constante.

É o tipo de jogo que te faz parar para observar o horizonte — não porque há algo lá, mas porque ele transmite um sentimento.

O uso da Chuva Temporal é outro destaque. Visualmente sutil, ela carrega peso narrativo.

Tudo que ela toca envelhece. Plantas crescem e murcham em segundos. Estruturas enferrujam. O tempo se acelera, como uma lembrança de que nada é eterno — nem a dor, nem a vida.

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E se o mundo aberto parece vazio, é porque é pra ser. Ele não foi feito pra te entreter a cada passo com loots e inimigos. Ele foi feito pra te fazer sentir. Sozinho. Pequeno. Insignificante. E mesmo assim… necessário.

O silêncio das planícies é quebrado por uma trilha sonora pontual, delicada.

Quando uma música toca — geralmente do Low Roar ou Silent Poets — não é apenas um momento bonito. É um respiro. Um sopro de humanidade. Um lembrete de que, no meio da desolação, ainda existe beleza.

Um Enredo de Extinções, Conexões e Isolamento

Explicar a história de Death Stranding é como tentar colocar o mar numa garrafa — sempre escapa por algum lado. Mas vamos por partes.

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Você controla Sam Porter Bridges, um entregador em um mundo pós-apocalíptico onde um evento cataclísmico chamado Death Stranding bagunçou completamente a linha entre vida e morte.

Death Stranding - Sam Porter Bridges - Norman Reedus
Sam Porter Bridges – Norman Reedus

Agora, o mundo dos vivos e o dos mortos se sobrepõem. E isso tem consequências… bizarras.

Pessoas não podem mais morrer normalmente. Quando morrem e seus corpos não são incinerados a tempo, se tornam armadilhas fatais — porque um corpo em decomposição pode causar uma obliteração devastadora conhecida como voidout.

Sempre que acontecer uma obliteração, o cenário seu gameplay vai ficar com uma cratera gigantesca pra sempre.

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Death Stranding - Obliteração

Além disso, há os BTs (Beached Things), entidades sobrenaturais que vagam entre dimensões.

Invisíveis a olho nu, só podem ser detectados com a ajuda dos BBs (Baby Bridges) — bebês ligados a mães em coma, mantidos em cápsulas.

Isso mesmo, você carrega um bebê. E ele sente a presença da morte.

A premissa pode parecer esotérica demais à primeira vista, mas tem uma lógica interna impressionante. A mitologia do jogo é densa e nunca é entregue de bandeja.

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BTs vistas com ajuda de equipamentos conectados a um BB
BTs vistas com ajuda de equipamentos conectados a um Bady Bridges

Hideo Kojima costura elementos de biologia, física quântica, filosofia e espiritualidade numa tapeçaria ousada — e por vezes, hermética.

Entre os conceitos que ajudam a costurar esse universo estranho e fascinante estão os DOOMs — distúrbios genéticos raros que alteram a forma como alguns indivíduos percebem e interagem com o mundo dos mortos, o chamado “Outro Lado”.

Personagens como Fragile, Higgs e o próprio Sam carregam essas habilidades, em diferentes intensidades, e é isso que os torna peças tão centrais na trama.

Sam, por exemplo, consegue sentir a presença dos BTs, mas não vê-los com clareza. Já Higgs, com um nível mais alto de DOOMs, consegue invocar e até manipular essas entidades, assumindo o papel de antagonista messiânico.

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Fragile, por sua vez, usa seus poderes para viajar pelo mundo quase que instantaneamente — mas a um custo físico e emocional brutal.

Death stranding - Higgs invocando uma BT gigante.
Higgs invocando uma BT gigante.

Esses poderes não são apenas um truque de roteiro. Eles expandem a mitologia de Death Stranding e reforçam o tema do isolamento: os DOOMs são dons, mas também maldições. Tornam seus portadores especiais — e profundamente solitários.

Assim como os Bridges tentam religar o mundo, os DOOMs são uma lembrança de que algumas conexões vêm com um preço que nem todos estão prontos para pagar.

Existe também um “lugar” recorrente em Death Stranding que está além da compreensão humana — um espaço liminar conhecido apenas como A Praia.

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Death Stranding - A Praia
A Praia

Visualmente desolada, repleta de símbolos da morte, da perda e da memória, essa dimensão funciona como uma fronteira entre a vida e o que vem depois.

Para alguns, é uma passagem. Para outros, um eco que nunca silencia. Mas o mais perturbador é que cada pessoa parece ter sua própria Praia — um reflexo pessoal, um espelho do inconsciente moldado por lembranças e traumas profundos.

O que ela representa, exatamente? Death Stranding evita entregar respostas fáceis.

A Praia é tanto um conceito metafísico quanto um componente narrativo essencial. É onde o tempo parece desacelerar e onde os personagens mais importantes confrontam suas próprias naturezas.

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É um não-lugar, entre o aqui e o depois. Ao mesmo tempo, é também a chave que liga todos os eventos do jogo, como se a própria trama se erguesse sobre as marés e o silêncio desse litoral impossível.

Mas por trás de toda essa ficção científica maluca, existe uma narrativa muito humana.

Sam não é um herói. Ele é um cara emocionalmente quebrado, traumatizado pelo abandono, pela morte, pelo toque. Literalmente: ele sofre de afefobia, o medo de ser tocado.

Sua jornada não é só pelo país, mas pela cura interior. Ele reluta em se conectar com os outros. E, ironicamente, é incumbido da missão de reconectar a América.

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Cada personagem — Deadman, Fragile, Mama, Heartman — traz um pedaço dessa equação emocional.

Deadman - Guillermo Del Toro
Deadman – Guillermo Del Toro

Também são pessoas emocionalmente destruídas, vivendo nas margens do mundo, tentando encontrar sentido numa existência despedaçada.

O jogo dá tempo para conhecê-los, entendê-los, se importar com eles.

E então, no último ato, tudo vira de cabeça para baixo.

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Sem spoilers, mas Death Stranding reserva suas respostas mais perturbadoras para o fim. Questões sobre destino, livre-arbítrio, propósito e até sobre o próprio papel do jogador são lançadas com coragem.

A história é pessoal e cósmica ao mesmo tempo. Uma carta de amor e desespero à ideia de que conexões ainda importam, mesmo quando tudo parece perdido.

Muito além de um “Walking Simulator” – As Mecânicas de Death Stranding

Em Death Stranding, andar é ação. Carregar peso é desafio. E o caminho entre um ponto e outro é o verdadeiro combate.

Essa proposta subverte a lógica tradicional dos jogos AAA. Nada de tiroteios constantes, missões explosivas ou hordas de inimigos. Aqui, o grande antagonista é o terreno. A física. O clima severo. O cansaço.

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E, principalmente: a solidão.

Sam precisa entregar cargas — medicamentos, alimentos, documentos, equipamentos — entre cidades isoladas em um Estados Unidos pós-colapso.

Só que não existe estrada pavimentada inicialmente. E não existem atalhos obvios.

O sistema de movimentação exige atenção e improviso: o peso da mochila afeta o equilíbrio, o tipo de solo muda a forma de caminhar, e até o ângulo da encosta pode fazer você tropeçar e perder tudo.

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Chuva? Melhor correr — ela acelera a degradação da carga.

Lama? Prepare-se para escorregar.

Rios? Podem te arrastar com tudo e fazer suas cargas saírem boiando por água abaixo.

O sistema é, ao mesmo tempo, desafiador e meditativo. Planejar rotas, construir pontes, instalar escadas e ancoragens… tudo exige tempo e estratégia.

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Mas o jogo te recompensa com algo raro: uma sensação genuína de conquista e contribuição para um mundo melhor a cada viagem bem-sucedida.

E aí vem a sacada brilhante: o mundo é persistente — e coletivo.

Mesmo sem multiplayer direto, você compartilha estruturas com outros jogadores.

Uma ponte que você construiu ou uma escada que você deixou pode salvar a travessia de outro.

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Escada

Uma escada esquecida na beira de um abismo pode virar o caminho de muitos.

E quando isso acontece, o jogo te mostra. Te agradece. Te conecta. É aqui que Death Stranding vira mais do que “um simulador de entregas”. Ele se transforma em um experimento de empatia. Uma metáfora sobre esforço, sobre ajudar sem ser visto, sobre confiar no outro mesmo sem conhecê-lo.

Sim, há combate. Contra humanos, contra os BTs, contra o ambiente. Mas mesmo isso é abordado de forma inusitada. Matar inimigos tem consequências graves ao ponto de não valer a pena. O foco está sempre na conexão, na reconstrução, não na destruição.

É um jogo que te obriga a desacelerar. A pensar. A aceitar que o caminho importa tanto quanto o destino. E que, às vezes, carregar o mundo nas costas é exatamente o que te faz seguir em frente. “Continue persistindo!”

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Um Mundo Que Fala em Metáforas

Em Death Stranding, nada está ali por acaso. A Chuva Quiral envelhece tudo o que toca. A antimatéria dos mortos, ao entrar em contato com a matéria dos vivos, gera explosões nucleares.

E o protagonista carrega, literalmente, o futuro nas costas. Se o gameplay parece contemplativo, a narrativa é ainda mais: densa, alegórica, filosófica.

Fragile - Léa Seydoux
Fragile – Léa Seydoux (“não sou tão frágil assim”)

Kojima não está apenas contando uma história. Ele está montando um quebra-cabeça emocional com peças que representam temas como isolamento, trauma coletivo, paternidade, existência pós-morte, redes sociais e a própria condição humana em tempos de crise.

Sam Bridges é um portador, sim — mas também um elo simbólico.

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Ele atravessa terras destruídas, reconectando pessoas a que se esconderam, isoladas, com medo.

É uma metáfora clara (e poderosa) para um mundo moderno fragmentado pela tecnologia, polarização e catástrofes sucessivas.

As figuras centrais da trama — como Fragile, Higgs, Die-Hardman e Mama — não têm nomes normais. Têm arquétipos.

São ideias materializadas em personagens. Cada um carrega um trauma, uma função narrativa, um pedaço da alma do jogo.

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Mama - Margaret Qualley
Mama – Margaret Qualley

O que, para alguns, soa como pretensão, para outros é pura poesia interativa. Uma obra aberta à interpretação, onde o estranhamento não é falha — é convite à reflexão: você, está pronto para decifrar ou prefere apenas sentir?

A Trilha Sonora de Death Stranding

Em um jogo onde o silêncio e o isolamento são quase constantes, a música não é só trilha sonora — é mensagem.

Em Death Stranding, as canções surgem como oásis de conexão, abrindo clareiras emocionais no meio da solidão pós-apocalíptica.

Boa parte dessa experiência sonora vem da banda islandesa Low Roar, cujas músicas melancólicas e etéreas se tornaram a alma invisível do jogo.

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A primeira vez que “Don’t Be So Serious” ou “I’ll Keep Coming” tocam durante uma travessia longa… é impossível esquecer. Não apenas pela beleza, mas pelo timing cirúrgico.

Low Roar – Don’t Be So Serious

Kojima não usou música como pano de fundo — ele usou como narrativa.

Cada inserção é pensada, cada faixa tem um propósito dramático. Ao invés de preencher o vazio, a trilha nos confronta com ele. Amplifica o peso de cada passo, cada objetivo, cada revelação.

Além de Low Roar, artistas como Silent Poets e CHVRCHES também contribuem com faixas originais que reforçam o tom emocional da jornada. O resultado é uma experiência onde música e paisagem se fundem, criando momentos que tocam o jogador de um jeito quase íntimo.

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É raro ver um jogo usar música com tanta sensibilidade. Mais raro ainda é ver isso funcionar com tamanha força.

O Fio Invisível que Liga Tudo

Death Stranding é uma obra que desafia explicações fáceis. Não é um jogo tradicional. Também não é só um experimento. Ele está em um território próprio — entre o blockbuster e o autoral, entre a contemplação e a ação, entre o isolado e o conectado.

Quando foi lançado, dividiu opiniões…

Heartman - Darren Jacobs
Heartman – Darren Jacobs

Muitos o chamaram de “simulador de carteiro”. Outros viram nele uma obra-prima incompreendida. O fato é que Death Stranding foi corajoso o suficiente para não querer agradar todo mundo — e isso, em uma indústria cada vez mais padronizada, é revolucionário por si só.

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Kojima pegou um dos maiores orçamentos da história recente dos games e usou para contar uma história sobre união. Sobre reconstruir o que está destruido. Sobre confiar no outro, mesmo sem vê-lo.

Em uma era de jogos competitivos e experiências solitárias em mundos abertos, ele nos deu um multiplayer primoroso, onde a empatia e solidariedade é o maior aprendizado.

Sam Porter Bridges é mais do que um entregador. Ele é o elo. Um personagem marcado pela dor, que carrega o peso físico e emocional de uma missão impossível — conectar um país devastado por dentro e por fora.

E nós, como jogadores, sentimos esse peso. Literalmente no DualSense.

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DEATH STRANDING DIRECTOR'S CUT
Death Stranding faz excelente uso dos recursos do DualSense no Playstation 5

A crítica à lógica bélica, a desconstrução do herói tradicional, o uso de atores de Hollywood como peças de um quebra-cabeça simbólico, a coragem de fazer um jogo lento em um mercado que premia velocidade — tudo isso faz de Death Stranding uma experiência única.

Talvez ele não tenha sido feito para todos. Mas com certeza foi feito para durar. O bastante para se tornar um clássico cult.

Kojima não quer que você derrote um inimigo. Ele quer que você construa algo. Que ligue os pontos. Que, mesmo sem saber como, continue caminhando.

Porque, no fim das contas, a estrada não se faz com as mãos — ela se faz com propósito.

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A Entrega Mais Importante De Death Stranding

Não é sobre ação. Não é sobre missões. Não é sobre vencer.

É sobre continuar persistindo. Mesmo na chuva, com BT’s te caçando, ou com o BB chorando alto.

É sobre sair do ponto A e chegar no ponto B sem saber exatamente por quê — mas sentindo que é preciso. É sobre tropeçar, levantar, perder o equilíbrio e mesmo assim dar mais um passo. É sobre ajudar os outros e ser ajudado na hora do sufoco.

Sam Bridges Chorando - Death Stranding 2

O jogo se tornou um espelho de uma era em que o mundo real parecia colapsar. Foi lançado em 2019, mas suas mensagens ressoaram de forma quase profética em 2020, quando o isolamento virou realidade, e a conexão — mesmo que digital — se tornou essencial.

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Enquanto a indústria parecia presa em receitas de bolo, Death Stranding escolheu o original.

É um jogo estranho, ousado, pacientemente arriscado. E, por isso mesmo, necessário.

Kojima provou que ainda há espaço para o novo, para o incômodo, para o reflexivo. E que os videogames, quando assumem sua identidade única, podem nos tocar de formas que nenhum outro meio consegue.

No fim, talvez a pergunta certa nunca tenha sido “o que é Death Stranding?” Mas sim: Como ele deixa você depois que acaba?

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Se você chegou até aqui, já entendeu: Death Stranding nunca foi o que dizem por aí — e carrega muito mais propósito do que parecia à primeira vista.

Às vezes, tudo o que precisamos é dar o primeiro passo rumo ao desconhecido. Death Stranding é esse passo — estranho e profundo. Se você ainda não jogou, talvez esteja perdendo uma das experiências mais singulares e humanas que os games já ofereceram.

Uma resposta

  1. Meu jogo preferido atualmente. Lembro de Journey que também é um jogo “solitário e interativo”, mas DS fez algo sem comparação sendo solitário e COOPERATIVO haha 👏🏻

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