Se você assiste a muitos filmes, vê séries de televisão ou consome entretenimento de uma forma geral, você já deve ter visto, em algum momento, um “retcon” e pode nem sequer ter se dado conta. No universo do entretenimento atual, onde tudo é reciclado, remodelado ou ressignificado, essa técnica de contar (ou recontar) histórias é bastante utilizada. Mas você sabe o que é um retcon?
Já explicamos aqui, de forma definitiva, o que é um “reboot” e um “remake“. Como já dissemos antes, os “reboots”, “remakes” e “retcons” são muitas vezes confundidos um com outro, mas, na verdade, são coisas diferentes. Agora, que você já sabe o que é um “reboot” (se não sabe, basta ler esse texto aqui) e um “remake” (se não sabe, basta ler esse texto aqui), chegou a vez de você saber de uma vez por todas, de forma bem explicada e com exemplos, o que é um retcon.
Lembrando que esse texto é parte da nossa série “O que é“, onde explicamos o significado de vários termos utilizados no mundo do entretenimento. Então vamos aprender o que, afinal de contas, é um “retcon”?
O que é Retcon?
A expressão “retcon” é uma abreviação para “retroactive continuity” ou “continuidade retroativa”. De forma bem simples, um retcon é um artifício utilizado por escritores e roteiristas para ignorar, modificar, ajustar ou, até mesmo, contradizer fatos estabelecidos em trabalhos anteriores dentro de uma mesma continuidade. Ou seja, algo que ocorreu em um filme anterior de uma franquia, ou no livro anterior de uma série literária, por exemplo, pode ser simplesmente ignorado, deixado de lado, modificado ou contradito no livro, ou filme seguinte.
Mas porque escritores e roteiristas iriam fazer isso? Ignorar ou contradizer, por exemplo, fatos apresentados em um trabalho anterior? Bem, isso pode ser feito por diversas razões. Em cinema, por exemplo, pode ser uma forma de “deixar de lado” um filme que tenha ido mal nas bilheterias. Ou então, uma forma de recomeçar uma franquia, sem realmente ter que “rebootá-la”. Mas não se preocupe. Nas próximas seções desse texto, listaremos os principais motivos para se usar o retcon em uma série ou franquia.
Origens do Retcon
A “continuidade retroativa” é um artifício usado há muito tempo na literatura. Um dos exemplos mais conhecidos e antigos de uso desse artificio está no conto “A Casa Vazia”, de 1903, quando Arthur Conan Doyle usa a “continuidade retroativa” para “ressuscitar” seu personagem mais famoso, Sherlock Holmes, que havia sido morto em seu conto anterior, “O Problema Final”, de 1893. Ainda mais a frente nesse texto, falaremos de forma mais aprofundada sobre esse caso.
Nos quadrinhos, um dos casos mais antigos de retcon ocorreu na série de histórias protagonizadas pelo Comando Invencível (ou “All-Star Squadron”, no original em inglês), a partir da edição 18 de suas revistas, datada de fevereiro de 1983. A série, lançada pela DC Comics, se passa na Terra 2, um universo alternativo dos quadrinhos da DC, onde os personagens envelhecem em tempo real. Ou seja, não ficam “para sempre jovens”, como ocorre na maioria dos quadrinhos.
Devido ao fato de as histórias do Comando Invencível se passarem durante a “Era de Ouro” dos quadrinhos, cada capítulo da série acabava por reescrever inúmeros aspectos da história e da tragetória de diversos heróis do universo da DC Comics. Inclusive, a expressão “retcon” foi usada pela primeira vez pelo escritor de quadrinhos Roy Thomas, na seção dedicada a cartas de leitores da edição número 20 das revistas do Comando Invencível, datada de abril de 1983. Nos quadrinhos, inclusive, é onde o artifício do retcon é mais utilizado.
Principais motivos para se usar o Retcon
Como dissemos antes, o retcon é muito utilizado tanto em cinema, quanto em televisão, quadrinhos e, até mesmo, na literatura. Mas por que será que os escritores e roteiristas utilizam tanto esse artifício? Porque eles decidem ignorar, reescrever ou contradizer fatos anteriormente apresentados em uma série, ou franquia? É sobre isso que falaremos a seguir.
Ressuscitar um personagem morto
Literatura
Esse é provavelmente o motivo que mais frequentemente leva ao uso do artifício da “continuidade retroativa”, a necessidade de ressuscitar um personagem que morreu em um filme, episódio, capítulo ou livro anterior. Lembra do caso de Sherlock Holmes que falamos acima? Ele foi morto em 1893 no conto “O Problema Final” e depois ressuscitado por seu criador, Arthur Conan Doyle, em 1903 no conto “A Casa Vazia”. Para isso, Conan Doyle utilizou uma das técnicas mais comuns de retcon, a de “esclarecer ou modificar” fatos que ocorreram em uma história anterior.
Em “O Problema Final”, Holmes e seu arquirrival, Professor Moriarty, supostamente morrem após despencarem do alto das Cataratas de Reichenbach, na Suíça. Conan Doyle queria parar de escrever histórias de detetive e, por isso, decidiu matar seu personagem mais famoso. O escritor sentia que as histórias que ele escrevia tendo Holmes como protagonista, “sugavam suas energias criativas” e o impediam de escrever “trabalhos literários mais sérios”.
Contudo, a reação do público a morte do famoso detetive, foi muito ruim. Conan Doyle, no entanto, resistiu as pressões e passou oito anos sem escrever nenhuma nova história com Sherlock Holmes. Até finalmente, começar a escrever “O Cão dos Baskervilles” em 1901. A história se passava antes dos eventos descritos em “O Problema Final” e era a primeira história a contar com a presença Sherlock Holmes desde 1893. O enorme sucesso do livro, fez com que o escritor finalmente aceitasse “ressuscitar” o personagem.
Mas como fazer isso? Bem simples. Em “A Casa Vazia”, Conan Doyle “esclarece” que Sherlock Holmes não despencou do alto das Cataratas de Reichenbach junto com Professor Moriarty. Ao invés disso, fica estabelecido que o detetive venceu a luta contra seu arquirrival e ele, sim, caiu das cataratas. Holmes, no entanto, conseguiu se segurar e sobreviver a luta. O detetive, no entanto, fingiu estar morto para assim despistar os aliados de Moriarty que ainda queriam sua cabeça e que poderiam vir atrás dele.
Televisão
Outro caso clássico de retcon para ressuscitar personagens aconteceu na famosa série de televisão Dallas, onde uma temporada inteira foi praticamente ignorada para que um personagem que havia morrido pudesse voltar a vida. No caso, o personagem era Bobby Ewing, um dos principais da série. No episódio final da oitava temporada de Dallas, exibido em maio de 1985, Bobby é morto ao ser atropelado na tentativa de salvar sua noiva, Pam Ewing.
A morte foi concebida, para que o interprete do personagem, o ator Patrick Duffy pudesse deixar a série. Contudo, um ano depois, o ator pediu para retornar ao elenco de Dallas. Mas como fazer isso? Os roteiristas da série simplesmente transformaram toda a nona temporada de Dallas, que foi feita sem a presença de Duffy, em um sonho. Isso mesmo. No finalzinho do último episódio dessa temporada, Bobby Ewing reaparece inexplicavelmente e no primeiro episódio da décima temporada, o espectador fica sabendo que toda a nona temporada, assim como o atropelamento e a morte do personagem foram apenas um sonho de Pam Ewing e, portanto, só ocorreram na cabeça dela.
Quadrinhos
Nos quadrinhos, retcons para ressuscitar personagens são tão comuns que tem até mesmo um nome próprio, “Morte de Quadrinhos” (ou “Comic book death”, no original em inglês). Isso porque, dificilmente a morte de um personagem importante nos quadrinhos é algo permanente e irreversível. Quase sempre, algum tempo depois, ele é trazido de volta de alguma forma. Por isso, os leitores de histórias em quadrinhos raramente levam a sério a morte de um personagem importante. Dessa forma, uma “morte de quadrinhos” seria uma morte “de mentirinha” que, em pouco tempo será revertida.
Cinema
Retcons para ressuscitar personagens, são bastante comuns também no cinema. Nos filmes de terror, principalmente, é extremamente comum se usar esse artifício para “ressuscitar” personagens que haviam morrido em filmes anteriores. Um exemplo clássico, são os filmes das franquias A Hora do Pesadelo e Sexta-Feira 13, que tiveram, nove e doze filmes, respectivamente. Sempre ao final de cada um desses filmes, os vilões da saga, Freddy Krueger (no caso de A Hora do Pesadelo) e Jason Voorhees (no caso de Sexta-Feira 13) morriam ou eram “mandados para o inferno” e no filme seguinte estavam de volta.
Para justificar o retorno de Freddy e Jason, os roteiristas inventavam as mais mirabolantes desculpas. Às vezes, inclusive, eles nem sequer se davam ao trabalho de justificar o retorno dos vilões. Um exemplo clássico de retcon, nesse caso, ocorre em Jason X (2003), por exemplo. Logo no início do filme, Jason Voorhees aparece já vivo, mas capturado pelas forças de segurança do governo norte-americano. Contudo, no filme anterior, Jason Vai para o Inferno: A Última Sexta-Feira (1993), o personagem havia sido morto e “enviado de vez” para o inferno.
Mesmo assim, os produtores de Jason X nem sequer se deram ao trabalho de justificar porque o personagem está “vivinho da silva” no filme. Ele apenas aparece vivo nas primeiras cenas do longa-metragem e pronto. Ou seja, eles escolheram simplesmente ignorar os acontecimentos do filme anterior. A insistência em ressuscitar Jason, inclusive, acabou virando piada entre críticos de cinema e cinéfilos em geral que muitas vezes se referiam a “insistência jasoniana” do personagem em não morrer.
Esse último caso citado, é um artifício clássico de “continuidade retroativa”. Quando o roteirista ou escritor, simplesmente ignora fatos ocorridos em filmes anteriores. Mas e quando você ignora os acontecimentos de diversos filmes dentro de uma mesma franquia? Isso pode parecer estranho, mas, na verdade, ocorre com alguma frequência. E note que aqui não estamos falando em reboot, ou seja, quando a franquia é “reiniciada” do zero e os filmes anteriores são completamente ignorados. Não. Aqui estamos falando de filmes que são “capítulos” de uma franquia e que, mesmo assim, decidiram ignorar outros filmes dessa mesma franquia.
Dois casos muito conhecidos são os das franquias O Exterminador do Futuro e Halloween. No primeiro caso, foram lançados quatro filmes entre 1984 e 2009, que eram parte da mesma linha temporal e da mesma “continuidade”, digamos assim. Com o fracasso de O Exterminador do Futuro: A Salvação (que inclusive, já contava com elementos de retcon), último desses quatro filmes, os produtores da franquia, resolveram “rebootá-la”. Assim, em 2015, foi lançado O Exterminador do Futuro: Gênesis. A produção também não foi bem recebida nem pelo público e nem pela crítica especializada.
Dessa forma, em 2019, foi lançado O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio, cuja história se passa logo após os acontecimentos de O Exterminador do Futuro 2 (1991) e ignora os fatos ocorridos em todos os outros filmes que vieram depois dele. Mesmo com tudo isso, a produção foi um enorme fracasso de bilheteria.
Já no caso da franquia Halloween, temos algo ainda mais interessante, já que ela passou por diversos retcons durante sua história. O primeiro filme da franquia, lançado em 1978, foi um enorme sucesso de crítica e público e, praticamente, fundou o sub-gênero de filmes slasher. A obra, foi seguida por uma continuação, Halloween II, lançada em 1981 e por um terceiro filme lançado em 1982, que não é protagonizado pelo vilão Michael Myers, e era um tentativa dos criadores da franquia de levá-la em outra direção.
O fracasso desse filme de 1982, levou ao lançamento de mais três filmes, em 1988, 1989 e 1995, todos protagonizados por Myers e seguindo a mesma linha temporal. Contudo, o último filme dessa série, Halloween VI – A Última Vingança, lançado em 1995, foi muito mal recebido por críticos e fãs da série. Assim, a Dimension Films (que, na época, detinha os direitos sobre a franquia) resolveu lançar em 1998 um novo filme, chamado Halloween H20: Vinte Anos Depois, cujos acontecimentos se passavam depois de Halloween II e ignoravam tudo o que havia acontecido nos outros filmes depois dele, criando assim, efetivamente, uma nova linha do tempo.
Halloween H20, teve apenas uma sequência, Halloween: Ressurreição, lançado em 2002. O fracasso desse filme fez com que a franquia fosse “rebootada” em 2007, com o laçamento de dois longa-metragens, Halloween (2007) e Halloween II (2009), ambos dirigidos por Rob Zombie e com estilo e história bem diferentes da franquia original. Contudo, depois do lançamento desses dois filmes, os direitos de distribuição da franquia passaram para as mãos da Universal Pictures. O estúdio então fez um segundo retcon da franquia, com o lançamento de Halloween (2018), cuja história se passa logo após os acontecimentos do filme original de 1978 e ignora tudo o que aconteceu em todas as outras sequências lançadas depois dele.
Ignorar obras que fracassaram ou foram mal vistas pelo público
Nos dois casos acima, tanto no caso de Halloween quanto no caso de O Exterminador do Futuro, o principal motivo para que essas franquias tenham passado por retcons (e também por “reboots”) foi a necessidade de tentar “ignorar” ou “esquecer” filmes que haviam sido mal recebidos pelo público e pela crítica. No caso de O Exterminador, os dois primeiros filmes da série, lançados em 1984 e 1991, são considerados obras-primas do cinema mundial. Contudo, do terceiro filme, lançado em 2003, em diante a franquia começou a sofrer com críticas negativas e bilheterias abaixo do esperado.
Para resolver esse problema, resolveram “rebootar” a franquia em 2015, com o lançamento de O Exterminador do Futuro: Gênesis. Como se sabe, reboots são recomeços. Dessa forma, seria possível “esquecer” os filmes anteriores, incluindo, aqueles que fracassaram. O problema é que Gênesis também foi mal nas bilheterias. A solução foi, ao invés de “rebootar” novamente a franquia, usar o artifício do retcon. Assim, os produtores decidiram manter o que tinha funcionado, ou seja, os dois primeiros filmes da série, e ignorar os outros que tinham ido mal com o público e com a crítica.
No caso de Halloween, em um primeiro momento, os criadores da franquia acharam que podiam “matar” seu protagonista, Michael Myers, e levá-la para outra direção. Vendo que isso não tinha dado certo, eles resolveram lançar filmes em sequência protagonizados por Myers, como tradicionalmente era feito no cinema de terror da época. Na primeira vez em que a série passou por um processo de “continuidade retroativa”, em 1998, os produtores decidiram manter os acontecimentos dos dois primeiros filmes da série e ignorar tudo o que havia ocorrido nas outras três sequências que haviam sido lançadas depois. Esse primeiro retcon não deu certo e gerou uma continuidade temporal que durou apenas dois filmes.
Decepcionados, eles decidiram então “rebootar” a franquia. Isso durou apenas dois filmes. Os novos donos da franquia decidiram então, novamente, usar o artífico do retcon, mas agora mantendo apenas os acontecimentos do primeiro filme e ignorando todo o resto. Isso foi feito porque, no segundo filme da série, ocorrem diversas “revelações” importantes, incluindo, a de que Michael Myers e Laurie Strode, a grande algoz do vilão em quase todos os filmes da franquia, são irmãos. Assim, ignorando os acontecimentos desse filme, também é possível ignorar esse fato.
Para corrigir previsões incorretas
Outro motivo que leva ao uso do artifício do retcon, é a necessidade de se corrigir previsões feitas em trabalhos anteriores e que acabaram por não se concretizar na vida real. Esse tipo de retcon é bastante comum na literatura de ficção científica. Muitas vezes, um autor lança um livro em que, em seu enredo, ele faz “previsões” que acabam nunca ocorrendo. Ou livros em que o enredo em si se baseia em uma premissa que acaba não se realizando.
Exemplos disso são livros que previam, por exemplo, que atualmente estaríamos andando em carros voadores ou que, a essa altura, já estaríamos viajando pelo espaço ou colonizando outros planetas, o que acabou não ocorrendo. Em O Exterminador do Futuro, por exemplo, filme que foi lançado em 1984, se previa que a Skynet dominaria o mundo em 1997. Nos filmes que foram lançados depois desse ano, por exemplo, os roteiristas sempre justificavam, de alguma forma, o fato de que já havíamos passado dessa data e a Skynet ainda não tinha “destruído” o mundo.
No livro 2001 – Uma Odisséia no Espaço, lançado em 1968, o autor Arthur C. Clarke apresenta sua “previsão” de como o mundo estaria em 2001, data em que a história do livro se passa. A grande maioria das previsões, no entanto, acabou não se concretizando. Nos livros posteriores da série, Clarke “corrige” muitas dessas previsões e incorpora elementos e descobertas que ainda não haviam sido feitas quando o primeiro livro foi escrito e lançado.
Para modificar ou esclarecer como eventos anteriores realmente ocorreram
Esse aqui também é o caso do conto “A Casa Vazia” (1903), de Arthur Conan Doyle, do qual falamos extensivamente alguns parágrafos acima. O trabalho além de ter sido lançado para “ressuscitar” um personagem que havia sido morto em uma obra anterior (nesse caso no conto “O Problema Final”, de 1893), também serviu para “esclarecer” fatos ocorridos nessa obra. No caso, em “O Problema Final” fica aparente que Sherlock Holmes morreu em uma luta com seu arqui-inimigo Professor Moriarty. Em “A Casa Vazia”, Conan Doyle esclarece que isso não ocorreu de verdade. Assim, ele modifica uma interpretação que poderia ter sido feita pelo público.
Em cinema, esse tipo de artifício é bastante utilizado em filmes com um “final surpreendente” ou “grandes reviravoltas” na história. Quando nas últimas cenas são reveladas coisas que o espectador deixou “passar batido”, ou que não foi mostrado em cena ou mesmo, que o espectador pode ter interpretado de uma forma e, na verdade, representava outra coisa. Em O Sexto Sentido (1999), por exemplo, o personagem principal (Bruce Willis) leva um tiro nas primeiras cenas do filme. Há uma passagem de tempo e, na cena seguinte, o mesmo personagem aparece sentado em um banco de praça. A maioria dos espectadores interpreta isso como um sinal de que o personagem sobreviveu ao tiro. Afinal de contas, na cena seguinte ele aparece aparentemente “vivo e bem”. No final do filme, no entanto, nos é revelado que, ao contrário de que pensávamos, o personagem, na verdade, não sobreviveu ao tiro.
Para corrigir erros ou problemas encontrados em trabalhos anteriores
Esse tipo de retcon se dá quando esse artifício é utilizado para corrigir problemas ou erros identificados em trabalhos anteriores. Quando, por exemplo, um personagem é identificado por nomes diferentes em capítulos de uma mesma série de televisão e os roteiristas, em um trabalho posterior, corrigem essa informação. Ou quando um fato é apresentado de forma diferente em dois trabalhos de uma mesma série e esse dado tem que ser corrigido posteriormente.
Um exemplo disso, ocorreu na série de animação Os Flintstones, onde a personagem Wilma é apresentada com dois sobrenomes de solteira diferentes, “Pebble” e “Slaghoople”. Na série original, em diversos episódios, a personagem é chamada por seu nome de solteira, Wilma Pebble. Contudo, como o nome de sua mãe na série é Pearl Slaghoople, os produtores da animação tiveram que corrigir esse erro depois, deixando claro em episódios posteriores que seu nome de solteira era, na verdade, Wilma Slaghoople. O mais interessante é que esse erro ocorreu simplesmente porque os criadores da série, inicialmente, não se preocuparam com a questão da continuidade dos episódios.
Retcon não é erro de continuidade
Seguindo abordando o tema sobre o qual que falamos acima, é preciso esclarecer que retcons podem ser usados para corrigir erros de continuidade, como no caso citado há pouco, mas eles não são a mesma coisa. Os erros de continuidades ou, eventuais, inconsistências temporais em filmes ou séries de televisão, por exemplo, ocorrem de forma não intencional, ou seja, por um engano ou equívoco. Já os retcons são feitos de forma intencional, ou seja, propositalmente pelos autores das obras e, portanto, não são erros ou equívocos.
Além disso, em obras em que não existe uma linha temporal clara ou em que as histórias ocorrem sempre no “passado contínuo” (ou em uma “linha do tempo flutuante”, como geralmente é chamado esse conceito), as contradições, mudanças ou fatos ignorados entre um capítulo e outro dentro da mesma obra não são considerados retcons. Isso porque, nesse tipo de obra a linha temporal simplesmente não existe e os personagens vivem sempre no presente, sem passagem clara do tempo. Portanto, as histórias são simplesmente episódicas e sem um arco de história claro.
Diversas séries de televisão, por exemplo, se passam nesse “passado contínuo”, em que o tempo não passa, os personagens não envelhecem e os fatos não sucedem uns aos outros. Duas produções televisivas muito conhecidas, são exemplos disso, Os Simpsons e Chaves. Em ambas as séries os acontecimentos de um episódio, geralmente, não afetam o que ocorre no próximo episódio. Além disso, os personagens estão quase sempre no mesmo lugar e têm a mesma idade, não existindo uma continuidade temporal clara. Sendo que, na maioria dos casos, a história de cada episódio é concluída nesse mesmo episódio.
Em Chaves, no entanto, ainda existem as histórias contadas em mais de um episódio. Nesses casos, excepcionalmente, existe uma linha temporal entre os episódios, com os acontecimentos do capítulo anterior afetando o que ocorre no próximo capítulo. Contudo, assim que a história é contada (seja, em dois, três ou quatro episódios) tudo “volta ao normal” e os acontecimentos daquela história são “esquecidos”.
Um exemplo claro disso ocorre nos episódios finais da sétima temporada de Chaves. Entre os episódios 45 e 48 dessa temporada, é apresentada uma história em quatro partes em que a vila onde os personagens da série moram é completamente reformada, incluindo, o barril do Chaves que é pintado de uma cor completamente diferente da original. Contudo, no episódio 49 dessa temporada, que se chama “Antes um tanque funcionando que uma lavadora encrencada” e é, inclusive, o último da fase clássica do seriado, tudo “volta ao normal” e a vila está como era antes da reforma, com o barril do Chaves voltando a sua cor e aspecto clássicos.
Conclusão
Esperamos que você tenha gostado desse texto e que ele possa ter esclarecido quaisquer dúvidas que você eventualmente poderia ter sobre o que é um retcon. Tentamos escrever um texto o mais completo possível e que abordasse todos os aspectos desse artifício que é bastante utilizado não apenas no cinema, mas também em todas as áreas da indústria do entretenimento. Tentamos também trazer exemplos conhecidos para te ajudar a entender com mais clareza esse conceito. Assim, se você gostou desse texto, deixe o seu like e também o seu comentário abaixo.