Coraline Jones, uma menina de onze anos, se muda com seus pais, Charlie e Mel, de Pontiac, Michigan, para o Pink Palace Apartments, uma antiga residência vitoriana em Ashland, Oregon. Ao explorar o local, ela encontra Wyborn “Wybie” Lovat, neto da senhoria, que lhe presenteia com uma boneca de pano igual a ela. Em uma noite, Coraline encontra uma porta secreta que, a princípio, mostra uma parede de tijolos, mas posteriormente se transforma em um túnel que a conduz a um “Outro Mundo”. Lá, ela encontra versões perfeitas de seus pais, com olhos de botão.
Embora a princípio pareça fascinante, o Outro Mundo rapidamente mostra seu lado obscuro quando a “Outra Mãe”, conhecida como Beldam, sugere que Coraline fique lá para sempre, contanto que aceite ter botões costurados nos olhos. Ao recusar a oferta, Coraline é trancafiada em um quarto escuro dentro de um espelho, onde encontra três crianças fantasmas, entre elas a tia-avó de Wybie. Elas contam que foram enganadas por Beldam, que lhes tomou suas almas.
Com a ajuda do “Outro Wybie” e do gato preto, Coraline consegue fugir, porém descobre que seus pais foram sequestrados. Com uma pedra de víbora oferecida por suas vizinhas Spink e Forcible, ela desafia Beldam a um jogo: se conseguir localizar os três “olhos” das crianças e de seus pais, todos serão libertados. Coraline supera cada obstáculo, libertando os espíritos, porém a Beldam, em sua forma de aranha, tenta enganá-la. Coraline, com astúcia e auxílio do gato, salva seus pais e retorna ao mundo real, apesar da mão da Beldam tentar persegui-la.
Na batalha final, Wybie a auxilia a eliminar a mão e a jogar a chave no poço, fechando o portal para sempre. A história conclui com Coraline em paz com sua vida e mais próxima de sua família e vizinhos.
Direção do filme Coraline
Coraline foi dirigido por Henry Selick, e sua direção recebeu muitos elogios pela complexidade técnica: foram cerca de quatro anos de produção, com mais de 18 meses apenas de filmagem em stop motion, em que animadores produziam de 2 a 6 segundos por semana. Diferente da maioria dos stop motions, que usam 12 quadros por segundo, o filme foi rodado em 24 FPS na maior parte das cenas, garantindo movimentos mais fluidos e naturais, especialmente nas expressões e no cabelo da personagem, o que elevou o realismo visual, mas também aumentou drasticamente o trabalho de produção.
Esse realismo em contraste com a atmosfera infantil e sombria, torna algumas cenas do filme muito perturbadoras. Por exemplo a introdução do filme, carregada de alusões viscerais, com um boneco tendo seus olhos arrancados e botões costurados no lugar, todo seu enchimento sendo retirado, e por fim virado do avesso. Essa cena parece uma mensagem subliminar de como “A Outra Mãe” faz com as crianças.
Em resumo, o diretor de “Coraline” se destaca não só pela inovação técnica, mas também pela habilidade de equilibrar elementos de encantamento e inquietação. Isso proporciona uma experiência cinematográfica que causa fascínio e desconforto simultaneamente. Dessa forma a adaptação deixa uma impressão duradoura na memória do espectador.
Em que foi baseado Coraline
Coraline, se tornou um dos contos de fantasia mais sombrios e populares do mundo. O filme foi baseado na novela homônima escrita por Neil Gaiman. Além disso, o escritor também se destaca por grandes HQs como The Sandman (1989–1996), publicada pela DC/Vertigo, tida como uma das obras-primas dos quadrinhos contemporâneos. Combina mitologia, literatura, terror e fantasia, sendo a primeira série de quadrinhos a receber um prêmio literário significativo (World Fantasy Award).
O livro Coraline conquistou diversos prêmios literários entre, 2002 e 2003, importantes como por exemplo o Hugo Howard na categoria de melhor história curta. Outras conquistas importantes incluem Bram Stoker Awards, British Science Fiction Association Award, e diversos outros. Até hoje esse livro conquista pessoas, e atrai leitores, provando o poder de que uma boa narrativa pode exercer, seja você um cinéfilo, leitor, ou só alguém que quer passar o tempo. Mas como qualquer adaptação, há diversas decisões criativas presentes no filme.
Comparação entre o livro e o filme
Há diversas decisões criativas de Henry Selick no filme Coraline, que divergem do conto original. Por exemplo, no livro Coraline é uma garota muito esperta, e percebe desde cedo as intenções perversas de Beldam. No livro, ela é bem mais ríspida, interativa, e apesar de aprender rápido, demora para perceber as intenções da “Outra Mãe”. Algumas das outras diferenças são:
Local onde se passa a trama:
- No livro, toda a trama se passa na inglaterra
- No filme, Coraline se passa em Oregon
Estratégia da “Outra Mãe”:
- No livro, “A Outra Mãe” só espera as crianças passarem pela porta, e então tece estratégias para prendê-las no seu mundo.
- No filme, “A Outra Mãe” exerce influência no mundo dos humanos, colocando bonecas para espionar suas vítimas, usando ratos para atrair até o portal para seu mundo.
Wybie não existe:
- No livro, Wybie não existe.
- No filme, Wybie é criado por Henry Selick, e dá mais equilíbrio à trama, ajudando Coraline a derrotar Beldam.
As alterações realizadas por Henry Selick não só adaptam Coraline para um formato de filme mais dinâmico, como também expandem a história, introduzindo novos elementos visuais, personagens e técnicas de suspense ausentes no conto original. Ao modificar o cenário, a personalidade da protagonista e a atuação da Beldam, o filme cria uma experiência única que se relaciona com a obra de Neil Gaiman, mas apresenta uma interpretação própria que consegue encantar tanto os leitores do livro quanto os espectadores que assistem à história pela primeira vez.
Melhores momentos
O capricho e todo trabalho tornou Coraline, um filme cheio de cenas tensas, assustadoras, e muito estéticas. Por exemplo, quando a pequena garotinha entra pela primeira vez no jardim do outro mundo, seu outro pai a coloca em cima de um robô, e juntos, passeiam entre flores vermelhas iluminadas por lâmpadas laranjas. O filme é muito rico em saturação e vibração no primeiro ato, quando tudo está correndo bem. Algumas das outras melhores e mais bonitas cenas dessa adaptação são:
A mulher e o fantoche: No jardim artificial, o “Outro Pai” começa a definhar sob o controle da Beldam. Sua pele perde cor, os movimentos se tornam mecânicos e a expressão distorce a dor. Entre sussurros e avisos velados para Coraline, a Beldam o desfaz, revelando sua crueldade e o fim iminente daquele mundo ilusório.
Crianças mortas: Em um quarto escuro, três fantasmas de crianças contam a Coraline que a Beldam costurau botões em seus olhos e tomou suas almas. A atmosfera se torna mórbida e intensa, e o momento se transforma em uma das cenas mais impactantes e memoráveis do filme, graças às vozes ecoantes e aos olhares vazios.
Beldam, o demônio: Quando Coraline se revolta completamente, Beldam, revela características alongadas, pele fina, dedos transformados em garras e sorriso intimidador. No clímax, aparece como uma criatura aracnídea e esquelética, mostrando sua natureza monstruosa. Essa mudança intensifica o horror, revelando a realidade oculta por trás da aparência convidativa e dos enganosos olhos de botão.
Essas cenas não saem mais da cabeça de quem assiste o filme Coraline. O trabalho deTadahiro Uesugi, um ilustrador e designer japonês foi excepcional. Ele desenvolveu a identidade visual e a estética dos personagens e cenários, elementos mais com um apelo gigantesco nesse filme.
Teoria sobre o final do filme
A princípio, a teoria, chamada pelos fãs de “o final não é real”, sugere que Coraline nunca realmente escapou do Outro Mundo e que a cena final é apenas outra ilusão criada pela Beldam para mantê-la cativa.
E algumas coisas reforçam essa teoria. Por exemplo, os pais não recordam o sequestro nem mostram sinais de trauma, o que sugere que podem não ser os pais reais. Além disso, no final, Coraline joga a chave da Beldam no poço. Na teoria, isso não é uma vitória, mas um ritual simbólico que sela seu compromisso com o Outro Mundo, “enterrando” a chance de escapar.
Nenhuma dessas teorias, incluindo a de que Coraline nunca saiu do Outro Mundo, foi confirmada oficialmente por Neil Gaiman, Henry Selick ou os produtores do filme. Mas isso também mostra como o filme foi bem elaborado, tanto por sua riqueza de detalhes, quanto por sua estética. Esses elementos dão margem para aflorar a imaginação do espectador, e convidá-lo a assistir o filme em busca de mais detalhes.
Trilha sonora de Coraline
A trilha sonora de Coraline, composta por Bruno Coulais, se mostrou como um dos elementos que mais se sobrepõem no filme. Coulais tem bastante experiência em produzir álbuns para obras de animação e fantasia. Por exemplo, obras como “Mune: O Guardião da Lua”, “Max & Companhia”, e “WolfWalkers”.
Em geral, o músico empregou corpos etéreos, sons dissonantes e melodias suaves. Dessa forma, o compositor conseguiu destacar a dualidade entre o mundo real e o Outro Mundo. De fato, isso intensifica a sensação de fascínio e temor simultaneamente.
A faixa principal da trilha sonora de Coraline é “Other Mother”. Essa música se destaca por uma melodia inquietante, cantada por um coro de vozes semelhante a de crianças. Os coros são usados de forma quase fantasmal, sem letras definidas, funcionando mais como uma textura sonora que reforça a sensação de um mundo paralelo e ameaçador. Nesse aspecto o filme lembra bastante “A Hora do Pesadelo” com a faixa iconia, “One, Two, Freddy’s Coming for You”. Por fim, o trabalho de Bruno Coulais no filme Coraline, se tornou icônico por melodias que captam imediatamente a nossa atenção.
Conclusão
Coraline é uma das animações mais profundas e belas já lançadas no cinema, e conseguiu consultar grandes prêmios como Annie Awards. Essa adaptação nos convida a refletir sobre como nossos desejos podem nos levar a caminhos sem volta. Outra mensagem linda que o diretor Henry Selick trouxe para esse filme é a de não negligenciar nossa presença para com as pessoas à nossa volta.
A profundidade, a estética, as músicas, resultaram em uma animação atemporal, que encanta as pessoas até os dias de hoje. Coraline é um convite para atravessar a porta e encarar o desconhecido. Entre costuras e sombras, tece uma fábula onde o belo e o macabro dançam lado a lado. Mais que um filme, é um feitiço visual, cuja estranheza hipnotiza e permanece muito depois que a luz se apaga. Até a próxima!