Pelo segundo ano seguido, cresceu o número de telespectadores norte-americanos que assistiram à cerimônia do Oscar. Segundo os números oficiais divulgados pela Nielsen, a empresa que mede os dados de audiência nos Estados Unidos, e por sites de entretenimento com o Variety, esse ano 18,8 milhões de pessoas assistiram à cerimônia, que foi transmitida ao vivo pela ABC.
Isso representa um crescimento de cerca de 13% em relação ao ano passado, quando 16,6 milhões de pessoas acompanharam a cerimônia. Além disso, a premiação também teve um crescimento entre o público de 18 a 49 anos, que é o mais visado pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (AMPAS), instituição que organiza e entrega o Oscar.
Esse ano, a cerimônia marcou 4 pontos de audiência somente com esse público, representando assim, um crescimento de 5% desde 2020 e marcando também o terceiro ano consecutivo em que a audiência cresceu entre o público dessa faixa etária. Em 2023, a Academia decidiu retornar ao formato original da cerimônia, com um anfitrião comandando a festa em um teatro cheio de estrelas hollywoodianas. É a primeira vez, desde o início da pandemia de COVID-19, que a cerimônia retorna a esse formato.
Motivos para o crescimento
Alguns fatores, explicam esse aumento na audiência. O primeiro deles, é justamente um retorno ao formato tradicional da cerimônia, com um anfitrião comandando as ações da noite. Esse é o formato já consagrado da cerimônia e o formato com o qual o público já está acostumado. Outro fator para o aumento da audiência é justamente o anfitrião, o famoso apresentador norte-americano Jimmy Kimmel. A maioria dos especialistas da indústria afirma que a presença de Kimmel e também a forma como ele conduziu a cerimônia contribuíram, não apenas para atrair o público, mas também para mantê-lo ligado na entrega do Oscar.
Kimmel é um dos mais conhecidos apresentadores da televisão norte-americana e já tem bastante experiência em conduzir cerimônias de premiação, tendo sido, inclusive, anfitrião do Oscar em duas outras ocasiões, em 2017 e em 2018. Em 2018, aliás, era ele quem comandava a festa quando ocorreu a famosa confusão em que La La Land foi anunciado como vencedor do Oscar de Melhor Filme para só depois, já com os produtores e elenco do filme no palco, descobrirem que o verdadeiro vencedor era Moonlight.
Além disso, outro fator que pode ter influenciado positivamente a audiência da cerimônia foi a presença na competição de filmes muito populares com o público e que tiveram bilheterias enormes durante o ano. Na categoria de Melhor Filme, por exemplo, competiram os dois filmes mais vistos em 2022: Avatar: O Caminho da Água, que arrecadou mais de 2,3 bilhões de dólares em bilheterias no mundo todo e Top Gun Maverick, que arrecadou quase 1,5 bilhão de dólares nas bilheterias mundiais.
Apesar de esses dois filmes terem entrado na briga nessa categoria com poucas chances reais de vitória e serem competitivos apenas nas categorias técnicas, é inegável que a presença, entre os indicados, de filmes que as pessoas assistiram, é um incentivo a mais para que elas assistam também a cerimônia. Além disso, o principal vencedor da noite, Tudo em Todo Lugar o Tempo Todo, também é um filme bastante popular. Além de estar disponível na Amazon Prime (uma das principais plataformas de streaming do mundo), o filme foi um enorme sucesso de público desde seu lançamento inicial, ainda no começo de 2022.
Aliás, essa estratégia de tentar indicar filmes mais populares na categoria de Melhor Filme afim de tentar atrair o grande público, vem sendo tentado pela Academia desde 2009, quando eles decidiram aumentar o número de indicados ao principal prêmio da noite de cinco para 10 filmes, justamente, para acomodar super-produções que, de outra forma, nunca seriam indicados a Melhor Filme. Essa foi uma tentativa da Academia de tentar se reconectar com o grande público, já que desde que passou a premiar filmes mais “alternativos”, o Oscar havia perdido um pouco dessa conexão com o “cinema comercial”. Inclusive, falamos sobre isso em nosso texto sobre quem iria vencer o Oscar de Melhor Filme desse ano.
Outro fator que certamente também contribuiu para o aumento da audiência foi a grande presença de histórias humanas e de “voltas por cima”, na cerimônia desse ano. Que, aliás, foi coberta de diversos discursos emocionais e emocionantes. Como a incrível história de Ke Huy Quan, que após ser“rejeitado” pela indústria hollywoodiana e ter sido praticamente obrigado a desistir da carreira de ator, acabou vencendo o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante logo em seu retorno a carreira no cinema.
Outra história assim, foi a de Brendan Fraser que, igualmente, foi rejeitado pela indústria e praticamente “sumiu” das telonas, após ter atingido o auge da carreira nos anos 90, retornando triunfalmente para vencer o Oscar de Melhor Ator por seu desempenho em A Baleia. Até mesmo a história de Michelle Yeoh pode ser considerada uma história de “volta por cima”. Já que a atriz começou sua carreira como modelo e em filmes de artes marciais, sofrendo em Hollywood com o chamado “typecasting” (quando o ator é sempre escalado para os mesmos tipos de papéis) exatamente por ser asiática, mas acabou dando a volta por cima e vencendo o Oscar de Melhor Atriz.
Outras vitórias emocionantes que, de alguma forma, também conseguiram despertar a simpatia do público, foram as dos compositores da canção “Naatu Naatu”, do filme RRR: Revolta, Rebelião, Revolução e a de Jamie Lee Curtis na categoria de Melhor Atriz Coadjuvante. E é evidente que se as pessoas têm para quem torcer, aumentam as chances de que elas tenham interesse em assistir à cerimônia. A Academia sabe disso e, por isso também, vem investindo não apenas nessas “histórias humanas”, mas também tem tentado valorizar as categorias de atuação justamente para tentar explorar o “star power” dos intérpretes e despertar o interesse das pessoas em assistir à cerimônia. Inclusive, falamos sobre isso em nosso texto sobre quem iria vencer as categorias de Melhor Ator e Melhor Atriz.
No mais, existia a expectativa de saber como a Academia abordaria a questão do tapa de Will Smith em Chris Rock, ocorrida na cerimônia do ano anterior. Isso, certamente, atraiu gente que assistiu pelo menos os primeiros minutos da cerimônia para escutar as piadas com o tema feitas pelo anfitrião Jimmy Kimmell. Tirando isso, a cerimônia desse ano quase não teve surpresas e polêmicas. Nas principais categorias venceram aqueles que era favoritos. Mesmo em categorias mais disputadas como a de Melhor Ator e Melhor Atriz, por exemplo, no final deu o que era esperado. Só nas chamadas “categorias técnicas” é que ocorreram algumas surpresas, como as vitórias de Ruth E. Carter na categoria de Melhor Figurino e de Nada de Novo no Front nas categorias de Melhor Design de Produção e de Fotografia, por exemplo.
Aumento de audiência, mas ainda longe do ideal
Apesar do aumento de audiência na cerimônia tanto desse ano, quanto do ano passado, o cenário ainda está longe daquele desejado pela Academia. Primeiro, é importante lembrar que o Oscar vem de sua pior audiência da história, que ocorreu em 2021, quando em meio ao turbilhão causado por um dos piores momentos da pandemia de COVID-19, a Academia resolveu fazer uma cerimônia sóbria, com a entrega do Oscar sendo feita quase que totalmente de forma remota e praticamente sem a presença de estrelas do cinema. Além disso, a cerimônia que ocorreria em fevereiro foi adiada para abril. Por tudo isso, a cerimônia daquele ano foi assistida por apenas 10,4 milhões de americanos. A pior audiência da sua história.
A cerimônia desse ano, apesar da alta na audiência, foi a terceira menos assistida da história. Ou seja, a Academia ainda está longe de recuperar o que perdeu com a pandemia. E o cenário é ainda pior. Desde o final dos anos 1990, a cerimônia vem sofrendo com altos e baixos nos índices de audiência. Contudo, desde 2014, a cerimônia vinha perdendo consistentemente audiência até a desastrosa cerimônia de 2021 que, como já dissemos acima, foi vista por apenas 10,4 milhões de norte-americanos.
Em 2014, foram 43,7 milhões de espectadores. Em 2015, o número caiu para 36,6 milhões. Depois, em 2016, caiu ainda mais para 34,3 milhões. Em 2017, outra queda, para 32,9 milhões. Em 2018, uma queda vertiginosa para 26,5 milhões, o que fez com que, pela primeira vez na história, a cerimônia fosse vista por menos de 30 milhões de pessoas. Em 2019, uma leve alta para 29,6 milhões e em 2020 (último ano antes da pandemia), outra queda para 23,6 milhões.
Lembrando que desde que a Nielsen mede oficialmente a audiência televisiva da cerimônia do Oscar, o ano com maior audiência foi o de 1998, quando mais de 57 milhões de norte-americanos ligaram a televisão para ver Titanic levar 11 estatuetas do Oscar para casa. Não à toa, a produção era não apenas o filme mais assistido do ano, mas também o mais assistido de toda a história do cinema.
Agora, a Academia deve continuar trabalhando para tentar chegar pelo menos a marca dos 20 milhões de espectadores no próximo ano e quem sabe sonhar em atingir novamente a marca dos 30 milhões nos próximos anos. A indústria cinematográfica parece estar ajudando, já que tanto a produção de filmes quando as bilheterias (ou seja, a vontade do público de assistir a filmes) parecem ter voltado ao cenário pré-pandemia. Com isso, os organizadores do Oscar devem esperar mais super-produções de qualidade e histórias humanas que possam despertar o interesse do público na cerimônia.