Há alguns dias atrás publicamos uma análise sobre os doze filmes brasileiros que disputam uma vaga para representrar o Brasil no Oscar de Melhor Filme Internacional do ano que vem. No entanto, você sabe exatamente como essa categoria surgiu e como ela funciona? Já podemos adiantar que essa é a categoria mais “diferente” do Oscar, já que possui regras e um funcionamento bastante diferente das outras categorias da premiação.
Isso ocorre porque os princípios e objetivos que regem a categoria de Melhor Filme Internacional são diferentes da maioria das outras categorias do Oscar. Isso porque, essa categoria é destinada a premiar essencialmente filmes produzidos em outros países e que, de outra forma, teriam pouquíssimas, ou nenhuma chance, de serem indicados ou mesmo assistidos pelos membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (AMPAS), organização que entrega o Oscar.
Dessa forma, afim de conseguir cumprir sua missão, essa categoria é obrigada a fazer conceções e adaptar regras de uma forma que outras categorias não necessitam fazer, já que em sua maioria, essas outras categorias premiam filmes americanos ou produções com “cacife” suficiente para estrear comercialmente em solo norte-americano. Mas quais são essas regras diferentes da categoria de Melhor Filme Internacional? Como e por que essa categoria surgiu? Como ela funciona? Explicaremos tudo isso para você a seguir.
História do Oscar de Melhor Filme Internacional
A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (AMPAS) foi fundada em 1927 e o primeiro Oscar foi entregue em 16 de maio de 1929, afim de premiar os filmes produzidos (essencialmente em Hollywood) entre 1 de agosto de 1927 e 31 de julho de 1928. Essa primeira cerimônia foi bastante simples e premiou filmes em apenas 12 categorias. Só para se ter uma ideia, atualmente, o Oscar possui 23 categorias. Algumas daquelas 12 categorias, inclusive, já foram até extintas e outras só foram premiadas naquela primeira edição do Oscar.
Nessa primeira edição do Oscar, obviamente, ainda não existia a categoria de Melhor Filme Internacional. Primeiro, porque o cinema naquela época era essencialmente mudo, o que, de alguma forma, dispensava a existência de uma categoria para premiar filmes falados em outra língua que não fosse o inglês. Lembrando que o cinema falado havia começado “oficialmente” apenas poucos anos antes, em 1927, com o lançamento do musical dramático O Cantor de Jazz (1927).
Além disso, naquela época, o mundo era mais “isolado”, ou seja, países e mesmo cidades não se comunicavam entre si com tanta facilidade como é hoje. Aliás, nesse sentido, era um mundo totalmente diferente de hoje, onde filmes estream no mundo todo ao mesmo tempo e notícias correm o planeta inteiro em questão de minutos. As pessoas eram muito mais focadas no contexto regional em que viviam. No que ocorria na sua cidade e em seu país.
Nesse sentido, o cinema também era muito regionalizado, assim com também eram as comunidades cinematográficas de cada país ou localidade. Assim, não existia um “cinema globalizado” como existe atualmente. É claro, já naquela época, os Estados Unidos já eram a maior economia do mundo e o cinema hollywoodiano, igualmente, o maior e comercialmente mais viável do planeta.
Por isso, Hollywood já atraia muitos artistas estrangeiros, incluindo, intérpretes, diretores, roteiristas e outros profssionais de cinema. Contudo, eles viam a Hollywood e dirigiam seus filmes lá. Dessa forma, dificilmente os filmes produzidos por esses profissionais em seus países de origem estreavam nos Estados Unidos e mesmo quando isso ocorria, essa estreia podia levar anos para ocorrer. Aliás, o cenário foi assim durante muito tempo, até pouco tempo atrás.
O cenário de Hollywood nos anos 1920 era bem “internacional” e cheio de artistas e profissionais vindos de outros países, mas filmes estrangeiros tinham pouquíssimo espaço no mercado norte-americano da época. Aliás, até pouco tempo atrás os americanos tinham “pouca paciência” com filmes produzidos em outros países. Assim, o Oscar nessa época premiava essencialmente filmes produzidos em Hollywood, já que o cinema comercial norte-americano se concentrava basicamente naquela região da Califórnia.
Nesse sentido, não havia razão e nem sequer viabilidade técnica e prática para se existir uma categoria que premiasse apenas filmes produzidos fora dos Estados Unidos e que fossem falados em outra língua que não o inglês. No entanto, todo esse cenário mudou após o fim da Segunda Guerra Mundial. Nessa época, o mundo já era muito mais “globalizado” e a participação americana na guerra “forçou” os cidadães daquele país a ter contato com o que ocorria fora dos Estados Unidos.
Além disso, o fim da Segunda Guerra Mundial fez com que os Estados Unidos se tornassem a principal potência do mundo ocidental, o que fez com que o país também tivesse interesse em exportar sua cultura para o resto do mundo e também interagir com a cultura produzida em outros locais do planeta.
Por isso, no final dos anos 1940, Jean Hersholt, então presidente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, sugeriu a criação de uma categoria que premiasse exclusivamente filmes produzidos fora dos Estados Unidos, afim de “promover uma relação mais próxima entre os profissionais de cinema americanos e os de outros países.
Dessa forma, entre 1947 e 1955, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood criou o Oscar Honorário de Melhor Filme Estrangeiro. Nesse período, com exceção de 1953, anualmente, um filme produzido fora dos Estados Unidos foi premiado com esse Oscar honorário. Nesse período, não havia competição e nem indicados. A Academia simplesmente escolhia um filme estrangeiro e premiava com o Oscar. Curiosamente, todos os oito filmes premiados nesse período foram produzidos em apenas três países, Itália, França e Japão.
Esse cenário mudou a partir de 1956, quando o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro passou a ser uma categoria competitiva da premiação mais importante do cinema mundial. Nessa época, no entanto, os crítérios para nomeação de um filme nessa categoria eram bem diferentes e os filmes, normalmente, tinham que ser exibidos nos Estados Unidos para serem elegíveis a uma indicação. Tanto é assim, que o vencedor daquele ano, A Estrada da Vida, do icônico diretor italiano Federico Fellini, estreou originalmente na Itália em 1954.
O mais interessante é que por causa disso, no ano seguinte, 1957, outro filme de Fellini ganhou novamente o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, Noites de Cabíria, que havia sido lançado originalmente naquele mesmo ano. Assim, essa categoria teve diversas regras de elegibilidade até chegarmos a regra atual. Discutiremos tudo isso com mais profundidade nos próximos tópicos desse texto.
Em abril de 2019, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood decidiu que era hora de mudar o nome da categoria. Segundo a organização, o termo “estrangeiro” era ultrapassado e não refletia mais o que a categoria representava. Com uma comunidade cinematográfica internacionalizada e um cinema globalizado, o significado da palavra “estrangeiro” acabou se tornando muito subjetivo (e até mesmo pejorativo, para alguns).
Dessa forma, a categoria passou a se chamar “Melhor Filme Internacional”. Apesar disso, muita gente, inclusive jornalistas, ainda se referem a ela como “Melhor Filme Estrangeiro”, já que esse foi o nome usado durante mais de 70 anos. De qualquer forma, é muito importante deixar claro que as duas categorias são a mesma coisa e só o nome que muda.
Funcionamento e crítérios de elegibilidade
Mas afinal de contas como a categoria de Melhor Filme Internacional funciona e quais são seus critérios de elegibilidade? Calma que explicaremos tudo nesse tópico do nosso texto. Primeiro é necessário explicar que apesar da designação “filme estrangeiro”, que foi usada para se referir a essa categoria durante mais de sete décadas, ter sido feito fora dos Estados Unidos é apenas um dos seus aspectos fundamentais. O outro, mais importante ainda que esse primeiro, é a língua predominante do filme.
Filmes devem ser produzidos fora dos Estados Unidos e não podem ser falados em inglês
Então, em um primeiro momento, para ser elegível a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional, um filme deve ter sido produzido fora dos Estados Unidos. Assim, nenhum filme produzido no país é elegível a concorrer nessa categoria. Além disso, o segundo aspecto fundamental e ainda mais importante, é que o filme deve ser majoritariamente falado em outro idioma que não o inglês. Dessa forma, se a maioria do diálogo do filme for em inglês, ele não pode ser indicado nessa categoria.
Por isso, países que tem o inglês como língua nativa como Canadá, Reino Unido e Austrália, por exemplo, só podem concorrer nessa categoria com filmes falados em outras línguas. O Canadá, por exemplo, que tem em seu território uma região que fala preodimantemente o francês, quase sempre envia como representante nessa categoria filmes falados nessa língua.
Já o Reino Unido venceu o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro desse ano com o drama histórico Zona de Interesse que é predominantemente falado em alemão e polonês. Existem, inclusive, casos de filmes retirados da disputa nessa categoria, porque eram falados majoritariamente em inglês. Um caso recente é o do drama nigeriano Lionheart (2018) que por ser quase todo falado em inglês, a língua nativa da Nigéria, foi desqualificado da disputa nessa categoria, pela Academia.
Apesar da grande importância da questão da língua, existe um caso notório de um filme sem diálogos que foi indicado ao Oscar nessa categoria, o filme argelino O Baile, dirigido pelo grande diretor italiano Ettore Scola. Existe também o caso de um filme falado em uma língua inventada que foi indicado para representar um país nessa categoria. O filme em questão é o drama canadense A Bullet in the Head (1990) que, no entanto, não chegou sequer a receber uma indicação nessa categoria.
A exigência de que o filme seja produzido fora dos Estados Unidos, é outro aspecto importante dessa categoria e que a diferencia de forma significativa de outras categorias similares em premiações importantes, como o Globo de Ouro e o BAFTA, onde a questão da língua é a mais importante. Essa regra impediu que filmes americanos falados em outras línguas fossem indicados nessa categoria. Alguns casos emblemáticos são dos filmes A Paixão de Cristo (2004), Apocalypto (2006) e Cartas de Iwo Jima (2006), todos produzidos nos Estados Unidos, mas falados em outras línguas que não o inglês.
Essa restrição da Academia se dá porque essa categoria tem como objetivo dar visibilidade a filmes produzidos fora dos Estados Unidos, já que filmes norte-americanos, geralmente, dominam todas as outras categorias do Oscar. Explicaremos todas as diferenças entre o Oscar, o BAFTA e o Globo de Ouro, no que tange essa categoria, em uma das seções mais abaixo no nosso texto.
Apesar de proibir que filmes de todos os territórios pertencentes aos Estados Unidos possam ter seus filmes indicados nessa categoria, até 2011, no entanto, a Academia permitia que filmes porto-riquenhos concorressem ao Oscar de Melhor Filme Internacional. Isso ocorria, porque Porto Rico é um território não incorporado dos Estados Unidos e que tem grande autonomia interna. O território chegou, inclusive, a ter um filme indicado nessa categoria, a comédia Lo que le pasó a Santiago (1989), indicado ao Oscar em 1990. Contudo, apartir de 2011, a Academia decidiu proibir também que filmes de Porto Rico pudessem concorrer a esse Oscar.
Necessidade de ser indicado por um comitê no país de origem
Outra exigência importante da categoria de Melhor Filme Internacional é que os filmes candidatos sejam indicados por uma “organização, júri ou comissão composta por pessoas da indústria cinematográfica” de cada um dos países que querem concorrer nessa categoria. A princípio, todos os países do mundo são convidados a enviar representantes e cada país tem direito a enviar um filme que ele considere o melhor produzido naquele ano.
Como dissemos antes, nem sempre foi assim. Anteriormente, os filmes tinham que estrear nos Estados Unidos, nos moldes do que ainda ocorre na categoria de Melhor Filme em Língua Estrangeira no BAFTA. A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood retirou essa exigência para dar oportunidade para que filmes “menores” e de países menos privilegiados, que dificilmente conseguiram ser distribuídos nos Estados Unidos, pudessem também ter uma chance de concorrer nessa categoria.
A Academia, no entanto, exige que todos os filmes concorrentes nessa categoria tenham sido exibidos comercialmente em seus países de origem por pelo menos sete dias consecutivos dentro do período de elegibilidade. É importante destacar que o período de elegibilidade dessa categoria é também diferente do período de elegibilidade das outras categorias do Oscar. Geralmente, o periodo de elegibilidade das outras categorias do Oscar vai de 1 de janeiro e 31 de dezembro de cada ano.
Contudo, para a categoria de Melhor Filme Internacional esse período é diferente. Nesse ano, por exemplo, todos os filmes que queriam ser indicados ao Oscar nessa categoria deveriam ter sido exibido por sete dias consecutivos em seus países de origem entre 1 de dezembro de 2022 e 31 de outubro de 2023. Esse período de elegibilidade pode variar de ano a ano.
Além disso, a necessidade de que um filme seja exibido comercialmente no país de origem faz com que muitos filmes que já estão prontos há anos e sendo exibidos em festivais há algum tempo, só consigam eventualmente obter o direito de concorrer por uma vaga nessa categoria anos após seu lançamento original.
Por exemplo, entre os doze filmes originalmente inscritos para concorrer a uma vaga de representante do Brasil no Oscar do ano que vem nessa categoria, temos produções que estrearam originalmente em festivais em 2023 ou mesmo 2022, mas que só agora, em 2024, conseguiram estrear comercialmente no país e, assim, cumprir esse requesito. Isso ocorre, porque filmes mais alternativos ou de menor orçamento têm dificuldades em encontrar distribuidores por serem considerados comercialmente menos atraentes.
Outro fator que costuma causar confusão é que a exigência de que os filmes que querem concorrer nessa categoria sejam indicados por uma “organização, júri ou comissão composta por pessoas da indústria cinematográfica” de cada país. Essa exigência existe porque, na verdade, a intenção da Academia é que cada filme represente seu pais de origem. Portanto, nessa categoria temos uma competição entre países.
Dessa forma, essa é a única categoria em que os indicados são países e não pessoas. Apesar dos diretores e produtores dos filmes vencedores, geralmente, receberem esse Oscar no palco da cerimônia de entrega, eles o fazem em nome do país em que o filme foi produzido. Assim, a regra dessa categoria é clara: “a estatueta da Academia (Oscar) será concedida ao filme e aceita pelo diretor em nome dos talentos criativos do filme”.
Assim, os diretores dos filmes que vencem essa categoria não são considerados vencedores do Oscar, mas simplesmente o recebem em nome do país em que o filme foi produzido. Por esse motivo, por exemplo, o genial diretor italiano Federico Fellini nunca venceu um Oscar competitivo em sua carreira, apesar do fato de que quatro de seus filmes venceram o Oscar de Melhor Filme Internacional.
Curiosamente, a única exceção a essa regra ocorreu em 1956, no primeiro ano em que ssa categoria foi competitiva. Naquele ano, a Academia oficialmente concedeu o Oscar a Dino De Laurentiis e Carlo Ponti, produtores de A Estrada da Vida (1954), filme vencedor da categoria de Melhor Filme Internacional daquele ano. Coincidentemente, a obra foi dirigida por Fellini.
A exigência de que o filme que quer concorrer nessa categoria seja indicado por um comitê, apesar de bem intencionada, faz com que surjam diversas polêmicas. Principalmente, porque não existem critérios objetivos que determinem de que forma esses comitês devam escolher o filme que representará seu país e também porque não existem critérios restritivos para determinar de que forma e por quem esses comitês serão formatos.
Segundo as regras da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, o comitê deve apenas ser formado por “pessoas da indústria cinematográfica”. Assim, os governos de cada país podem, com alguma liberdade, determinar como e por quem serão formados esses comitês. E quando formados, eles tem autonomia para determinar o representante do seu país nessa categoria sem ter que dar muitas explicações sobre como a escolha foi feita.
É claro que em países menos democráticos, essa escolha pode sofrer interferências políticas ou até mesmo de interesses pessoais. Em 2007, por exemplo, o diretor Bhavna Talwar acusou a Federação de Cinema da Índia (FFI) de rejeitar seu filme, Dharm, em favor do drama de ação A Guarda Real, cujo diretor e os produtores, segundo Talwar, tinham ligações fortes com membros da FFI.
Uma situação parecida ocorreu com Ran, obra-prima do genial cineasta japonês Akira Kurosawa. Quando o filme estreou em 1985, em meio a aclamação unânime da crítica especializada, todos pensaram que naturalmente a produção seria escolhida para representar o Japão no Oscar do ano seguinte. Contudo, não foi isso que ocorreu, com o comitê responsável por escolher o representante japonês escolhendo o filme Gray Sunset, de Shunya Ito.
Curiosamente, Ran venceu o BAFTA de Melhor Filme em Língua Estrangeira e foi indicado ao Globo de Ouro na mesma categoria, já que as duas premiações têm regras diferentes das do Oscar. A não indicação de Ran teria acontecido porque Kurosawa teria irritado membros da comunidade cinematográfica japonesa ao não comparecer a estreia do filme no Festival de Cinema de Tóquio.
Como retaliação, Ran não apenas não foi escolhido para representar o Japão ao Oscar, mas também nem sequer foi indicado ao prêmio de Melhor Filme do Japanese Academy Awards, o Oscar do cinema japonês. É claro que Gray Sunset não foi indicado ao Oscar daquele ano, abrindo caminho para a vitória da produção argentina A História Oficial. Atualmente, Gray Sunset está praticamente esquecido, enquanto Ran é considerado um dos grandes filmes da história do cinema mundial.
Outra situação parecida ocorreu esse ano. O drama francês Anatomia de uma Queda era franco favorito a ser escolhido para representar a França na categoria de Melhor Filme Internacional. Contudo, quando o resultado final foi anunciado, o escolhido havia sido o romance histórico O Sabor da Vida. Muitas disseram que Anatomia de uma Queda havia sido preterido devido as críticas da diretora do filme, Justine Triet, ao presidente francês, Emmanuel Macron. Outros, no entanto, alegaram que o comitê responsável pela escolha preferiu O Sabor da Vida porque ele era todo falado em francês em detrimento a Anatomia de uma Queda, que tem quase metade de seus diálogos falados em inglês.
Seja como for, Anatomia de uma Queda, recebeu cinco indicações ao Oscar desse ano em diversas outras categorias, vencendo, inclusive, a prestigiada categoria de Melhor Roteiro Original. Mostrando a força do cinema francês, O Sabor da Vida chegou a estar na lista de 15 pré-selecionados na categoria de Melhor Filme Internacional, mas acabou não ficando entre os cinco indicados finais.
Exigência de controle artístico por parte do país de origem
Devido ao fato de que para a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, os filmes indicados e vencedores são representantes do seu país de origem, ela exige que esses países tenham controle artístico sobre essas produções. Assim, a Academia fiscaliza com rigor essa questão, inclusive, desclassificando filmes que não cumpram esse requisito.
O caso mais emblemático nesse sentido, ocorreu em 1993 com o drama argentino Um Lugar no Mundo (1992). Dirigido por Adolfo Aristarain, o filme tentou obter a vaga para representar a Argentina na categoria de Melhor Filme Internacional, mas o comitê responsável pela escolha, preferiu outro filme, o romance O Lado Escuro do Coração. Assim, Aristarain utilizou seus contatos no Uruguai para tentar fazer com que o filme representasse o pais no Oscar e, por fim, conseguiu.
Dessa forma, Um Lugar no Mundo foi para o Oscar como o representante uruguaio. A produção, inclusive, chegou a obter uma indicação a Melhor Filme Internacional. Contudo, logo a Academia descobriu a origem da produção e a desclassificou da disputa, por quebra da regra que exige “contribuição substancial para a produção cinematográfica do país que envia o filme”. Esse é, até hoje, o único caso em que um filme já indicado nessa categoria foi desclassificado. No entanto, existem inúmeros outros casos de desclassificação ainda nos estágios iniciais da disputa.
Além disso, a Academia também costuma desclassificar filmes que eventualmente tenham estreado em outras mídias antes de estrear nos cinemas. Um caso notório é o do filme holandês Bluebird, escolhido pela Holanda para representar o país no Oscar 2006, mas que foi desclassificado depois que a Academia descobriu que a produção já havia sido exibida na televisão, antes de estrear nos cinemas.
Filme em língua oficial
Uma outra regra dessa categoria que causava alguma polêmica, era a que exigia que o filme escolhido fosse falado em uma das línguas oficiais do pais que ele representava. Dessa forma, essa regra impedia que filmes produzidos em um país, mas que fossem predominantemente falado em uma língua que não fosse oficial daquele país, concorresse ao Oscar de Melhor Filme Internacional.
A regra foi ficando cada vez mais ultrapassada a medida que o mundo foi se tornando cada vez mais globalizado e, assim, a pratica de se produzir filmes falados em línguas “estrangeiras” em relação a seu país de origem foi ficando cada vez mais comum. A gota d´água ocorreu no Oscar 2006, quando o drama italiano Violação de Domicilio (2004) foi desclassificado da disputa na categoria de Melhor Filme Internacional por ser falado majoritariamente em árabe e hebreu, línguas que não são oficiais da Itália, país de origem do filme.
Por esse motivo, a partir do ano seguinte, 2007, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood mudou essa regra e parou de exigir que os filmes concorrentes nessa categoria fossem falados em uma língua oficial do pais que eles estavam representando. O mais curioso é que se essa regra ainda estivesse valendo, o vencedor do Oscar de Melhor Filme Internacional desse ano, o drama histórico Zona de Interesse, não poderia nem sequer concorrer nessa categoria. Isso porque, apesar de ter sido produzido no Reino Unido e dirigido por um cineasta britânico, a produção é quase toda falada em alemão e polonês.
O processo para se obter uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional
Acima explicamos detalhadamente os critérios de elegibilidade e o que um filme tem que fazer para ser escolhido como representante de um país e efetivamente chegar as mãos dos responsáveis dentro da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (AMPAS) por escolher os indicados na categoria de Melhor Filme Internacional.
Como dissemos antes, anualmente, dezenas de países enviam filmes para serem avaliados pela Academia e concorrer a uma indicação nessa categoria. Ano passado, por exemplo, 92 países enviaram filmes. Mas o que acontece com esses filmes enviados? Quem avalia eles? Qual o caminho para que sejam escolhidos os cinco indicados e o vencedor do Oscar de Melhor Filme Internacional? Explicaremos tudo isso a seguir.
Primeiramente, todos os países devem enviar cópias legendadas em inglês dos filmes escolhidos para a Academia dentro de um prazo estipulado. Até 2006, todas as produções enviadas e consideradas elegíveis para concorrer nessa categoria eram assistidas e avaliadas por uma comissão, assim como ocorre em outras categorias do Oscar, e era essa comissão quem escolhia os cinco indicados, que eram anunciados junto com todos os outros indicados ao Oscar daquele ano.
A partir de 2006, no entanto, essa comissão foi dividida em duas e a Academia passou a divulgar uma lista de nove filmes pré-indicados nessa categoria cerca de uma semana antes do anúncio oficial de todos os indicados ao Oscar. Assim, uma comissão maior assistia e avaliava todos os filmes elegíveis e elegia esses nove pré-indicados. Enquanto que uma comissão menor, com cerca de 30 membros, assistia apenas os pré-indicados e decidia os cinco filmes que seriam, efetivamente, indicados nessa categoria.
A partir de 2020, essa lista de pré-indicados passou a contar com 15 filmes e a ser divulgada cerca de um mês antes, geralmente em dezembro, da divulgação da lista final de indicados ao Oscar. Atualmente, todos os membros vivos e ativos da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (AMPAS) são convidados a assistir a todas as produções enviadas pelos países e consideradas elegíveis para concorrer nessa categoria.
Todos aqueles membros que aceitarem o convite, são obrigados a assistir a um número mínimo de filmes enviados, determinado pelas regras da Academia e depois disso devem elaborar uma lista, por ordem de preferência, de seus filmes preferidos. A lista deve contar com no máximo 15 filmes. Depois disso, os 15 filmes com mais votos estarão na lista de pré-indicados que é divulgada em dezembro. Todo esse processo de votação é feito de maneira secreta.
Depois disso, todos os membros vivos e ativos da Academia são convidados a assistir a todos os 15 filmes pré-selecionados. Todos os membros que aceitarem o convite deverão assistir a todos os 15 filmes pré-selecionados para que seus votos sejam contados. Depois disso, eles escolherão seus cinco filmes preferidos em ordem de preferência. Os cinco filmes com mais votos são oficialmente indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional.
Por último, todos os membros ativos e vivos da Academia que efetivamente assistiram aos cinco filmes indicados nessa categoria podem escolher, através de votação secreta, o grande vencedor do Oscar de Melhor Filme Internacional. Como podem ver, o processo para que um filme efetivamente vença essa categoria é longo e árduo.
Diferenças em relação ao Globo de Ouro e ao BAFTA
Assim como o Oscar, o Globo de Ouro e o BAFTA também possuem categorias similares a de Melhor Filme Internacional. Já que essas três premiações são as principais da temporada de premiações, vale a pena compararmos elas nesse sentido. Primeiro, é importante destacar que apesar de terem intenção parecida, a de premiar filmes em língua estrangeira, as categorias nas três premiações têm caracaterísticas bem diferentes.
Na verdade, as categorias no Globo de Ouro e no BAFTA são mas parecidas uma com a outra, enquanto que o Oscar tem características muito peculiares. A seguir explicaremos mais detalhadamente as similaridades e diferenças entre essas categorias nas três premiações. Dessa forma, será mais fácil para que você leitor entenda do que estamos falando.
BAFTA Award for Best Film Not in the English Language
Diferentemente do Oscar e do Globo de Ouro, o BAFTA exige que todos os filmes que querem concorrer nessa categoria sejam exibidos no Reino Unido para que o público do pais tenha acesso a eles. Dessa forma, as produções que querem concorrer ao BAFTA de Melhor Filme em Língua Estrangeira devem ser exibidos em pelo menos uma sessão diária pelo período mínimo de sete dias no total ou, então, serem exibidos em pelo menos sete sessões diferentes, durante o período de elegibilidade que, normalmente, dura cerca de 14 ou 15 meses.
Como o próprio nome da categoria já deixa claro, seu foco é a premiação de filmes falados em uma língua diferente da inglesa. Em tradução literal, o nome da categoria seria algo como “Melhor Filme Não Em Língua Inglesa”. Não à toa, até 1990, a categoria era conhecida como Melhor Filme em Língua Estrangeira. Aqui, assim como no Globo de Ouro, o mais importante é a língua em que o filme é predominantemente falado e não necessariamente o país em que ele foi produzido.
Assim, como no caso do Oscar e do Globo de Ouro, todos os filmes que querem concorrer nessa categoria do BAFTA devem ter mais de 50% de seus diálogos falados em outra língua que não seja o inglês. Contudo, aqui não importa o país de origem do filme, assim como também não é necessário que o filme seja indicado por nenhum comitê, já que aqui o filme é que é premiado e não o seu país e as produções não estão representando suas nações de origem.
Por isso também, não existe limite de filmes por país, como ocorre no Oscar. Dessa forma, é possível que mais de um filme produzido em um mesmo país possam ser indicados nessa categoria em um mesmo ano. Além disso, filmes produzidos no próprio Reino Unido podem ser indicados (e até vencer) nessa categoria desde que sejam majoritariamente falados em uma língua que não seja o inglês.
O último vencedor dessa categoria, o drama histórico Zona de Interesse, inclusive, é um filme produzido no Reino Unido, dirigido por um britânico, mas falado majoritariamente em polonês e alemão. Ademais, assim como no caso do Oscar e do Globo de Ouro, todos os filmes que querem ser elegíveis para concorrer nessa categoria devem ser longa-metragens, ou seja, ter pelo menos 70 minutos de duração.
Golden Globe Award for Best Foreign Language Film
Assim como no caso do BAFTA, o Globo de Ouro já deixa claro em seu nome, “Globo de Ouro de Melhor Filme em Língua Estrangeira”, que o principal objetivo da categoria é premiar filmes falados predominantemente em línguas que não sejam o inglês. Dessa forma, assim como no caso do BAFTA, o país de origem desses filmes não importa. Por isso, inclusive, filmes produzidos nos Estados Unidos podem ser indicados e muitas vezes, inclusive, vencem essa categoria.
Alguns exemplos recentes são o drama Minari – Em Busca da Felicidade (2020), produzido nos Estados Unidos, mas falado majoritariamente em coreano, e o épico de guerra Cartas de Iwo Jima (2006), que é quase todo falado em japonês. Aliás, no ano em que Cartas de Iwo Jima foi indicado, outro filme norte-americano, o épico de ação Apocalypto, também foi indicado nessa mesma categoria.
Ademais, é comum que filmes produzidos nos Estados Unidos, mas falados predominantemente em outras línguas sejam indicados nessa categoria. Esse ano, por exemplo, o drama romântico Vidas Passadas foi indicado, mas acabou perdendo para o filme francês Anatomia de uma Queda que, curiosamente, tem mais diálogos em inglês do que Vidas Passadas, apesar desse último ter sido produzido nos Estados Unidos e ser dirigido por uma cineasta norte-americana.
Assim como no caso do Oscar e do BAFTA, para ser elegível a concorrer nessa categoria, um filme deve ter mais de 50% de seu diálogo falado em uma outra língua que não seja o inglês e também deve ser um longa-metragem, ou seja, possuir uma duração de ao menos 70 minutos.
Assim como o BAFTA, o Globo de Ouro também não possui todo o processo de “representação” do Oscar. Dessa forma, o filme não precisa ser indicado por comitê e também não representa nenhuma país. Se um filme é elegível a concorrer nessa categoria, basta ele se “inscrever” nela e pronto.
Já uma diferença dessa categoria em relação ao BAFTA é que, assim como no caso do Oscar, os filmes não precisam necessariamente ser exibidos em solo norte-americano para serem elegíveis a concorrer nela. Basta que a produção seja exibida comercialmente em seu país de origem “durante o período de 14 meses, de 1º de novembro a 31 de dezembro, anterior à premiação”.
O Globo de Ouro ainda abre uma exceção que Oscar não abre. Se um filme foi impedido de ser exibido em seu país de origem por causa de censura, ele ainda pode se qualificar para concorrer nessa categoria sendo exibido por uma semana nos Estados Unidos, durante o período de elegibilidade especificado acima. Assim como no caso do BAFTA, não existe número máximo de filmes por país. Dessa forma, como já dissemos antes, muitas vezes dois filmes do mesmo país serão indicados nessa categoria em um mesmo ano.
É necessário deixar claro, no entanto, que essa categoria do Globo de Ouro é bem antiga, tendo sido introduzida em 1948 e sendo entregue desde 1949. Ou seja, ela passou a existir apenas um ano após a criação da categoria semelhante no Oscar. Dessa forma, ela já passou por inúmeras mudanças. Em seu início, por exemplo, apenas os vencedores eram anunciados e em diversas ocasiões mais de um filme venceu essa categoria em um mesmo ano.
Além disso, apesar de ter começado em 1949, apenas em 1955 essa categoria passou a ser anual e permanente. Ademais, no período até 1972, essa categoria exisitiu concomitantemente com a categoria de “Melhor Filme Estrangeiro em Língua Inglesa”, que visava premiar filmes produzidos fora dos Estados Unidos, mas falados em inglês. Essa categoria, que premiou praticamente só filmes britânicos, não era anual e deixou de fazer sentido com o tempo, sendo extinta, como dito, em 1972.
Assim, durante esse período, o Globo de Ouro possuia duas categorias para premiar filmes estrangeiros. Uma que premiava filmes estrangeiro falados em língua estrangeira e outra que premiava filmes estrangeiros falados em inglês. Com a fusão das duas categorias, a partir de 1973, essa categoria passou a se chamar “Melhor Filme Estrangeiro”.
Nesse período, ela premiava qualquer filme produzido fora dos Estados Unidos independente da língua em que ele era falado. Dessa forma, nenhum filme norte-americano era elegível para concorrer nessa categoria, mesmo que fosse majoritariamente falado em outra língua que não o inglês. Já qualquer filme produzido fora dos Estados Unidos, mesmo que falado predominantemente em inglês, estava elegível a concorrer e ser premiado nessa categoria.
A partir de 1986, essa categoria passou a funcionar nos moldes atuais. Ou seja, como explicamos acima, o que importa é que o filme concorrente seja falado majoritariamente em uma língua que não seja o inglês, não importando o seu país de origem e onde ele foi produzido. Nesse período, como dito, diversos filmes norte-americanos receberam indicações nessa categoria e alguns, inclusive, a venceram.
Estatísticas e curiosidades
Como todas as categorias do Oscar, para entendermos como ela funciona é necessário conhecer sua história e suas estatísticas. Com a categoria de Melhor Filme Internacional não é diferente. Acima, já falamos extensivamente sobre a história dessa categoria. Agora, nessa seção, falaremos um pouco mais sobre suas estatísticas que, como dito antes, ajudam bastante a entender seu funcionamento e também contextualizar sua própria história.
Como dito acima, a categoria de Melhor Filme Internacional surge após o final da Segunda Guerra Mundial em um contexto em que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, organizadora do Oscar, tentava criar uma ponte entre o cinema produzido nos Estados Unidos e o cinema produzido no resto do mundo em um planeta que era, já naquela época, cada vez mais globalizado.
Sem surpresas, o cinema europeu domina essa categoria, já que ele é, seguramente, o “mais forte” depois do cinema produzido nos Estados Unidos. Além disso, foi no continente que o cinema começou oficialmente em 1895. Assim, não surpreende ninguém que dos 77 vencedores do Oscar de Melhor Filme Internacional, 60 tenham sido produzidos na Europa. É importante destacar que durante seus primeiros anos, essa categoria foi honorária e não competitiva. Dessa forma, a Academia uma vencedor de forma quase que discricionária. Essa seção de estatísticas, leva em conta os oito filmes premiados nesse período.
Aliás, nesse período inicial da categoria, de seus nove primeiros vencedores, seis filmes foram produzidos na França ou na Itália. Sendo que um deles, o drama Três Dias de Amor (1949), é uma co-produção dos dois países. Nesse período inicial, o “estranho no ninho” foi o Japão, que venceu três vezes. Isso porque, nesse período também, o cinema nipônico contava com gênios, como Akira Kurosawa e Hiroshi Inagaki, em seus períodos mais criativos.
Aliás, não à toa, liderado pelo Japão, o cinema produzido na Ásia é o segundo mais premiado dessa categoria, com nove vitórias no total, sendo cinco de filmes japoneses. As outras quatro vitórias vieram do Irã, que venceu essa categoria duas vezes, da Coréia do Sul e de Taiwan. O mais incrível é que apesar do enorme domínio europeu, o único filme a vencer essa categoria e também a de Melhor Filme, até hoje, foi uma produção asiática, o thriller Parasita (2019). Aliás, a obra é também o primeiro filme não falado em inglês a vencer a principal categoria do Oscar. Lembrando que a produção francesa O Artista (2011), venceu o Oscar de Melhor Filme em 2012, mas o filme era “mudo” e, portanto, não possuia diálogos.
Depois de Europa e Ásia, vem as Américas, lideradas pelos nossos “hermanos” argentinos, com cinco vitórias nessa categoria. Além das duas vitórias da Argentina, o continente americano também conta com uma vitória do México, uma do Canadá e uma do Chile. Infelizmente, o Brasil nunca venceu o Oscar nessa categoria. Falaremos mais sobre esse tema na próxima seção do nosso texto.
Por último temos o continente africano com três vitórias. Uma para a Argélia, uma para a Costa do Marfim e outra para a África do Sul. É interessante observar aqui, que todos os três filmes são co-produções europeias, inclusive, com forte influência criativa de europeus. Aliás, o filme mais “independente” dos três é o sul-africano Infância Roubada (2005), que ganhou o Oscar de Melhor Filme Internacional em 2006, e que conta com diretores, elenco e equipe de produção quase toda formada por sul-africanos. Sendo que apenas o produtor do filme é britânico.
As produções argelina e marfinense foram dirigidas por cineastas franceses e contam com elenco e equipe de produção quase toda formada por profissionais europeus. Ambos os filmes contaram com dinheiro da Argélia e da Costa do Marfim, mas a ingerência criativa desses países na produção dos filmes parece ter sido pouca. Z (1969), que venceu o Oscar de Melhor Filme Internacional de 1970 representando a Árgelia, nem sequer se passa no pais, sendo que seu enredo se passa em uma versão ficcional da Grécia. No entanto, um de seus produtores, Ahmed Rachedi, era argelino.
Já Preto e Branco em Cores (1976), que venceu essa categoria em 1977 representando a Costa do Marfim, se passa na África, mas foi dirigido pelo francês Jean-Jacques Annaud e conta com elenco e equipe de produção quase toda francesa. Isso mostra a força do cinema europeu, mas também é retrato do colonialismo que se abateu sobre a África durante os últimos séculos. Não a toa, o único filme “mais independente” a vencer o Oscar de Melhor Filme Internacional representando um país da África é justamente o mais recente deles, tendo sido produzido em uma época em que o continente já estava quase que totalmente descolonizado.
Países com mais vitórias e indicações
O domínio do continente europeu nessa categoria também se reflete no fato de que os países com mais vitórias, indicações e que mais enviaram representantes para concorrer nessa categoria são todos europeus. Primeiramente, o país com mais filmes vencedores nessa categoria é a Itália. Quatorze filmes italianos já ganharam o Oscar de Melhor Filme Internacional, incluindo dois na época em que a categoria era honorária e um que era uma co-produção com a França.
Aliás, os franceses são o segundo país com mais vitórias nessa categoria. São doze no total, incluindo duas vitórias na época em que a categoria ainda era honarária e a já mencionada vitória da co-produção com a Itália. Logo atrás, com cinco vitórias nessa categoria, está o Japão que é o terceiro país que mais venceu o Oscar de Melhor Filme Internacional. É interessante observar que três dessas vitórias vieram na época em que a categoria ainda era honorária.
Apesar de estar em segundo lugar em número de vitórias, a França é disparado o país que mais indicações recebeu nessa categoria, são 41, no total. A Itália vem em segundo lugar, com 33 indicações no total. Isso mostra, novamente, o tamanho da tradição desses dois países no Oscar de Melhor Filme Internacional.
Já que mesmo atualmente, na maioria dos anos, um filme de algum dos dois países está entre os indicados nessa categoria. Entre as décadas de 1950 e 1980 era raro encontrar um ano sem um filme francês ou italiano indicado nessa categoria. Além disso, em diversos anos, filmes dos dois países estavam indicados e competiam de frente pelo prêmio de Melhor Filme Internacional.
Em terceiro lugar entre os países com mais indicações nessa categoria está a Espanha, outro país europeu com enorme tradição cinematográfica. Os espanhóis têm 21 indicações ao Oscar de Melhor Filme Internacional, mas só venceram quatro vezes nessa categoria. Em quatro lugar, temos o Japão, com 18 indicações nessa categoria e, como dito, cinco vitórias e em quinto lugar temos a Suécia, que também tem uma produção cinematográfica muito forte, com 16 indicações e três vitórias nessa categoria. Curiosamente, todas as vitórias suecas vieram de filmes dirigidos pelo genial Ingmar Bergman.
Quando o tema é o número de filmes enviados para concorrer ao Oscar de Melhor Filme Internacional temos novamente França, Itália e Japão liderando. Os franceses já enviaram 71 filmes para representar o país nessa categoria, logo em seguida com 70 filmes envios para cada um, vêm a Itália e o Japão. Logo em seguida temos Espanha e Suécia em quarto e quinto lugar, respectivamente. Os espanhóis já enviaram 66 filmes para concorrer nessa categoria e os suecos 63.
Isso quer dizer que França e Itália, por exemplo, enviaram filmes praticamente todos os anos, desde o início da existência dessa categoria. O mesmo pode ser dito do Japão. Esses países começaram a enviar produções para concorrer ao Oscar de Melhor Filme Internacional praticamente desde que ele foi estabelecido. Esse fato, novamente, corrobora a tradição que esses países têm nessa categoria do Prêmio da Academia.
Já no lado “perdedor”, se é que podemos dizer assim, temos Portugal e Israel. O primeiro é o pais com mais envios para o Oscar sem nunca ter recebido uma indicação nessa categoria. Os portugueses já enviaram 40 filmes para consideração dos membros da Academia, mas nunca lograram êxito em obter uma indicação sequer ao Oscar de Melhor Filme Internacional. Já os israelenses já foram indicados 10 vezes nessa categoria, mas nunca obtiveram uma vitória, sendo o país com mais indicações a nunca efetivament vencer o Oscar de Melhor Filme Internacional.
Grandes diretores lideram a lista de maiores vencedores
Quando analisamos quem dirigiu os filmes premiados com o Oscar de Melhor Filme Internacional, nesses quase 80 anos em que a categoria existe, temos um festival de nomes famosos e de grandes cineastas do cinema mundial. Mas antes de começarmos a apresentar essas estatísticas, é sempre bom lembrar que, como já dito aqui antes, nessa categoria quem recebe o prêmio são os países e não os diretores e produtores (com raríssimas excessões, sobre as quais já falamos acima). Dessa forma, nenhum dos diretores que citaremos a seguir é considerado vencedor do Oscar só pelo fato de seus filmes terem vencido essa categoria.
Dito isso, vamos aos números. Confirmando mais uma vez a enorme tradição do cinema italiano nessa categoria, os dois cineastas com mais vitórias nessa categoria são italianos, os geniais, Vittorio De Sica e Federico Fellini. Ambos dirigiram quatro filmes que levaram o Oscar de Melhor Filme Internacional para casa. No caso de Fellini, o mérito talvez seja ainda maior, já que todos os quatro Oscars vencidos por seus filmes foram competitivos.
Aliás, os dois primeiros vencedores dessa categoria, quando ela passou a ser competitiva, foram filmes do diretor, os drama A Estrada da Vida (1954) e Noites de Cabíria (1957), estabelecendo um domínio inicial nessa categoria e fazendo de Fellini um dos poucos diretores a vencer essa categoria em anos consecutivos. Os dois outros filmes do diretor a vencer o Oscar de Melhor Filme Internacional foram os clássicos 8½ (1963) e Amarcord (1973), amplamente considerados entre os melhores filmes italianos da história.
Contudo, Vittorio De Sica tem o mérito de ter “fundado” essa categoria. Primeiro, porque foi um de seus filmes, o clássico Vítimas da Tormenta (1946), o primeiro a receber o Oscar de Melhor Filme Internacional em uma época, como dissemos, em que a categoria era honorária e não competitiva. Ainda nesse periodo, outro filme do genial cineasta italinao, o drama Ladrões de Bicicleta (1948), também seria premiado nessa categoria.
O sucesso desses dois filmes foi um dos grandes motivadores para que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood tornasse essa categoria permanente e também a transformasse em uma categoria competitiva. É importante destacar também que Ladrões de Bicicleta é amplamente considerado um dos melhores filmes de toda a história do cinema e o principal representante do neo-realismo italiano.
Aliás, a ascessão desse movimento cinematográfico que propunha mostrar a realidade nua e crua das pessoas comuns na Itália pós-Segunda Gerra Mundial de uma forma quase documental, tem muito a ver com o sucesso inicial do cinema italiano no Oscar de Melhor Filme Internacional, já que essa categoria acabou sendo criada bem no auge do movimento. Além dos dois filmes já citados, outros dois clássicos dirigidos por Vittorio De Sica, Ontem, Hoje e Amanhã (1963) e o drama histórico O Jardim dos Finzi Contini (1970), venceram essa categoria em uma época em que ela já era competitiva.
É interessante destacar que em todas as quatro oportunidades em que um filme de Federico Fellini foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional, ele saiu da cerimônia vitorioso. Já no caso de Vittorio De Sica, em apenas uma ocasião, um filme seu perdeu o Oscar nessa categoria. A obra em questão é o clássico Matrimônio à Italiana (1964), estrelado por Sophia Loren e Marcello Mastroianni e que, em 1966, perdeu o Oscar para a produção checoslovaca A Pequena Loja na Rua Principal. A derrota pode ter ocorrido porque outro filme de De Sica (justamente Ontem, Hoje e Amanhã) havia vencido essa categoria no ano anterior.
Um dos poucos cineastas que conseguiram repetir o feito de Federico Fellini foi o sueco Ingmar Bergman, que é o terceiro colocado dessa lista, com três de seus filmes levando o Oscar de Melhor Filme Internacional para casa. Bergman nunca perdeu nessa categoria. Todos os seus filmes indicados aqui, levaram a estatueta para casa. Isso não surpreende, levando em conta que os três (A Fonte da Donzela (1960), Através de um Espelho (1961) e Fanny e Alexander (1982)) são grandes clássicos do cinema mundial.
Logo atrás de Bergman, vêm três cineastas, cada um deles com dois filmes premiados nessa categoria: o francês René Clément, o iraniano Asghar Farhadi e o japonês Akira Kurosawa. Curiosamente, os filmes de Clément nunca ganharam um Oscar competitivo nessa categoria. As duas produções dirigidas por ele, Três Dias de Amor (1949) e Brinquedo Proibido (1952), venceram o Oscar de Melhor Filme Internacional na época que ele ainda era um prêmio honorário.
Curiosamente, em 1957, um de seus filmes, o drama histórico Gervaise – A Flor do Lodo (1956), recebeu uma indicação nessa categoria, mas acabou perdendo justamente para A Estrada da Vida (1954), de Federico Fellini, no primeiro ano em que essa categoria passou a ser competitiva.
Já Farhadi é, ao lado de Fellini e Bergman, um dos únicos três diretores que nunca perderam um Oscar nessa categoria. Todas as duas vezes em que filmes seus foram indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional, eles venceram. No caso, as indicações ocorreram em 2012 e 2017, pelos dramas A Separação (2011) e O Apartamento (2016).
Já Kurosawa, possui duas vitórias no Oscar de Melhor Filme Internacional. Uma por Rashomon (1950), na época em que essa categoria ainda era honorária, e outra por Dersu Uzala (1975), já no período competitivo da categoria. O genial cineasta japonês também possui outras duas indicações, uma pelo drama Dodeskaden – O Caminho da Vida (1970) e outra pelo épico Kagemusha, a Sombra de um Samurai (1980). Ambas as produções, no entanto, foram derrotadas na disputa pelo Oscar
Além disso, um dos maiores clássicos de Kurosawa, o épico histórico Ran (1985), deixou de ser indicado nessa categoria porque a comissão responsável por escolher o representante do Japão naquele ano, de forma polêmica, decidiu escolher outro filme. A produção, no entanto, recebeu indicações em outras categorias do Oscar, incluindo uma indicação de Melhor Direção para o próprio Akira Kurosawa, a única de sua carreira.
Diretores com mais filmes indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional
Além de ser um dos diretores com mais vitórias nessa categoria, Vittorio De Sica é também aquele que dirigiu o maior número de filmes indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional. Cinco de seus filmes foram indicados nessa categoria. Como dissemos antes, quatro venceram esse Oscar, enquanto um deles (a clássica comédia Matrimônio à Italiana (1964)) não conseguiu levar o Oscar para casa.
Abaixo dele, temos diversos outros cineastas de renome, incluindo os já citados acima, Federico Fellini e Akira Kurosawa, com quatro filmes indicados nessa categoria. Além dos dois, os italianos Mario Monicelli e Ettore Scola, o polonês Andrzej Wajda, o espanhol José Luis e o húngaro István Szabó dirigiram quatro filmes que receberam indicações ao Oscar de Melhor Filme Internacional.
Infelizmente, nenhuma das produções dirigidas por Monicelli, Scola e Wajda chegaram a vencer o Oscar nessa categoria. Dessa forma, esses três cineastas são aqueles com mais filmes indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional sem nunca terem obtido uma vitória nessa categoria. Adicionalmente, Ettore Scola dirigiu o único filme sem diálogos, o musical O Baile (1983), a conseguir uma indicação nessa categoria.
São tantos os diretores com três filmes indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional, que não seria possível mencioná-los todos aqui, mas entre os mais destacados estão: Pedro Almodóvar, Denys Arcand, Ingmar Bergman, Luis Buñuel, René Clément, Ang Lee, Carlos Saura, François Truffaut e Zhang Yimou. A maioria deles teve pelo menos um filme premiado nessa categoria, sendo que, como dissemos antes, todos os três filmes dirigidos por Bergman, indicados nessa categoria levaram a estatueta para casa.
Brasil no Oscar de Melhor Filme Internacional
É claro que se estamos falando do Oscar de Melhor Filme Internacional, não poderíamos deixar de falar da participação do Brasil nessa categoria. Nosso país já enviou 52 filmes para concorrer nessa categoria, se não contarmos Ainda Estou Aqui, que foi escolhido no último dia 23 de setembro de 2024 para representar o Brasil no Oscar 2025. A primeira vez que um filme brasileiro foi enviado para concorrer nessa categoria foi em 1960, ou seja, apenas quatro anos após essa categoria se tornar competitiva.
Desses 52 filmes, apenas quatro conseguiram efetivamente serem indicados ao Oscar de Oscar de Melhor Filme Internacional, sendo que, infelizmente, em nenhuma dessas ocasiões um filme brasileiro conseguiu vencer essa categoria. O Brasil até começou bem. Em 1963, apenas três anos após começar a enviar filmes para concorrer nessa categoria, o drama O Pagador de Promessas, dirigido por Anselmo Duarte, conseguiu uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional.
O filme, no entanto, acabou sendo derrotado pela produção francesa Sempre aos Domingos (1962), de Serge Bourguignon. Depois disso, o cinema brasileiro viveria uma seca de mais de trinta anos, passando mais de três décadas sem conseguir sequer uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional. Nesse período, o cinema brasileiro passou por momentos extremamente dificéis, tanto no quesito qualidade quanto na questão da viabilidade econômica.
Mesmo assim, nesse período, diversos filmes que atualmente são considerados clássicos do cinema brasileiro, foram enviados para representar o Brasil no Oscar, mas sem sucesso. Entre esses filmes se destacam: Como Era Gostoso o Meu Francês (1971), de Nelson Pereira dos Santos; Xica da Silva (1975), de Cacá Diegues; Pixote, a Lei do Mais Fraco (1980), de Héctor Babenco, entre outros.
O fim desse período de “seca” coincidiu justamente com a chamada “retomada” do cinema brasileiro, ocorrida nos anos 1990, década em que o Brasil teve três filmes indicados em quatro anos. O primeiro deles foi O Quatrilho (1995), de Fábio Barreto, encerrando um período de 32 anos sem indicações brasileiras nessa categoria. Depois disso, entre 1996 e 1999, o Brasil só não foi indicado em 1997.
Em 1998, um filme brasileiro voltou a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional. Dessa vez, o indicado foi o thriller histórico O Que É Isso, Companheiro? (1997), dirigido por Bruno Barreto, irmão de Fábio. Infelizmente, novamente a vitória não veio. Coincidentemente, em ambos os casos, as produções brasileiras foram derrotadas por filmes holandeses.
No ano seguinte, 1999, viria nossa melhor chance de vencer o Oscar de Melhor Filme Internacional, com a indicação de Central do Brasil (1998), de Walter Salles Jr. Naquele ano, além de uma indicação nessa categoria, o filme brasileiro também conseguiu uma inédita indicação na categoria de Melhor Atriz, para Fernanda Montenegro. A primeira e única vez, até hoje, que uma atriz brasileira recebeu uma indicação ao Oscar em qualquer das categorias de interpretação da famosa premiação.
Infelizmente, o ano era muito “forte”, com diversos concorrentes de peso indicados a Melhor Filme Internacional, como Filhos do Paraíso, de Majid Majidi; Tango, de Carlos Saura; O Avô, de José Luis Garci e, principalmente, A Vida é Bela, de Roberto Benigni. No final, A Vida É Bela acabou por receber diversas indicações em outras categorias importantes, como Melhor Filme, Melhor Direção (para Roberto Benigni), Melhor Roteiro Original e Melhor Ator (para o próprio Benigni).
Com isso, as chances de Central do Brasil foram reduzidas a pó, já que, geralmente, quando uma produção é indicada a Melhor Filme e Melhor Filme Internacional no mesmo ano, é quase certo que ela vencerá, pelo menos, essa última. E não deu outra. A Vida É Bela venceu não apenas o Oscar de Melhor Filme Internacional, mas também o de Melhor Ator. Além disso, Fernanda Montenegro também perdeu o Oscar de Melhor Atriz para Gwyneth Paltrow, no que é, até hoje, considerada uma das vitórias mais polêmicas da história da premiação.
Depois disso, lá se vão mais de 20 anos e nunca mais um filme brasileiro conseguiu uma indicação nessa categoria. Contudo, em 2004, um filme brasileiro conseguiu indicações em outras categorias do Oscar. Cidade de Deus (2002), que no ano anterior não havia conseguido uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional, conseguiria indicações nas categorias de Melhor Direção (para Fernando Meirelles), Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Fotografia e Melhor Montagem.
Essa foi a única vez, até hoje, que um diretor brasileiro foi indicado ao Oscar de Melhor Direção. O sucesso de Cidade de Deus, inclusive, levantou questões sobre o processo de escolha dos indicados a Melhor Filme Internacional, com acusações de que o filme teria sofrido preconceito devido a sua temática que envolvia violência, pobreza e favela.
Depois disso, em 2008, um outro filme brasileiro, o drama histórico O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias (2007), de Cao Hamburger, chegou a figurar na lista de pré-indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional daquele ano. Contudo, infelizmente, a produção não conseguiu ficar entre os cinco indicados finais ao Oscar. Depois disso, nunca mais um filme brasileiro chegou a seguer conseguir figurar nessa lista de pré-indicados, quanto mais receber, efetivamente, uma indicação ao Oscar nessa categoria.
Dito isso, é importante lembrar que uma co-produção brasileira, falada em português e que se passa no Brasil chegou efetivamente a vencer o Oscar de Melhor Filme Internacional. Contudo, a obra em questão venceu essa categoria representando a França em uma época em que o Brasil nem sequer enviava representantes para disputar o Oscar de Melhor Filme Internacional e, portanto, essa vitória conta entre as muitas do cinema francês nessa categoria.
O filme em questão é Orfeu Negro (ou Orfeu do Carnaval, com também é conhecido), dirigido pelo cineasta francês Marcel Camus. Estrelada pelo ator brasileiro Breno Mello e pela atriz franco-americana Marpessa Dawn, a produção é baseada em uma peça de Vinicius de Moraes. Apesar de contar com uma equipe de produção majoritariamente francesa, Orfeu Negro teve sua trilha sonora composta por Luiz Bonfá e Tom Jobim.
O filme, que se passa no Rio de Janeiro, é falado em português e conta uma história relacionada ao Carnaval, não apenas venceu o Oscar, mas também a Palma de Ouro, no prestigiado Festival de Cannes, e o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro. A obra também foi indicada ao BAFTA de Melhor Filme. Apesar do imenso sucesso, Orfeu Negro causou polêmica no Brasil e foi criticada até mesmo pelo próprio Vinicius de Moraes, por considerar que a produção reforçava esteriótipos sobre o Brasil.
Diretores brasileiros mais bem-sucedidos no Oscar de Melhor Filme Internacional
Como dito acima, apenas quatro filmes brasileiros efetivamente conseguiram indicações ao Oscar de Melhor Filme Internacional. Com isso, igualmente, apenas quatro cineastas brasileiros conseguiram ter filmes seus indicados nessa categoria, são eles: Anselmo Duarte, Walter Salles Jr. e os irmãos Fábio e Bruno Barreto.
Entre os diretores que mais vezes conseguiram ter seus filmes escolhidos para representar o Brasil no Oscar, o campeão é Cacá Diegues. O cineasta alagoano que é um dos mais conhecidos nomes do Cinema Novo, teve sete de seus filmes escolhidos para representar o Brasil na categoria de Melhor Filme Internacional. Entre seus filmes mais conhecidos a serem escolhidos estão Xica da Silva (1976), Bye Bye Brazil (1979) e Tieta do Agreste (1996).
Em segundo lugar, com quatro de seus filmes escolhidos para representar o Brasil no Oscar de Melhor Filme Internacional temos Nelson Pereira dos Santos e Walter Salles Jr. Os quatro filmes dirigidos por Pereira dos Santos escolhidos foram Como Era Gostoso o Meu Francês (1971), O Amuleto de Ogum (1974), Tenda dos Milagres (1977) e Memórias do Cárcere (1984). Já no caso de Salles Jr., as produções escolhidas foram A Grande Arte (1991), Central do Brasil (1998), Abril Despedaçado (2001) e Ainda Estou Aqui (2024).
Como dito antes, Central do Brasil foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional e é também o filme brasileiro que mais chegou perto de vencer nessa categoria. Além disso, Ainda Estou Aqui ainda tem chances de concorrer ao Oscar do ano que vem e Abril Despedaçado praticamente lançou a carreira internacional de Rodrigo Santoro. Por tudo isso, Salles Jr é um dos diretores brasileiros mais conhecidos internacionalmente e também mais bem-sucedidos da atualidade.
Em terceiro lugar dessa lista, com três de seus filmes sendo escolhidos para representar o Brasil no Oscar temos Bruno Barreto. Os três filmes em questão são Romance da Empregada (1988), O Que É Isso, Companheiro? (1997) e Última Parada 174 (2008). Como dito acima, O Que É Isso, Companheiro? (1997) efetivamente conseguiu ser indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional, sendo um dos quatro filmes brasileiros a conseguir esse feito.
Curiosamente, aquele que é, provavelmente, o filme mais conhecido de Bruno Barreto, a comédia erótica Dona Flor e Seus Dois Maridos (1976), não foi escolhido para representar o Brasil nessa categoria. Naquele ano, a comissão responsável pela escolha preferiu enviar Xica da Silva (1977), de Cacá Diegues. Apesar disso, a produção foi extremamente bem-sucedida internacionalmente, recebendo uma indicação ao Globo de Ouro de Melhor Filme em Língua Estrangeira e também uma indicação ao BAFTA de Revelação Ano para Sônia Braga, protagonista da obra.
Aliás, Dona Flor e Seus Dois Maridos foi também um enorme sucesso comercial, se tornando o filme mais visto da história do cinema brasileiro na época e sendo, até hoje, dono de uma das maiores bilheteres da história do cinema do nosso país. A obra também foi durante muito tempo o filme brasileiro mais visto no exterior e seu sucesso comercial fez com que, inclusive, um remake seu fosse produzido em Hollywood.
Por último, é importante notar que apenas três filmes dirigidos por mulheres conseguiram ser escolhidos para representar o Brasil nessa categoria do Oscar. O primeiro a conseguir esse feito, foi A Hora da Estrela (1985), de Suzana Amaral. Quase trinta anos depois, Que Horas Ela Volta? (2015), de Anna Muylaert, repetiu o feito e, por último, em 2020, o documentário Babenco: Alguém Tem que Ouvir o Coração e Dizer Parou (2019), de Bárbara Paz, foi o último filme dirigido por uma mulher, até agora, a repetir o feito.
Controvérsias envolvendo a definição de país
Nos tópicos anteriores, falamos extensamente sobre as polêmicas envolvendo a escolha dos filmes pelos países, que muitas vezes pode ser feita de forma obscura.ou mesmo sofrer interferência política. Nesse tópico, falaremos um pouco sobre as polêmicas envolvendo a definição de país. Como dissemos antes, nessa categoria, cada um dos filmes concorrentes são considerados representantes de seus respectivos país.
Dessa forma, como dito antes, não é possível para um filme concorrer ao Oscar de Melhor Filme Internacional sem antes ser escolhido como representante por seu país de origem. Mas o que é considerado um país? Essa questão pode parecer boba, mas não é. No caso de países com amplo reconhecimento internacional, como a Itália, a França e, o próprio Brasil, isso não é um problema.
Mas e quando falamos de territórios e países muito recentes e com pouco reconhecimento internacional? Aí é que mora o problema. Tradicionalmente, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (AMPAS), organização que entrega o Oscar, sempre aceitou envios de alguns terrítórios semi-autônomos, como Hong Kong, por exemplo, e mesmo de países com reconhecimento limitado, como Taiwan, por exemplo. Aliás, durante algum tempo, a Academia aceitou envios até mesmo de Porto Rico, que é um estado livre associado aos Estados Unidos.
Só para se ter uma ideia, o território de Hong Hong tem mais indicações, três, no total, do que a própria China, que tem dois no total, país ao qual ele pertence. Já Taiwan, que a China diz ser parte de seu território, mas que é reconhecido como um país independente por diversos países do mundo, possui até mesmo uma vitória no Oscar de Melhor Filme Internacional, com o filme O Tigre e o Dragão (2000), de Ang Lee.
Essas questões de países geravam controvérsias aqui e ali, mas foi só no início do século XXI, com a questão da Palestina, que a polêmica em torno do que a Academia reconhece como “país” para os fins dessa categoria, se intensificou. A polêmica começou de fato em 2002, quando o famoso produtor francês Humbert Balsan tentou inscrever a comédia Intervenção Divina (2002) como representante do Estado da Palestina na disputa do Oscar de Melhor Filme Internacional daquele ano.
A inscrição, no entanto, teria sido rejeitada, porque a Academia não reconhecia o Estado da Palestina como país, na época. Além disso, a Palestina também não possuía, aparecentemente, uma organização que pudessse indicar o filme como seu representante na disputa, como determina as regras da Academia. A notícia da rejeição, no entanto, causou polêmica e acusações de duplo padrão, já que como dito antes, a Academia aceita inscrições de territórios e outros países com reconhecimento internacional limitado.
Três anos depois, a polêmica se repetiu. Dessa vez, no entanto, ela ocorreu depois que a Academia não só aceitou, mas efetivamente indicou um representante do Estado da Palestina ao Oscar de Melhor Filme Internacional. A produção em questão era o drama Paradise Now (2005), que conta a história de dois homens que se preparam para cometer um atentado a bomba.
Inicialmente, o filme foi anunciado pela Academia como representante da “Palestina”. Contudo, depois de protestos de grupos pró-Israel, a Academia mudou a designação dizendo que a produção representava a “Autoridade Palestina”. Por último, no dia da cerimônia de entrega do Oscar, o ator Will Smith que apresentou a categoria de Melhor Filme Internacional, apresentou Paradise Now como sendo representante dos “Territórios Palestinos”. No entanto, o filme acabou perdendo o Oscar para o drama criminal Infância Roubada, representante da África do Sul.
Em 2013, outro filme palestino, o drama Omar, foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional e, dessa vez, a polêmica foi quase inexistente. Assim, aparentemente, essa questão em relação ao Estado Palestino parece estar superada, pelo menos por enquanto. Além disso, os últimos filmes indicados nessa categoria têm sido todos representantes de países com amplo reconhecimento internacional.
O último filme enviado por um “território” a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional, foi o drama Dias Melhores (2019), de Hong Kong. A produção, inclusive, foi a primeira dirigida por um cineasta honconguês nativo a ser indicado ao Oscar nessa categoria. Como o território já tem, como dito antes, longa tradição nessa categoria, a indicação do filme não causou qualquer polêmica.
Conclusão
É aí, gostou do nosso texto? Tentamos explicar em detalhes e de forma mais simplificada possível como funciona a categoria de Melhor Filme Internacional do Oscar e também contar um pouco de sua história. Tentamos também trazer todos os aspectos dessa categoria que é a mais diferente da principal premiação do cinema mundial. Esperamos que depois de ler esse texto, você esteja bem informado sobre o funcionamento e a história dessa categoria.
Como sempre, se você gostou desse texto, tem algo a acrescenta ou quer dar sua opinião, fique a vontade para deixar seu comentário. Não se esqueça que comentários são sempre importantes para nós e servem para guiar nossos passos nesse site. Até a próxima!!!