Se você acompanha frequentemente notícias sobre cinema, é bem provável que você já tenha lido em algum lugar a expressão “Oscar bait”. Ela é muito utilizada especialmente na chamada “temporada de premiações”, que normalmente vai de novembro a março e é o período em que são entregues as principais premiações da indústria televisiva e cinematográfica. Mas afinal de contas o que é “Oscar bait”? Se você não sabe e quer saber ou se já sabe um pouco e quer aprofundar seus conhecimentos, leia esse texto até o final pois explicaremos tudo para você de forma bastante completa.

O que é Oscar bait?

De forma bem resumida, Oscar bait são filmes produzidos, supostamente, com o interesse em ser indicado ou vencer o Oscar, que é a premiação mais importante da indústria cinematográfica mundial. Essas produções carregam consigo algumas características peculiares e também utilizam estratégias de lançamento e promoção específicas que têm por objetivo atrair a atenção dos membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas (AMPAS) de Hollywood, a instituição que organiza e entrega o Oscar.

A expressão “Oscar bait” significa “Isca para o Oscar”, na tradução literal para o português. No texto a seguir, iremos detalhar as características de um Oscar bait, a história por trás da criação e do uso do termo, o Oscar bait como uma estratégia comercial e também as polêmicas envolvendo o uso do termo, que muitas vezes carrega conotações pejorativas. Ou seja, iremos destrinchar em detalhes o tema.

Características de um Oscar bait

A primeira coisa necessária para entender o que é um Oscar bait é saber quais são suas principais características. Assim, você será capaz de distinguir com facilidade uma produção desse tipo. Como falamos acima, um Oscar bait é um filme supostamente criado para atrair os membros votantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas e, assim, obter indicações e vitórias no Oscar, o prêmio mais importante do cinema. E aqui usamos a palavra “supostamente”, devido as polêmicas em volta do uso dessa expressão, sobre as quais falaremos mais adiante.

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Data de lançamento

Uma das principais características de um Oscar bait é ser lançado na temporada de premiações, especialmente no mês de dezembro. Aliás, uma parte significativa dos Oscar bait são lançados já no final de dezembro, muitas vezes com lançamentos limitados a poucas salas de cinema em Los Angeles e Nova York, as duas principais cidades dos Estados Unidos. Assim, esses filmes consegue cumprir os requisitos mínimos exigidos pela Academia, para poderem concorrer ao Oscar no ano seguinte.

Cena de Rainha Vitória (1933). Créditos: Metro-Goldwyn-Mayer
Cena de Rainha Vitória (1933). Estrelado por Greta Garbo, o filme foi um dos primeiros a estrear em poucas salas no final do ano apenas para ficar elegível a concorrer ao Oscar. Créditos: Metro-Goldwyn-Mayer

Dessa forma, o lançamento comercial da obra para o público em geral só ocorre em janeiro ou mesmo fevereiro quando as indicações ao Oscar já foram divulgadas pela Academia. Assim, a produção aproveita toda publicidade grátis em volta de seu nome para atrair mais público. Além disso, devido ao fato de o filme ter sido recentemente lançado, ele fica bastante fresco na mente dos membros votantes da Academia.

Sendo assim, em tese, muito mais fácil de ser lembrado para uma eventual indicação ao Oscar. É evidente que um filme lançado, por exemplo, em março, logo após o Oscar, terá muito mais dificuldades para ser lembrado na temporada de premiações seguinte. Dessa forma, o filme tem que ser muito bom para ainda ficar fresco na mente daqueles que votam nas principais premiações do ano, como o Oscar, o BAFTA e o Globo de Ouro.

Elenco composto por atores renomados

Outra característica importante dos Oscar baits é a equipe técnica por trás das câmeras e o elenco à frente delas. Quase sempre, esse tipo de filme conta com um elenco estelar composto por diversos atores e atrizes respeitados na indústria e, muitas vezes, com indicações ou mesmo vitórias anteriores no Oscar. Isso faz com que o filme imediatamente atraia a atenção da crítica, do público e, é claro, dos membros votantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.

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Poster de Asteroid City (2023). Créditos: Universal Pictures International e Focus Features.
Poster de Asteroid City (2023). Um elenco recheado de estrelas, como o de Asteroid City, é uma das principais características de um Oscar bait. Créditos: Universal Pictures International e Focus Features.

Peguemos como exemplo a atriz Meryl Streep. Com 21 indicações ao Oscar (17 como Melhor Atriz e quatro como Melhor Atriz Coadjuvante), ela é a interprete mais indicada de toda a história do Oscar. Isso quer dizer que praticamente qualquer filme com ela é, pelo menos em tese, “oscarizável”, ou seja, tem a possibilidade real de obter indicações ao Oscar. Ainda mais se esse filme possuir outras características de um Oscar bait.

Isso não ocorre só com Streep, mas também com outros atores e atrizes muito respeitados ou então que estão no auge, recebendo indicação ano após ano a premiações importantes. Gente como Tom Hanks, Kevin Spacey (nos seus bons tempos), Anthony Hopkins, Viola Davis, Denzel Washington, Nicole Kidman, entre outros.

Nomes renomados por trás das câmeras

Além disso, como dissemos, Oscar baits normalmente também contam com um equipe de renome por trás das câmeras, principalmente, na direção da obra. Tomemos como exemplo Steven Spielberg. O diretor possui mais de 20 indicações ao Oscar, incluindo nove indicações na categoria de Melhor Diretor. Sendo, inclusive, o único diretor a ser indicado ao Oscar de Melhor Direção em seis décadas diferentes.

Steven Spielberg na San Diego Comic Con de 2017. Foto de Gage Skidmore.
Steven Spielberg na San Diego Comic Con de 2017. Praticamente todos os filmes dirigidos por ele a partir de 1975, receberam algum tipo de reconhecimento da Academia. Foto de Gage Skidmore.

Quase todos os filmes dirigidos por Spielberg desde Tubarão (1975) receberam algum tipo de reconhecimento da Academia, nem que seja em categorias técnicas e “menos importantes”. Dessa forma, toda vez que o diretor lança um filme, a produção se torna automaticamente candidata ao Oscar. Isso não ocorre apenas com Spielberg, ocorre também com outros diretores renomados, como Martin Scorsese e Francis Ford Coppola, por exemplo. Além disso, também ocorre com outros profissionais renomados de outras áreas da indústria do cinema.

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Por exemplo, Emmanuel Lubezki é um dos principais diretores de fotografia do cinema atual. Ele já tem oito indicações ao Oscar, inclusive, vencendo o prêmio da Academia por três anos seguidos entre 2013 e 2015. Assim, praticamente qualquer filme que tenha Lubezki como diretor de fotografia, será um possível candidato ao Oscar na categoria de Melhor Direção de Fotografia.

Diane Warren. Créditos: Erik Melvin.
Diane Warren. A compositora já foi indicada 14 vezes ao Oscar. Créditos: Erik Melvin.

Outro exemplo parecido é o de Diane Warren. A compositora norte-americana possui impressionantes 14 indicações ao Oscar de Melhor Canção Original. Tendo sido, inclusive, indicada em todas as edições do prêmio da Academia desde 2017 e, da mesma forma, tendo sido indicada por quatro anos seguidos entre 1996 e 1999. Assim sendo, quase toda canção para filme composta por ela é uma possível candidata a indicação ao Oscar.

Só para se ter uma ideia, nesse ano, Warren foi indicada ao Oscar por uma canção composta para um filme italiano que nem sequer estreou direito nos cinemas norte-americanos, passando apenas por festivais e indo direto para plataformas de streaming. Ou seja, pode-se afirmar quase que com 100% de certeza, que se Warren não fosse a compositora da canção dificilmente ela seria indicada ao Oscar.

Edith Head. Créditos: Everett Collection.
Edith Head. A figurinista foi indicada em todas as edições do Oscar entre 1948 e 1966. Créditos: Everett Collection.

Outro caso emblemático é o de Edith Head. Entre 1948 e 1966, a famosa figurinista americana foi indicada ao Oscar de Melhor Figurino em todos os anos. Em alguns anos, inclusive, ela recebeu mais de uma indicação por trabalhos diferentes. Head terminou sua carreira em Hollywood com incríveis 35 indicações e oito vitórias no prêmio da Academia. Ou seja, durante boa parte dos anos 1950 e 1960, quase qualquer filme que contasse com Head como figurinista teria uma enorme chance de receber uma indicação ao Oscar.

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Temas que agradam a Academia

Além da questão da data de estreia e do elenco e equipe estelares, os Oscar baits geralmente também carregam uma outra peculiaridade. Eles normalmente possuem temáticas que supostamente agradam os membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. Algumas dessas temáticas são “clássicas” e mudaram pouco ao longo das últimas décadas. Outras, no entanto, mudam ao sabor do tempo.

Filmes históricos e biopics

Entre as temáticas mais clássicas que costumam atrair os membros votantes da Academia estão as biografias (ou “biopics”, como é chamado o gênero em inglês) e os filmes históricos de forma geral. Normalmente, todo filme biográfico que conte com um elenco estelar e nomes famosos por trás das câmeras tem chances reais de receber uma indicação ao Oscar. Ainda mais se o personagem principal for forte e a história for interessante e/ou pouco conhecida.

Cena de Al Lista de Schindler (1993). Créditos: Amblin Entertainment e Universal Pictures.
Cena de Al Lista de Schindler (1993). Filmes históricos e que tratam de temas complexos, como o Holocausto, costumam atrair mais os membros da Academia. Créditos: Amblin Entertainment e Universal Pictures.

Filmes históricos, principalmente épicos, também costumam atrair os olhares dos membros votantes da Academia. Historicamente, eles são especialmente atraídos por filmes que se passam durante a Segunda Guerra Mundial e abordam aspectos como o Holocausto, por exemplo. Aliás, o fato de os membros da Academia terem predisposição por premiar filmes que têm o Holocausto como ponto central já gerou até mesmo algumas críticas.

Contudo, de forma geral, filmes históricos tem boas chances de obter indicações ao Oscar. Isso porque, esse tipo de obra geralmente possui grandes valores de produção. Dessa forma, mesmo que o filme não consiga obter indicações nas principais categorias, tem grandes chances de obter nas categorias técnicas, como direção de arte, figurino e maquiagem, por exemplo.

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Cena de A Escolha de Sofia (1982). Créditos: Universal Pictures.
Cena de A Escolha de Sofia (1982). Filmes com histórias dramáticas e complexas e personagens fortes costumam ser procurado por atores que desejam aumentar suas chances de ser indicado ou mesmo vencer o Oscar. Créditos: Universal Pictures.

Da mesmo forma, interpretar personagens históricos ou em situações complexas, como uma guerra, por exemplo, pode dar aos intérpretes uma grande plataforma para uma indicação ou mesmo vitória no Oscar. Por isso também, filmes biográficos são amados por atores e atrizes, por dar a eles uma plataforma para mostrar seu talento e, eventualmente, serem indicados a premiações importantes, como o Oscar.

Exemplos disso não faltam. Meryl Streep, por exemplo, que é considerada a rainha das premiações com 21 indicações ao Oscar, obteve suas duas vitórias na categoria de Melhor Atriz, justamente em filmes históricos. Em A Escolha de Sofia (1982), ela interpreta uma mulher judia que durante o Holocausto é obrigada a escolher qual de seus dois filhos irá morrer.

Cena de O Artista (2011). Créditos: Warner Bros.
Cena de O Artista (2011). Filmes sobre o cinema ou que são vistos como homenagens à sétima arte, também costumam atrair os membros da Academia. Créditos: Warner Bros.

Já em A Dama de Ferro (2011), um filme histórico e biográfico, ela interpreta a ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, uma figura forte, controversa e de grande importância histórica. E esse é só um dos muitos exemplos de filmes históricos e biográficos que deram plataforma para seus intérpretes se destacarem.

Outro tema recorrente que costuma desperta o interesse da Academia, são os filmes que falam de cinema ou se passam em Hollywood. Obras sobre a história do cinema hollywoodiano ou que tem Hollywood como cenário principal. Quase todos os anos, uma produção do tipo recebe indicações ao Oscar, inclusive, em categorias principais como Melhor Filme.

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Cena de Os Fabelmans. Créditos: Universal Pictures.
Cena de Os Fabelmans, filme que junta um diretor consagrado, um elenco de atores famosos e uma história que homenageia o cinema, uma combinação que garantiu a obra diversas indicações ao Oscar. Créditos: Universal Pictures.

Além disso, nos últimos anos, filmes como O Artista (2011), Argo (2012) e Birdman (2014), por exemplo, ganharam o Oscar de Melhor Filme com histórias que tinham Hollywood e o cinema de forma geral, como personagem central. Isso sem falar de filmes como Os Fabelmans (2022) e Era uma Vez em… Hollywood (2019) que foram indicados nessa categoria e não venceram, mas que tinham Hollywood e o cinema como ponto central da história.

Filmes independentes e “diferentes”

Ademais, nas últimas décadas, os membros votantes da Academia também parecem ter desenvolvido um gosto por filmes “pequenos”, independentes e com roteiros criativos. Desde a ascensão dos filmes independentes nos anos 1980 e 1990, a Academia tem cada vez mais dado oportunidades a produções que em outras épocas não teriam a mínima chance de sonhar com uma estatueta ou mesmo uma indicação ao Oscar.

Cena de Os Excêntricos Tenenbaums (2001). Créditos: Buena Vista Pictures.
A partir dos anos 1980, filmes independentes dirigidos por cineastas talentosos, contando com roteiros criativos e um elenco estelar como Os Excêntricos Tenenbaums (2001), começaram a atrair bastante a atenção dos membros da Academia. Créditos: Buena Vista Pictures.

Contudo, com o crescimento desse setor da indústria cinematográfica (em 2005, ele representava 15% da receita de bilheterias nos Estados Unidos), os membros da AMPAS tem cada vez mais dado espaço a filmes com orçamentos pequenos e que contam com roteiros criativos e originais e com grandes atuações de seus intérpretes.

Alguns dos nomes mais famosos do cinema independente, viraram queridinhos da Academia. Um exemplo é Wes Anderson. Nenhum filme do diretor até hoje arrecadou mais de 75 milhões de dólares em bilheterias e a produção mais cara de sua carreira custou 50 milhões de dólares para ser produzida, sendo que a maioria de suas obras custam em média cerca de 20 milhões para serem feitas. Contudo, quase todos os seus filmes nos últimos 20 anos foram reconhecidos pelo Oscar, Globo de Ouro ou BAFTA.

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Cena de Shakespeare Apaixonado (1998). Créditos: Miramax Films e Universal Pictures.
A vitória de Shakespeare Apaixonado (1998) na categoria de Melhor Filme no Oscar de 1999 marcou o auge do Oscar bait como estratégia comercial pelos irmãos Weinstein. Créditos: Miramax Films e Universal Pictures.

Isso porque, Anderson possui um estilo único, com roteiros criativos e inovadores e um visual muito peculiar. Assim, apesar de seus filmes não possuírem muito apelo comercial (apesar de serem quase sempre lucrativos), eles são queridinhos dos votantes do Oscar e de outras premiações importantes. Além de Anderson, outros diretores como os Irmãos Cohen, Steven Soderbergh, Paul Thomas Anderson e até mesmo Woody Allen (antes de ser “cancelado” por Hollywood) são exemplos de diretores do cinema independente que são sempre apreciados pela Academia.

Além disso, com a ascensão da Miramax Films nos anos 1980 e início dos anos 1990 sob a liderança dos irmãos Weinstein, diversos filmes independentes distribuídos pelo estúdio conseguiram indicações ao Oscar e outras premiações importantes do cinema. Tudo graças a um novo estilo de campanha publicitária agressiva criada pelos Weinstein que foi muito bem sucedida e que foi, inclusive, copiada por outros estúdios independentes.

Talvez o auge desse gosto da Academia pelos filmes independentes tenha ocorrido em 2010, quando Guerra ao Terror, dirigido por Kathryn Bigelow e estrelado pelo, então, pouco conhecido Jeremy Renner, venceu o Oscar de Melhor Filme, derrotando Avatar, de James Cameron. O filme havia custado apenas 15 milhões para ser produzido e arrecado cerca de 49 milhões em bilheterias no mundo todo.

Cena de Guerra ao Terror (2008). Créditos: Summit Entertainment.
A vitória de Guerra ao Terror (2008) na categoria de Melhor Filme no Oscar de 2009, marcou o auge da preferência da Academia por filmes de orçamento moderados. Créditos: Summit Entertainment.

A produção, aliás, é até hoje um dos únicos dois filmes a vencerem a principal categoria do Oscar sem nunca terem ficado uma vez sequer entre os dez filmes mais assistidos em algum final de semana durante o ano. Mesmo assim, os membros votantes da Academia preferiram premiar a obra com as duas principais estatuetas da noite, Melhor Filme e Melhor Diretor, e deixar a ver navios Avatar, que havia custado 237 milhões de dólares para ser produzido e havia arrecado quase 3 bilhões de dólares em bilheterias. O que era, naquele momento, a maior bilheteria da história do cinema mundial.

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Temas do momento, luta contra opressão e representatividade

Como dissemos, alguns temas que agradam a Academia são praticamente atemporais, já outros mudam com o tempo. Nessa seção de nosso texto, falaremos sobre aqueles que estão em voga nesse momento. É importante lembrar que algumas temáticas que antes produziam filmes premiados, hoje não são mais tão aceitas pela Academia e outras que antes eram relegadas a um segundo ou mesmo terceiro plano, agora são quase que garantia de uma indicação ao Oscar. Uma dessas novas temáticas é a representatividade.

Cena de Moonlight: Sob a Luz do Luar (2016). Créditos: A24.
A partir dos anos 2000, a Academia passou a dar mais atenção a filmes que dão visibilidade a grupos considerados minoritários ou discriminados, como Moonlight: Sob a Luz do Luar (2016). Créditos: A24.

A Academia, inclusive, criou regras para aumentar a diversidade e representatividade dos filmes indicados e vencedores da premiação. O fato, chegou até mesmo, a causar polêmica na época de seu anúncio. No entanto, mesmo que não existisse nenhuma regra explícita, está claro que nos últimos anos, os membros da Academia tem tentado reconhecer filmes que prezam por diversidade e representatividade. Tentando assim indicar e premiar atores e profissionais de grupos considerados minoritários e oprimidos e filmes que versem sobre esses temas.

Essa tendência, pode ser facilmente percebida se observarmos a lista de obras indicadas ao Oscar de Melhor Filme nos últimos 10 ou 20 anos. Em quase todos os anos, será possível encontrar produções com esse tipo de temática de luta contra a opressão ou mesmo que trazem a luz grupos ou pessoas consideradas marginalizadas e esquecidas pela maioria da sociedade. Algumas obras com esse tipo de temática, como Moonlight (2016) e Parasita (2019), por exemplo, chegaram até mesmo a vencer a categoria de Melhor Filme.

É importante também destacar, que essas temáticas que agradam a Academia podem, como dissemos, ser mais perenes ou mudar constantemente. Essas mudanças dependem muito do perfil das pessoas que compõem o corpo de votantes da AMPAS e também, obviamente, do momento social, político e histórico do mundo. Além disso, em algumas ocasiões até mesmo o que está em voga pode afetar a tendência da Academia de premiar um tipo de filme.

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Cena de Parasita (2019). Créditos: CJ Entertainment
Nos últimos anos, os membros da Academia passaram a dar mais atenção a filmes que versavam sobre temas sociais mais atuais, como Parasita (2019). Créditos: CJ Entertainment.

Por exemplo, se o cinema produzido em um determinado país está em alta, fica muito mais fácil para que filmes daquele país consigam ser indicados ou mesmo vencer o Oscar. Ou então, quando um tipo de filme ou gênero cinematográfico está em alta, igualmente produções daquele gênero ou com aquele estilo têm muito mais chances no Oscar do que teriam em outras épocas.

A história do Oscar bait

Já falamos sobre o que é um Oscar bait e sobre suas principais características. Agora, faleremos um pouco sobre a história da expressão. Praticamente desde que o prêmio da Academia passou a ter importância em Hollywood, os estúdios buscaram estrear filmes mais no final do ano, afim de melhorar suas chances de brigar pelo Oscar. Ainda mais, quando o filme era visto como tendo “perfil” para eventualmente receber indicações ou mesmo receber a estatueta.

Cena de E o Vento Levou (1939). Créditos: Metro-Goldwyn-Mayer.
Cena de E o Vento Levou (1939). O filme foi o primeiro a usar a estratégia de estreia limitada no final do ano de forma bem-sucedida. Créditos: Metro-Goldwyn-Mayer.

Um dos casos mais conhecidos desse período, é do filme Rainha Christina, estrelado por Greta Garbo. Lançado no final de dezembro de 1933 apenas em Nova York e Los Angeles, o filme só foi estrear no resto dos Estados Unidos e em outros países do mundo em 1934. Apesar de ter sido um enorme sucesso de crítica e público na época de seu lançamento, a produção não recebeu nem sequer uma indicação ao Oscar.

Muita gente considera esse, um dos primeiros casos de Oscar bait da história. Já que o lançamento no final de dezembro nas duas primeiras cidades americanas se deu unicamente para que o filme se tornasse elegível a uma possível indicação ao prêmio da Academia. Seis anos depois, a MGM, estúdio responsável pela distribuição de Rainha Christina, repetiria a mesma estratégia, porém com muito mais sucesso.

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Cena de Sangue de Heróis (1948). Créditos: RKO Radio Pictures.
Cena de Sangue de Heróis (1948). Foi em uma resenha sobre o filme que a expressão “Oscar bait” foi usada pela primeira vez. Créditos: RKO Radio Pictures.

Lançado em 15 de dezembro de 1939, E o Vento Levou só teria uma estreia ampla em 1940. Aliás, até julho de 1940, o filme só foi exibido em sessões especiais em salas de cinema selecionadas e com ingressos bem mais caros que a média de preços da época. A estratégia não apenas fez com que o filme arrecadasse a maior bilheteria da história do cinema até então, mas também fez com que ele fosse agraciado com 13 indicações e 10 vitórias no Oscar daquele ano. Um recorde histórico.

Apesar dessa estratégia ter sido, portanto, criada quase que junto com o Oscar, o termo “Oscar bait” só foi usado pela primeira vez em 1948. O termo foi usado em uma crítica do filme Sangue de Heróis, de John Ford, publicada na famosa revista norte-americana The New Republic naquele ano. “Os cartões postais deveriam ser enviados pelo correio; exibidos conscientemente na tela, eles parecem uma isca para o Oscar”, escreveu o crítico de cinema da revista.

A Trágica Farsa (1956). Créditos: Columbia Pictures.
A Trágica Farsa (1956). O filme seria o último da carreira de Humphrey Bogart. Créditos: Columbia Pictures.

Sete anos depois, o termo foi novamente utilizado em uma reportagem do jornal The New York Times sobre o filme A Trágica Farsa (1956) que estava a ponto de estrear e séria o último da carreira de Humphrey Bogart. Mais de 10 anos depois, em 1968, a Embassy Pictures utilizou o termo para promover seu filme O Leão no Inverno. Para isso, o estúdio utilizou um trecho de uma crítica cinematográfica publicada na revista Cosmopolitan, elogiando as atuações de Peter O’Toole e Katharine Hepburn e dizendo que elas eram “iscas” para os votantes do Oscar.

Em 1978, o drama de guerra O Franco Atirador foi o primeiro filme a utilizar o “Oscar bait” como uma estratégia de marketing. Ou seja, o filme deliberadamente criou condições favoráveis para que a obra fosse indicada ao Oscar, para então poder usar essas indicações como uma forma de atrair o público para assistir a produção. Falaremos mais detalhadamente sobre isso abaixo.

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Cena de O Leão no Inverno. Créditos: AVCO Embassy Pictures.
Cena de O Leão no Inverno. As elogiadas atuações de Peter O’Toole e Katharine Hepburn foram consideradas “iscas para o Oscar” pelo crítico de cinema da famosa revista Cosmopolitan. Créditos: AVCO Embassy Pictures.

Mas de forma resumida, logo antes do filme estrear os produtores de O Franco Atirador perceberam que o público não se interessaria pela produção, devido ao seu tema pesado e seu retrato brutal da guerra do Vietnã. Eles contrataram Allan Carr, que chegou a conclusão de que a única forma de o filme ser um sucesso de bilheteria seria se ele recebesse indicações ao Oscar. Carr então, criou toda uma estratégia para que O Franco Atirador fosse indicado ao Oscar e depois usou isso para promover a obra.

Depois disso, a estratégia de marketing de O Franco Atirador virou padrão em Hollywood e todos os estúdios passaram a utilizar o “Oscar bait” como forma de promoção de suas produções mais sofisticadas. Diversos produtores e diretores tiveram sucesso usando essa estratégia, incluindo a dupla Ismail Merchant e James Ivory e os irmãos Harvey e Bob Weinstein.

Os Weinstein, inclusive, aperfeiçoaram a técnica, tornando-se mestres em levar ao Oscar filmes independentes (e muitas vezes baratos) que em décadas anteriores não teriam nenhuma chance de sequer serem assistidos pelos membros da Academia. O auge do sucesso dos Weinstein, veio em 1998 quando Shakespeare Apaixonado recebeu 13 indicações ao Oscar e levou sete estatuetas para casa, inclusive, a de Melhor Filme.

Cena de Uma Janela para o Amor (1985). Créditos: Curzon Film Distributors.
Cena de Uma Janela para o Amor (1985). Uma das produções mais bem-sucedidas de James Ivory e Ismail Merchant. Durante os anos 1980 e 1990, a dupla fez muito sucesso com suas produções de época muito bem acabadas. Créditos: Curzon Film Distributors.

As vitórias da obra nas categorias de Melhor Filme e Melhor Atriz, até hoje são muito polêmicas, com muita gente considerando Shakespeare Apaixonado, um dos piores filmes na história recente da Academia a vencer na principal categoria do Oscar. Fato é que desde então, os filmes independentes têm tido mais chances na premiação e o “Oscar bait” passou a ser amplamente utilizado como estratégia de promoção e marketing de filmes em Hollywood e fora dele.

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Oscar bait como estratégia comercial

Em 1978, a Universal Pictures tinha acabado de produzir um denso drama de guerra, chamado O Franco Atirador. Como é de praxe, os produtores da obra organizaram uma sessão de exibição da produção para testar a reação do público a ela. Os resultados foram horríveis. As pessoas odiaram o filme. Desesperada, a Universal então apelou para o experiente produtor Allan Carr.

Cena de O Franco Atirador (1978). Créditos: Universal Pictures.
Cena de O Franco Atirador (1978). O filme foi o primeiro a utilizar o Oscar bait como estratégia comercial de lançamento. Créditos: Universal Pictures.

O estúdio queria que Carr os ajudasse a “vender um filme triste e deprimente”. O produtor assistiu ao filme e logo percebeu que seu tema pesado e suas representações realísticas e brutais da guerra e também da tortura nunca atraíram o público comum que vai ao cinema para se entreter. A única forma de um filme assim atrair o público, concluiu Carr, é se ele for indicado ao Oscar.

Convencidos de que a estratégia poderia funcionar, a Universal contratou Carr como consultor. O produtor então organizou duas semanas de exibições de O Franco Atirador em um único cinema de Los Angeles. Com isso, o filme se tornava elegível a ser indicado ao Oscar daquele ano, já que esse era o requisito mínimo estabelecido pela Academia.

Alan Carr e John Travolta. Créditos: Peter Borsari/© 1993 Borsari Images.
Alan Carr e John Travolta. O produtor teve a ideia de fazer de tudo para que um filme fosse indicado ao Oscar e depois aproveitar esse fato para tentar atrair o público ao cinema para assisti-lo. Créditos: Peter Borsari/© 1993 Borsari Images.

As sessões do filme nessas duas semanas não eram abertas ao grande público e eram reservadas apenas para membros da Academia e críticos de cinema. Depois desse período de duas semanas, a Universal retirou o filme de exibição e engavetou a produção, que só podia ser vista em algumas sessões do canal pago Z Channel, que na época era um canal de televisão super exclusivo.

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Quando as indicações ao Oscar foram divulgadas no início de 1979, lá estava O Franco Atirador, com nove indicações ao prêmio da Academia, incluindo algumas nas principais categorias, como Melhor Filme e Melhor Diretor. A Universal Pictures, então, imediatamente desengavetou o filme e lançou-o para o público geral, utilizando material promocional que dava destaque as indicações ao Oscar.

Desde então, essa técnica de lançamento e promoção de filmes tem sido amplamente utilizada não apenas em Hollywood, mas também em outros lugares do mundo. Atualmente, por exemplo, não é nada incomum que produções de outros países se moldem especificamente para receber indicações ao Oscar, nem que seja apenas na categoria de Melhor Filme estrangeiro.

Cena de O Franco Atirador (1978). Créditos: Universal Pictures.
Cena de O Franco Atirador (1978). O filme foi o primeiro a utilizar o Oscar bait como estratégia comercial de lançamento. Créditos: Universal Pictures.

Isso ocorre, porque inegavelmente o Oscar tem um renome muito grande. E mais que isso, para o público comum, se um filme foi indicado ao prêmio da Academia, significa que ele é bom. Ou seja, o Oscar funciona muito com uma espécie de selo de qualidade. É claro que os estúdios e produtores sabem disso e querem explorar esse potencial para transformar seus filmes em grandes sucessos de bilheteria. O que quase sempre funciona.

Quando um Oscar bait dá errado

Como dissemos anteriormente, criar estratégias para que um filme obtenha indicações ao Oscar e depois utilizar esse fato para atrair público é uma estratégia utilizada há muito tempo em Hollywood e que em muitas ocasiões gera resultados bastante positivos para os estúdios. Contudo, também existem casos famosos de Oscar baits que deram errado. Ou seja, que além de não serem lembrados pela Academia ainda passaram vexame nas bilheterias.

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Cena de O Portal do Paraíso (1980). Créditos: United Artists.
Cena de O Portal do Paraíso (1980). O filme é um dos casos mais famosos de Oscar baits que deram errado. Créditos: United Artists.

Um clássico dos Oscar baits que deram errado é O Portal do Paraíso (1980). Dois anos depois de ter dirigido O Franco Atirador e levado o Oscar de Melhor Diretor para casa, Michael Cimino decidiu dirigir um faroeste grandioso que, ele acreditava, novamente chamaria a atenção da Academia e lhe renderia mais prêmios.

Acreditando no potencial do diretor, a United Artists resolveu investir no filme. No final, O Portal do Paraíso foi um desastre absoluto. Problemas durante a produção fizeram com que a produção custasse muito mais que o previsto e já estreasse nos cinemas com uma má reputação. Mesmo assim, a United Artists utilizou a mesma estratégia que a Universal Pictures havia utilizado dois anos antes.

O filme estreou em novembro em apenas uma sala de cinema de Nova York. Depois de apenas uma semana em cartaz e de ter falhado em atrair público significativo, o estúdio desesperado retirou O Portal do Paraíso de cartaz e engavetou o filme até abril de 1981. Nessa altura do campeonato, o sonho de ser indicado ao Oscar já tinha ido por água abaixo. A United Artists então decidiu lançar uma nova versão do filme em abril de 1981.

Michael Cimino. Créditos: Vittorio Zunino Celotto/Getty Images
Michael Cimino. O sucesso de O Franco Atirador (1978) lhe deu o Oscar de Melhor Diretor. Já o fracasso de O Portal do Paraíso (1980), praticamente encerrou sua carreira. Créditos: Vittorio Zunino Celotto/Getty Images

Essa nova versão, tinha 149 minutos, ou seja, cerca de duas horas e meia de duração, diferente da versão original da obra que tinha 325 minutos, ou seja, quase quatro horas de duração. Mesmo assim, essa nova estratégia não adiantou nada. O filme foi um enorme fracasso de público e crítica. Produzido a um custo de cerca de 44 milhões de dólares, a produção arrecadou apenas cerca de 3.5 milhões em bilheterias, ou seja, menos de 10% do que custou para ser feito.

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A crítica da época também não teve dó do filme. O famoso crítico norte-americano Roger Ebert disse que O Portal do Paraíso era “o desperdício cinematográfico mais escandaloso” que ele já tinha visto na vida. Já o também crítico Vincent Canby chamou a obra de “algo bastante raro nos filmes hoje em dia – um desastre absoluto”, comparando-o a “um passeio a pé forçado de quatro horas pela sua própria sala de estar”.

O filme até hoje é considerado um dos piores já feitos na história. O fracasso foi tão grande que praticamente encerrou a carreira de Michael Cimino. O cineasta levaria mais cinco anos para dirigir outro longa-metragem e depois disso, só dirigiria mais três filmes em sua vida. Além disso, o fracasso da produção acabou por falir de vez a United Artists que no ano seguinte foi vendida para a MGM. Ademais, diversos historiadores acreditam que o filme foi um dos principais responsáveis por acabar com a “era dos diretores” em Hollywood. Depois do fracasso de O Portal do Paraíso os grandes estúdios ficaram muito mais receosos em passar o controle artístico de filmes para as mãos dos diretores, mesmo que esses estivessem no auge de suas carreiras.

Cena de Bem-Vindos ao Paraíso (1990). Créditos: 	20th Century Fox.
Cena de Bem-Vindos ao Paraíso (1990). O filme foi considerado por estudo da Universidade da Califórnia, o Oscar bait perfeito. Mesmo assim, a produção não recebeu uma indicação sequer ao Oscar. Créditos: 20th Century Fox.

Outro Oscar bait que fracassou miseravelmente foi Bem-Vindos ao Paraíso (1990). A produção que foi considerada o “Oscar bait” mais perfeito entre os filmes lançados entre 1985 e 2009 por uma pesquisa da Universidade da Califórnia, fala sobre a discriminação sofrida por nipo-americanos nos Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial. O filme que junta temas como racismo, discriminação e guerra, permiado por uma história de amor e ainda tendo como tema de fundo o cinema hollywoodiano, foi considerado o Oscar bait perfeito.

Ainda mais porque é protagonizado por um ator famoso, Dennis Quaid, e dirigido por um cineasta premiado, Alan Park. Para completar, a produção estreou em 23 de dezembro de 1990, ou seja, bem no final do ano, para se manter fresco na memória dos membros votantes da Academia. E, apesar de não ter sido um sucesso absoluto de crítica, até que não decepcionou tanto assim os “entendidos de cinema”.

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Contudo, apesar de tudo isso, a produção foi um fracasso retumbante de bilheteria. Arrecadando menos de um milhão nos cinemas dos Estados Unidos, contra um custo de produção de cerca de 18 milhões de dólares. E para piorar, no final Bem-Vindos ao Paraíso não recebeu nem uma indicação sequer ao Oscar.

Cena de Encontrando Forrester (2000). Créditos: Sony Pictures Releasing
Cena de Encontrando Forrester (2000). Estrelado por Sean Connery, dirigido por Gus Van Sant e contando com uma história cheia de elementos de crítica social, o filme estreou em 22 de dezembro de 2000. Apesar de tudo isso, a produção não recebeu nenhuma indicação ao Oscar. Créditos: Sony Pictures Releasing

Existem tantos Oscar baits na história que fracassaram, que seria impossível listar todos eles aqui. No entanto, é possível dizer que quase todos os anos, algum filme é lançado com características e estratégias direcionadas a agradar os membros da Academia e acaba sendo parcial ou totalmente ignorado por eles. Algumas dessas produções acabam por receber alguma indicação em categorias menos importantes e outras, nem isso. Algumas também, apesar do fracasso no Oscar, acabam por ter uma boa arrecadação nas bilheterias, enquanto que outros falham também nesse aspecto.

Os maiores Oscar baits da história

Em 2014, os sociólogos da Universidade da Califórnia, Gabriel Rossman e Oliver Schilke, publicaram um estudo sobre o fenômeno do Oscar bait. Eles estudaram mais de 3000 filmes lançados entre 1985 e 2009 para descobrir quais os elementos dariam a um filme chances maiores de obter uma indicação ao Oscar. Eles descobriram que os gêneros mais prestigiados pelos membros votantes da Academia eram filmes de guerra, biografias e filmes históricos.

Cena de Bem-Vindos ao Paraíso (1990). Créditos: 20th Century Fox.
Cena de Bem-Vindos ao Paraíso (1990). O filme foi considerado por estudo da Universidade da Califórnia, o Oscar bait perfeito. Mesmo assim, a produção não recebeu uma indicação sequer ao Oscar. Créditos: 20th Century Fox.

Além disso, os elementos de trama mais comuns em filmes indicados ao Oscar eram intrigas políticas, tramas envolvendo deficiências físicas e mentais, crimes de guerra e, claro, o próprio show business. Ademais, eles também comprovaram o que todo mundo já sabia, que filmes lançados durante a temporada de premiações (que vai mais ou menos de novembro a março ou abril de cada ano) e produzidos por divisões independentes de grandes estúdios têm mais chances de ser indicados ao prêmio da Academia.

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Também para surpresa de quase ninguém, Rossman e Schilke descobriram que filmes associados com temas como “implante mamário”, zumbis e outros temas considerados mais superficiais, por exemplo, tinham pouquíssimas chances de receber alguma atenção dos membros da Academia.

Maiores Oscar baits

Baseado nas “descobertas” do estudo, os sociólogos reuniram uma série de critérios que permitiram prever as chances de uma produção de ser indicada ao Oscar. Dessa forma, eles chegaram a uma lista dos filmes mais Oscar baits (ou “oscarizáveis”) produzidos entre 1985 e 2009, ou seja, aqueles filmes que reuniam mais elementos capazes de atrair os membros da Academia e assim garantir uma indicação a premiação mais importante do cinema.

Cena de O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei (2003). Créditos: New Line Cinema.
Cena de O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei (2003). O filme foi considerado o segundo Oscar bait mais perfeito entre os filmes lançados entre 1985 e 2009. Créditos: New Line Cinema.

E como dizemos antes, esse estudo chegou a conclusão de que o maior Oscar bait desse período era o filme Bem-Vindos ao Paraíso, de 1990. O filme reunia diversos fatores que normalmente agradam a Academia. Era um filme histórico e de guerra que debatia temas importantes como racismo e discriminação. Seu protagonista era um projetista de cinema e a obra era estrelada por um ator famoso e dirigida por um cineasta respeitado. O filme também estreou no final do ano, apenas para cumprir as regras da Academia. Apesar disso, ele não recebeu nem uma indicação sequer ao Oscar.

Em segundo lugar na lista de Rossman e Schilke veio um filme super premiado, O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei (2003). Terceiro, e último, capítulo da trilogia de O Senhor dos Anéis, a produção recebeu 11 indicações ao Oscar, vencendo em todas as categorias em que foi indicado. Apesar de ser um filme de fantasia, um gênero pouco apreciado pela Academia, a produção é também um épico de guerra com valores de produção inquestionáveis. A obra também foi um enorme sucesso de público arrecadando mais de 1 bilhão de dólares em bilheterias.

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O Povo contra Larry Flint (1996). Créditos: Columbia Pictures | Getty Images
O Povo contra Larry Flint (1996). O filme foi considerado o terceiro Oscar bait mais perfeito entre os filmes lançados entre 1985 e 2009. Créditos: Columbia Pictures | Getty Images

Em terceiro lugar na lista de Rossman e Schilke está O Povo contra Larry Flint (1996). O drama biográfico baseado em fatos reais foi estrelado por Woody Harrelson e dirigido por Miloš Forman. Apesar de ser considerado bastante “oscarizável” pelo estudo, a produção recebeu apenas duas indicações ao Oscar, de Melhor Ator e Melhor Diretor, exatamente para Forman e Harrelson. E no final, não levou nenhuma estatueta para casa.

Menos oscarizáveis

Na outra ponta, estão aqueles filmes considerados com menor potencial de receber uma indicação ao Oscar. Segundo o estudo de Gabriel Rossman e Oliver Schilke, dentre os filmes lançados nos Estados Unidos entre 1985 e 2009, o que teria menos elementos capazes de atrair os membros votantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas e, portanto, menos chances de ser indicado ao Oscar, é Quando um Estranho Chama (2006).

Cena de Quando um Estranho Chama (2006). Créditos: Screen Gems.
Cena de Quando um Estranho Chama (2006). O filme foi considerado o “menos oscarizável” pelo estudo da Universidade da Califórnia entre todas as produções lançadas entre 1985 e 2009. Créditos: Screen Gems.

O filme de terror estrelado pela atriz norte-americana com ascendência brasileira Camilla Belle é um remake do clássico de terror de mesmo nome lançado em 1979. Na obra, Belle interpreta uma babá que começa a receber ligações ameaçadoras de um desconhecido. A produção foi odiada pela crítica, mas foi um sucesso moderado de bilheteria.

Contando com um roteiro sem grandes temáticas aprofundadas e também sem muita criatividade, sem grandes interpretações ou mesmo intérpretes muito famosos em seu elenco e dirigido por um cineasta que só dirige produções comerciais e sem muitas aspirações artísticas, Quando um Estranho Chama realmente teria muita pouca chance de atrair a atenção dos membros da Academia.

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Cena de Um Hotel Bom pra Cachorro (2009). Créditos: Paramount Pictures, DreamWorks Pictures e Nickelodeon Movies.
Cena de Um Hotel Bom pra Cachorro (2009). O filme foi considerado o segundo “menos oscarizável” pelo estudo da Universidade da Califórnia entre todas as produções lançadas entre 1985 e 2009. Créditos: Paramount Pictures, DreamWorks Pictures e Nickelodeon Movies.

O segundo filme, segundo Rossman e Schilke, menos “oscarizável” lançado no período de 1985 e 2009 foi Um Hotel Bom pra Cachorro. “Filme de Sessão da Tarde”, a produção conta a história de dois irmãoes pré-adolescentes que transformam um hotel abandonado em um refúgio para cães abandonados. O roteiro bobo e direcionado ao público infantojuvenil obviamente não agradou muito a crítica, mas a obra foi um sucesso de bilheteria, com arrecadação superior a 100 milhões de dólares.

Apesar de protagonizado por atores mirins, Um Hotel Bom pra Cachorro tem alguns nomes de peso em seu elenco adulto, como Don Cheadle, Kevin Dillon e Lisa Kudrow. Contudo, é óbvio que esse tipo de filme ultra comercial e sem nenhuma profundidade ou elemento artístico destacado dificilmente agradaria a Academia.

Em terceiro lugar na lista de Rossman e Schilke, vem Um Salão do Barulho 2: Barbeiragem Total (2004). A comédia com pitadas dramáticas, estrelada por Ice Cube e um elenco praticamente todo formado por atores negros é uma continuação de Uma Turma do Barulho (2002), filme que na época de seu lançamento foi muito bem recebido pela crítica especializada, além de ter sido um grande sucesso de público.

Cena de Um Salão do Barulho 2: Barbeiragem Total (2004). Créditos: etro-Goldwyn-Mayer e 20th Century Fox.
Cena de Um Salão do Barulho 2: Barbeiragem Total (2004). O filme foi considerado o terceiro “menos oscarizável” pelo estudo da Universidade da Califórnia entre todas as produções lançadas entre 1985 e 2009. Créditos: Metro-Goldwyn-Mayer e 20th Century Fox.

E apesar de estar em terceiro na lista de Rossman e Schilke e ser considerado pior que o primeiro filme, Um Salão do Barulho 2: Barbeiragem Total também não foi mal nem de crítica e nem de público. Contudo, é claro que esse “tipo de filme” dificilmente conseguiria obter alguma indicação ao Oscar. Ainda mais se considerarmos a época em que ele foi lançado.

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Polêmicas em torno do termo Oscar bait

Tanto o Oscar bait como estratégia de lançamento comercial de filmes quanto o uso do termo têm causado bastante polêmica há algum tempo. Com a popularização do Oscar bait como estratégia de lançamento de filmes a partir dos anos 1990, o termo acabou por ganhar uma conotação extremamente pejorativa entre alguns críticos, estudiosos do cinema e mesmo cinéfilos. Alguns, inclusive, argumentam que essa estratégia seria uma forma de enganar o sistema e que produtores, estúdios e diretores estariam mais preocupados em produzir filmes para serem indicados ao Oscar do que filmes de qualidade.

Cena de Tão Forte e Tão Perto (2011). Créditos: Warner Bros. Pictures.
Cena de Tão Forte e Tão Perto (2011). A indicação do filme ao Oscar de Melhor Filme causou bastante polêmica. Créditos: Warner Bros. Pictures.

Escrevendo para a prestigiada revista Slate, em 2014, o editor da Sactown Magazine, S.T. VanAiresdale, chegou a dizer uma vez que esse tipo de filme (os “Oscar bait”) “fediam”, usando como exemplo a produção Tão Forte e Tão Perto (2011), que apesar de não ter conseguido indicação a nenhuma premiação prestigiada naquela temporada, acabou recebendo duas indicações ao Oscar, uma delas na categoria de Melhor Filme. Essa última indicação, inclusive, foi extremamente criticada. Com uma taxa de aprovação de apenas 45% no Rotten Tomatoes (principal agregador de críticas especializadas da internet), Tão Forte e Tão Perto se tornou o filme com a menor taxa de aprovação da história a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme.

Em sua crítica a indicação do filme, VanAiresdale também criticou o produtor da obra Scott Rudin, que havia se tornado uma espécie de especialista em produzir Oscar baits. “Adquira uma propriedade de elite, contrate diretores de elite e venda o pacote completo para um estúdio. Às vezes, o filme resultante é ótimo; às vezes não é. Isso pouco importa. Faça uma campanha de marketing e você poderá lucrar com a agitação. A estratégia funcionou”, disse ele.

Cena de Frost/Nixon. Créditos: Universal Pictures.
Cena de Frost/Nixon. O filme foi indicado em alguns das principais categorias do Oscar 2009, incluindo, Melhor Filme, Diretor, Ator e Roteiro Adaptado. Créditos: Universal Pictures.

Outros criticam o uso (ou o mal uso) que é feito da expressão “Oscar bait”. Para eles, a expressão reduz a motivação de cineastas a simplesmente ganhar um prêmio, quando na verdade, as coisas podem não ser tão simples assim. Eles também alegam que o uso do termo muitas vezes tem uma conotação “anti-intelectual”, no sentido de que alguns diretores, cujas obras são constantemente consideradas artísticas, quase nunca têm seus filmes sendo considerados Oscar baits, mesmo que eles sejam lançados na temporada de premiações e contenham elementos comuns a filmes que buscam receber indicações ao Oscar.

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Em 2016, em entrevista a revista Vultura, o historiador de cinema Mark Harris, disse que filmes de cineastas como Martin Scorsese, David Fincher e os irmãos Coen quase nunca são considerados Oscar baits, mesmo sendo lançados durante a temporada de premiação, fazendo uso de elencos estelares e possuindo todos os elementos estéticos comuns a outros filmes considerados Oscar baits.

Harris observa também que, por outro lado, produções de diretores como Tom Hooper, Stephen Daldry ou mesmo Ron Howard, serão sempre considerados Oscar baits se tiverem essas mesmas características. Já o também editor da Vulture, Kyle Buchanan, defende o uso do termo, mas diz só usá-lo para descrever “filmes medíocres que seguem um modelo preexistente do Oscar de forma muito mais bem sucedida do que os filmes mais interessantes que são ignorados (pela Academia)”.

Cena de Batman - O Cavaleiro das Trevas (2008). Créditos: Warner Bros. Pictures.
Cena de Batman – O Cavaleiro das Trevas (2008). Apesar de ser unanimemente considerado uma obra-prima do século XXI, o filme praticamente só recebeu indicações ao Oscar em categorias técnicas. Créditos: Warner Bros. Pictures.

Harris defende seu ponto de vista apontando que em 2008, um filme como Frost/Nixon foi indicado ao Oscar de Melhor Filme enquanto outros filmes, segundo ele melhores, como Batman – O Cavaleiro das Trevas, O Lutador e WALL·E foram esnobados pelos membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas (AMPAS).

Já VanAiresdale admite “que fazer filmes já é muito difícil de se fazer bem, mesmo sem a pressão de ter um produto digno de prêmios”, mas defende o uso do termo dizendo que ele não deve ser encarado como “um conceito redutor que é ruim para o cinema”. Ao contrário, diz VanAiresdale, são “filmes ruins que são ruins para o cinema”.

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Cena de WALL-E (2008). Créditos: Walt Disney Studios
Motion Pictures.
Cena de WALL-E 2008). Apesar de ser considerada uma das melhores animações já feitas na história, o filme não recebeu indicação ao Oscar de Melhor Filme. Créditos: Walt Disney Studios Motion Pictures.

O jornalista finaliza dizendo que como a temporada de premiações e o desejo por se ganhar prêmios importantes como o Oscar, gera bons filmes, os espectadores não deveriam ser tão desdenhosos em relação ao conceito de Oscar bait, já que segundo ele: “Oscar bait é a única razão pela qual adultos ainda têm alguma coisa para assistir no cinema, com os quatro meses de temporada de premiações compensando os outros oito meses de franquias de super-heróis, comédias românticas anêmicas e tudo o que Adam Sandler ‘limpa de seu sapato’”.

Para finalizar, VanAiresdale defende que a existência do conceito de Oscar bait e do debate sobre ele, apenas prova a importância que o cinema tem para a sociedade norte-americana. “Ninguém reclama de Breaking Bad ter perdido um Emmy para Homeland da mesma forma que eles ainda gritam sem parar sobre Crash ter usurpado de Brokeback Mountain o Oscar de Melhor Filme”.

Cena de 
O Segredo de Brokeback Mountain. Créditos: Focus Features.
Cena de O Segredo de Brokeback Mountain (2006). Sua derrota na categoria de Melhor Filme para Crash – No Limite, no Oscar de 2006 ainda é considerada por muita gente um dos maiores erros recentes da Academia. Créditos: Focus Features.

Ele ainda completa: “Os amantes de cinema querem acreditar que a Academia compartilha dos nossos gostos. Queremos acreditar que a história do Oscar reflete um senso objetivo de justiça estética, em vez de orgias rituais de autocongratulação. Queremos acreditar, que os nossos cinemas são mais do que apenas centros de compensação para expressões de ego e grandiosidade”.

Conclusão

E aí, gostou de nosso texto? Esse é um tema extremamente complexo, mas de vital importância para a compreensão de como funciona a temporada de premiações e também o esquema de distribuição comercial de filmes nos Estados Unidos e também fora dele. Tentamos trazer um texto o mais completo possível, mas que também fosse de fácil compreensão. Se você gostou do texto, não esqueça de deixar seu comentário abaixo.

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