Análise | Skip and Loafer

Indo ao ar durante a temporada de primavera de 2023, que acontece entre abril e junho no Japão, Skip and Loafer é um anime que possui doze episódios. A obra é baseada no mangá de Misaki Takamatsu, que já havia criado outras histórias, mas ganhou sua primeira adaptação animada com Skip and Loafer, marcando um momento importante em sua trajetória como mangaká.

Enquanto isso, a direção da série ficou por conta de Kotomi Deai, profissional experiente com trabalhos reconhecidos como Natsume’s Book of Friends, Snow White with the Red Hair e Great Pretender. Já a produção foi assinada pelo estúdio P.A. Works, famoso por sua sólida premissa de qualidade nas animações, o que, por fim, garantiu à série uma apresentação visual condizente com sua proposta natural e um tanto sensível.

Apesar de inicialmente parecer apenas mais um anime comum, com uma animação que gerou dúvidas, Skip and Loafer conquistou o público ao longo dos episódios. Ao final da temporada, havia se tornado uma adorável surpresa para os fãs do gênero slice of life.

Sinopse: “Mitsumi Iwakura sempre teve grandes sonhos: sair de sua pequena cidade, entrar em uma universidade de alto nível e contribuir com o país antes de se aposentar em sua cidade natal. Ela está tão focada em seu objetivo que não percebe todas as outras maneiras pelas quais fracassa, para desgosto e preocupação de seus amigos e familiares. Uma camponesa ingênua pode ter sucesso na cidade grande — isto é, em Tóquio?”

Um novo começo na cidade grande

Encarar a vida em uma metrópole pode ser intimidador para quem vem de uma cidade pequena. E essa, é exatamente a premissa da primeira temporada de Skip and Loafer, obra criada por Misaki Takamatsu. Misturando elementos típicos do shoujo, como humor e emoção, com uma abordagem mais realista, o anime oferece uma narrativa envolvente sobre adaptação, amadurecimento e novas experiências.

A protagonista, Mitsumi Iwakura, decide deixar sua cidade natal, localizada na tranquila província de Ishikawa, para estudar em Tóquio. Essa mudança representa um enorme contraste entre o cotidiano calmo do interior e a agitação da capital japonesa. Cheia de planos e expectativas, ela embarca nessa nova jornada com o coração acelerado, entre o medo do desconhecido e o desejo de crescer.

Acostumada com um ambiente escolar minúsculo, onde convivia com apenas alguns colegas, Mitsumi sempre imaginou uma vida mais agitada. No entanto, ao chegar à cidade, ela se vê desorientada, tanto pelas ruas quanto pelas relações sociais. Um episódio marcante é seu desencontro no metrô, símbolo das confusões internas e externas que enfrenta ao tentar se adaptar a esse novo universo.

Mas durante essa mudança, eis que surge Sōsuke Shima, um garoto bonito e muito simpático que ajuda Mitsumi já em seu primeiro dia. Ele não apenas mostra o caminho para a escola como também se torna um apoio emocional, principalmente quando Mitsumi precisa encarar o desafio de discursar na cerimônia de abertura. A conexão entre eles surge de forma espontânea e carinhosa.

A obra reflete bem a diferença entre crescer em uma comunidade unida e enfrentar a complexidade social de uma grande cidade. No interior, as relações são diretas e acolhedoras. Já em Tóquio, existem regras sociais e expectativas mais amenas. Apesar disso, a história se destaca por apresentar personagens dispostos a orientar Mitsumi, ajudando-a a compreender esse novo ambiente sem perder sua essência.

Mesmo cometendo erros típicos de alguém inexperiente, Mitsumi encontra apoio em amigos sinceros, que valorizam sua autenticidade. Com o tempo, ela aprende a reconhecer intenções, interpretar situações e se adaptar com sensibilidade. Sua ingenuidade não é fraqueza, mas um traço que inspira empatia e confiança.

O carisma natural de Mitsumi transforma sua jornada em algo muito próximo de quem já viveu mudanças radicais. Com simplicidade e leveza, Skip and Loafer mostra como é possível crescer sem perder quem se é.

Escola, novos amigos e a vida em Tóquio

Com seu jeito desajeitado e genuíno de menina do interior, Mitsumi se destaca como uma protagonista com quem muitos podem facilmente se identificar, especialmente aqueles que já passaram por situações parecidas. Logo no início de sua nova rotina escolar, ela enfrenta um episódio marcante ao passar mal durante o discurso de boas-vindas, o que lhe rende o apelido embaraçoso de “garota que vomitou”. Apesar do contratempo, novas experiências surgem, como uma ida ao karaokê com os colegas. Em paralelo, Shima sempre aparece por perto, não apenas como o típico galã, mas como alguém que oferece apoio e gentileza, ajudando a mudar a forma como os outros veem Mitsumi.

Uma das cenas mais memoráveis ocorre quando Iwakura, com seu olhar positivo sobre as pessoas, lida com um comentário que poderia soar como zombaria, vindo de Mika. Em vez de reagir negativamente, ela analisa a situação e percebe que não havia má intenção. Seu julgamento se mostra acertado. Essa passagem nos ensina uma lição valiosa sobre a importância de não tirar conclusões precipitadas. A personalidade otimista de Iwakura se destaca ao longo da série, sempre trazendo leveza à narrativa e fazendo o leitor sorrir, mesmo nos momentos mais tensos.

Com o passar do tempo, Mitsumi se torna mais atenta ao modo como os outros a percebem. No início, por exemplo, ela não compreendia os comentários maldosos de Mika, a colega que a ridicularizava sutilmente. Mais tarde, ao notar que Sousuke não a defende diante de uma nova situação de deboche, Mitsumi se dá conta do incômodo que isso causa. Desse modo, a reação da garota acaba evoluindo, ela reconhece o erro e decide se posicionar, revelando um amadurecimento emocional importante.

Os personagens da história são retratados de maneira tão autêntica que remetem a pessoas reais que todos nós conhecemos na escola. Suas particularidades, inseguranças e dilemas, como o desejo de se destacar, o medo de não se encaixar, as paixões adolescentes e a ansiedade sobre o futuro, são abordados com sensibilidade. Tudo isso é equilibrado por um tom otimista e um humor constante, que tornam o enredo leve e próximo da realidade.

Mas Mitsumi foge do estereótipo da protagonista nerd e desengonçada. Ela deseja se enturmar, ser extrovertida, espontânea e se conectar com os outros. Seu problema não é timidez, mas as primeiras impressões que transmite. Nesse contexto, Sousuke desempenha um papel importante. Embora não se destaque academicamente, ele compensa com carisma e habilidades sociais. Sua presença ajuda os colegas a enxergarem além das excentricidades de Mitsumi e, assim como ele, muitos acabam se encantando por sua sinceridade e autenticidade.

Enquanto isso, o relacionamento entre Mitsumi e Sousuke segue um caminho que boa parte das comédias românticas trilha, a amizade. Na primeira temporada, o foco da série não está no romance, embora existam pitadas dele. Mitsumi nota a beleza de Sousuke, mas o faz da mesma forma que observa qualquer outro colega atraente. A conexão entre os dois se constrói aos poucos, com base em respeito, afeto e companheirismo, o que torna a história ainda mais envolvente e natural.

A valorização da naturalidade em Skip and Loafer

A obra de Takamatsu chama atenção pela forma sutil, mas assertiva, com que constrói seus personagens. Em vez de reduzi-los a estereótipos ou figuras exageradas com fins cômicos, a narrativa opta por uma abordagem mais realista e empática. Cada personagem é apresentado com dignidade, sem ser escondido por metáforas vagas ou tratado como mera ferramenta narrativa. A escolha pela naturalidade ressalta a humanidade presente nas histórias que se desenrolam ao longo da trama.

Entre os exemplos mais marcantes, está Nao-chan, tia da protagonista e mulher trans, que desempenha papel fundamental na série. Sua autonomia financeira e capacidade de acolhimento a tornam essencial no início da jornada da adolescente na capital japonesa. Nao-chan não só oferece suporte emocional e material, como também demonstra sensibilidade ao captar aspectos importantes da história, mesmo com poucas informações, contribuindo com orientações que ajudam a conduzir a protagonista.

Apesar de acertar no tom e na apresentação dos personagens, Skip and Loafer apresenta limitações no aprofundamento de algumas trajetórias. Afinal, personagens como Nao-chan e Mika Egashira, por exemplo, são apresentados com possibilidades de maior destaque, mas seus passados não são explorados. É compreensível, até certo ponto, que isso ocorra por se tratar da primeira temporada, em que o foco recai sobre o núcleo principal, mas a ausência de camadas adicionais compromete o impacto de suas presenças.

No entanto, esse problema acaba se tornando um pouco mais evidente quando estamos falando do casal principal. Enquanto Mitsumi tem seu crescimento bem delineado, Shima não recebe o mesmo tratamento. Mesmo com indícios de um arco em construção, certos elementos de sua história permanecem vagos. Isso dificulta a criação de vínculo com o personagem e deixa a sensação de que seu desenvolvimento ficou incompleto ao final da temporada.

Visual simples, mas bem executado

Embora a animação de Skip and Loafer não traga inovações marcantes, ela oferece momentos de grande beleza visual, especialmente quando a direção destaca as diferentes percepções dos personagens e o contraste entre o interior e a metrópole. Afinal, a seleção das tonalidades é cuidadosamente equilibrada, ajudando a criar a atmosfera e a transmitir a emoção da história para o público. Desse modo, esse equilíbrio visual é resultado do trabalho do maravilhoso estúdio P.A. Works, que já entregou produções notáveis como Paripi Koumei, Another, Angel Beats! e, mais recentemente, Buddy Daddies.

Existe um prazer particular em encontrar obras que, mesmo sem grandes expectativas ao redor, conseguem surpreender e encantar. Às vezes, um anime pode parecer comum à primeira vista ou se perder entre tantas produções similares e medianas. No entanto, Skip and Loafer converte cada capítulo em uma vivência exclusiva, que mantém o interesse devido à atenção aos pormenores e à sutileza na criação de seus personagens.

Apesar de não se destacar tecnicamente pela animação, a obra se fortalece pela direção sensível de Kotomi Deai e pelo roteiro consistente de Youko Yonaiyama. Assim, a trama adolescente é conduzida com delicadeza, mas também com firmeza, conseguindo abordar questões menos exploradas nos animes de forma madura e relevante. Isso dá à série um frescor narrativo raro, que a torna especial mesmo sem depender de grandes reviravoltas.

As cores quentes e suaves reforçam o tom calmo da história, permitindo que os personagens brilhem em meio a um cenário acolhedor. Por fim, detalhes visuais, como cortes de cena que evidenciam objetos bem desenhados, trazem ritmo à narrativa. A abertura do anime, com sua animação expressiva e música cativante, resume bem a harmonia e o charme presentes ao longo de toda a obra.

Trilha sonora eficaz e dublagem bem feita

A beleza de  Skip and Loafer vai muito além de uma trama cativante e figuras encantadoras. Um dos grandes destaques do anime é seu trabalho sonoro, que complementa de forma sutil e eficiente a narrativa. As composições escolhidas se encaixam harmoniosamente nas cenas, reforçando o tom emocional e a ambientação. Já as melodias suaves e bem conduzidas ajudam a criar uma atmosfera acolhedora, fazendo com que os laços entre os personagens se tornem ainda mais tocantes para o espectador. 

A trilha sonora é utilizada de forma cuidadosa, surgindo nos momentos apropriados para amplificar cenas de felicidade, emoção ou para apresentar novas situações. Em contrapartida, o silêncio também tem seu valor, permitindo que sons naturais, como o ambiente ao redor ou o simples ato de comer, tenham seu espaço. Por fim, essa escolha consciente permite que momentos introspectivos sejam ainda mais significativos, oferecendo ao público uma pausa sensível para absorver as nuances da história. 

Enquanto isso, a abertura e o encerramento do anime também merecem elogios. Ambos são bem sincronizados com suas respectivas sequências animadas. A abertura, em especial, se destaca pela energia cativante e pela canção “Mellow”, interpretada por Keina Suda, que traduz de forma leve e animada a essência juvenil da série. A harmonia entre imagem e som nesses trechos reforça a identidade emocional que permeia toda a obra. 

Por fim, outro ponto alto é a dublagem brasileira, que apresenta um trabalho de interpretação refinado e sensível. Afinal, Vitor Mello transmite com sutileza os momentos mais introspectivos de Shima, enquanto Samira Fernandes revela diferentes camadas emocionais da personagem Mika Egashira. Naiaama Belle, por sua vez, empresta sua voz à protagonista Mitsumi com suavidade e autenticidade, sem   exageros estereotipados e conferindo à personagem uma aura genuína e envolvente. 

Conclusão de Skip and Loafer

Skip and Loafer é uma série de animação do Japão que se destaca por abordar, de forma leve e sensível, questões como a genuína amizade e os efeitos de se permitir vivenciar novas experiências. A obra mostra como a convivência com pessoas sinceras e acolhedoras pode transformar a maneira como vemos o mundo, oferecendo apoio nos momentos difíceis e tornando a jornada mais agradável.

O encerramento da primeira temporada entrega ao público um conjunto bem equilibrado de ambientação, personagens carismáticos e conflitos que despertam interesse. O clima juvenil, repleto de emoções à flor da pele e expectativas em relação ao futuro, se mistura com um humor discreto e eficiente, criando uma atmosfera envolvente que convida o espectador a seguir acompanhando a história.

Além de retratar a rotina escolar de forma autêntica, a narrativa apresenta um recorte bastante atual: o jovem que deixa o interior para estudar na cidade grande, em busca de novos caminhos. Esse pano de fundo traz uma sensação de frescor e nostalgia, evocando memórias dos tempos de escola e das inseguranças típicas da adolescência.

Um dos pontos fortes da série é o modo como ela equilibra o cômico e o dramático. Muitas vezes, nos pegamos rindo das tentativas atrapalhadas de Mitsumi de parecer confiante, mesmo sem perceber que não domina certas situações. Esses momentos bem-humorados convivem com reflexões mais profundas, que envolvem tanto a protagonista quanto os personagens ao seu redor, criando conexões emocionais com o público.

Embora traga elementos comuns a outras obras do gênero slice of life, Skip and Loafer consegue se destacar pela forma como constrói suas relações. A interação entre Mitsumi, Shima e os demais colegas confere autenticidade à narrativa, fazendo com que cada episódio desperte a curiosidade de quem assiste. Os clichês, quando aparecem, acontecem de forma delicadeza e natural.

Sem pretensões grandiosas, o anime trata das interações sociais entre adolescentes com honestidade e cuidado. O clássico cenário do novo aluno enfrentando os desafios da adaptação ganha aqui uma abordagem sensível e bem conduzida. O elenco de apoio complementa muito bem a história, contribuindo para momentos de introspecção e também para o alívio cômico necessário.

Para quem quiser assistir, Skip and Loafer está disponível na Crunchyroll, com opção de dublagem e legendas em português. Recentemente, foi ao ar o novo visual promocional para a próxima temporada (ainda sem data de estreia). A expectativa dos fãs, é que os episódios futuros aprofundem ainda mais a história e relação entre Mitsumi Iwakura e Sousuke Shima.